A investigação policial como procedimento sujeito ao contraditório diferido e a ampla defesa

Resumo: A Lei n° 13.245/16, alterou o Artigo 7° do Estatuto da OAB (Lei no 8.906/94), reforçando em seus incisos a garantia do acesso do Advogado ao seu cliente durante a apuração de infrações e também de todos os elementos investigatórios e probatórios dele decorrentes ou derivados. O que, de certa forma, vem fortalecer e atualizar o entendimento de que, nos mais diversos procedimentos investigatórios, devem ser observados a presença dos princípios do contraditório e da ampla defesa, ainda que com o alcance mais limitado que aqueles já conhecidos na fase processual. O foco do presente Artigo é apresentar o posicionamento da doutrina sobre esta tendência de aplicação mais ampla do instituto da ampla defesa e do contraditório.

Palavras-chave: Contraditório. Ampla Defesa. Procedimentos investigatórios. Direitos Humanos.

Abstract: The Law No. 13.245/16, amended the Article 7 of the OAB (Brazil Bar Association) Statute (Law No. 8.906/94), reinforcing in its sections the guarantee of the access of the lawyer to his client during the determination of infractions and also of all investigative elements and evidences arising or derived. This, in a way, it strengthens and updates the understanding that, in the most diverse investigative procedures, the presence of the principles of the contradictory and the ample defense must be observed, albeit with a more limited scope than those already known in the procedural phase . The focus of this academic article is to present the doctrine positioning about this wider application tendency of the institute of ample defense and contradictory.

Keywords: Contradictory. Ample defense. Investigative procedures. Human Rights.

Sumário: Introdução. 1. Inquérito Policial – Aspectos Gerais, definição e características. 1.1 Caráter sigiloso e inquisitorial do Inquérito. 2. Natureza Jurídica do Inquérito Policial, finalidade e meios de provas. 3. A Lei 13.245/16 e a assistência do Advogado durante a fase de apuração de infrações penais. 3.1. A Investigação Preliminar e os princípios do contraditório diferido 4. A investigação preliminar como meio de defesa para a garantia dos Direitos Humanos. Conclusão.

Introdução

A investigação preliminar como procedimento sujeito ao Contraditório diferido (sem o império da participação das partes) e a ampla defesa está sendo debatido pela doutrina principalmente pelo advento da Lei n° 13.245, de 12 de janeiro de 2016, que alterou alguns incisos do Artigo 7° do Estatuto da OAB (Lei no 8.906, de 4 de julho de 1994).

O debate ocorre no momento em que parte da doutrina entende que nas mais diversas modalidades de investigações preliminares, e não apenas no Inquérito Policial, deverão ser observados o contraditório diferido e a ampla defesa. As razões da doutrina são fortalecidas pela própria Constituição Federal e Legislações garantistas que, como é sabido, até pela finalidade precípua destes institutos “aos litigantes em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral o contraditório e a ampla defesa com os meios e recursos a eles inerentes.[1] e, da mesma forma, a assistência do Advogado (Artigo 5º, Inciso LXIII, da CF/88).

1. Inquérito Policial – Aspectos Gerais, definições e características.

Para melhor elucidação da questão, delinearemos o debate apenas às investigações realizadas pela Polícia Judiciária nos Inquéritos Policiais e de forma pontual traçaremos algumas linhas sobre as investigações produzidas pelo Ministério Público e Órgãos do Judiciário.

Aury Lopes Júnior, define o inquérito como "o ato ou efeito de inquirir, isto é, procurar informações sobre algo, colher informações acerca de um fato, perquirir". (2017, p. 222), como é sabido desde as primeiras noções sobre o Direito Processual Penal em matéria de Inquérito, a investigação produzida neste procedimento é cercada de algumas características que têm o escopo de dar-lhes eficiência, razão pela qual o Inquérito realizado pala Polícia Judiciária é, consoante as Lições do Professor Renato Brasileiro (2016, p. 114-129), escrito, dispensável, sigiloso, inquisitorial, discricionário, oficial, oficioso, indisponível e temporário.

Escrito já que o Artigo 9º do Código de Processo Penal dispõe que as peças do Inquérito Policial serão reduzidas a escrito ou datilografadas e rubricadas pela Autoridade. Questão recentemente levantada pela doutrina é saber se caberia a utilização de recursos Audiovisuais às Investigações, uma vez que o CPP não faz menção a esta forma de gravação; inegável que sim, é possível, isto porque na época em que o Código foi promulgado (1942), não existia a tecnologia hoje existente, razão pela qual poderá ser utilizada, tanto se levarmos em consideração a necessidade de fidelidade e segurança do procedimento quanto se observarmos subsidiariamente o Artigo 405 do Código de Processo Penal, introduzido pela Lei 11.719/08.[2]

Dispensável, já que as peças do Inquérito são meramente informativas, possibilitando que o titular da ação penal possa iniciar o Processo Penal, conforme disposto no Artigo 39, § 5o do CPP em que o Ministério Público o dispensará se os elementos oferecidos o habilitarem à promoção da respectiva Ação Penal.

Discricionário, na medida em que as inúmeras peculiaridades do caso concreto determinam as investigações, não há tanto rigor procedimental realizado por quem preside o mesmo, é o que exemplifica os Artigos 6º e 7º do CPP. Todavia, esta discricionariedade é limitada pela lei, sujeita ao controle judicial quando extrapolada, garantindo, principalmente os direitos fundamentais dos investigados, dentre outros.

Oficial, posto que consoante determinação constitucional nos termos do Artigo 144, § 1o  Inc I e § 4o , da Constituição Federal, a presidência do Inquérito Policial estará a cargo do Delegado de Polícia e Oficioso já que relacionada a obrigatoriedade da ação do delegado de polícia em instaurar o Inquérito quando tomar ciência de uma ação pública incondicionada, estando obrigado a agir de ofício nestes casos, uma vez que, como é sabido, nos casos de ação condicionada a representação ou ação privada, a respectiva instauração do Inquérito está condicionada à manifestação da vítima ou do seu representante legal. Todavia para registro, confirmada a representação, estará também, o Delegado de Polícia, obrigado a instaurá-lo, haja vista seu caráter oficioso.

Indisponível, pois não se trata de algo que a autoridade, tomando ciência de uma suposta Infração penal, possa dispor, mandando arquivá-lo se não o interessar, conforme expressamente disposto no Artigo 17 do CPP. Claro que, a procedência das informações, devem ser averiguadas pela Autoridade de Polícia antes da instauração. Todavia, uma vez instaurado, apenas será arquivado através de pedido formulado pelo Titular da Ação Penal e devidamente autorizado pelo Juiz competente.

Finalmente, a característica do Inquérito de ser o mesmo temporário, se amolda não só ao Inquérito Policial realizado pela polícia judiciária, mas a todos os processos e procedimentos em andamento em que se almeje a constituição, desconstituição ou modificação de um direito ou quaisquer apurações investigatórias, está característica prevista no Artigo 5º, LXXVIII, à duração razoável do processo, tem o fito de dar segurança à satisfação do investigado ou processado na resolução da imputação ou da lide.   

As próximas características do Inquérito: seu caráter Sigiloso e Inquisitorial, serão abordadas em tópico especial posto que são pontos centrais desta apresentação.

1.1. Caráter sigiloso e inquisitorial do Inquérito.

Segundo o Professor Renato Brasileiro de Lima (2016, p. 115), “o princípio da publicidade dos atos processuais são consagrados na Constituição e na Convenção Americana de Direitos Humanos”. A estrutura democrática albergada pela Constituição da República, rompendo com os axiomas ditatoriais anteriores, cercou o cidadão de garantias, com o escopo de conferir-lhes proteção. Assim, com o objetivo de dar transparência a atividade judiciária, tão necessária à nova postura democrática, a Carta Magna veio assegurar a publicidade que ora fora deixada a margem do cidadão, dando-lhe oportunidade de fiscalizar os Atos Processuais, para que, em consequência, houvesse  maior credibilidade à Administração da Justiça.

Todavia, tomando como fundamento os ensinamentos do filósofo Italiano Noberto Bobbio (2004) que não existem Direitos Absolutos, mesmo os fundamentais, a Publicidade como garantia fundamental constitucional, pode sofrer restrições em casos em que o interesse particular, por exemplo, prepondere sobre o público, fazendo pender a balança entre dois direitos fundamentais, de um lado a intimidade e de outro a publicidade dos atos processuais, como detalhou o filósofo alemão Robert Alexy (2002) em seus ensinamentos.

Transportando esta ideia de restrição a publicidade dos atos processuais para o Processo Penal, o Artigo 5º Inc XXXIII, esclarece que XXXIII “todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado” por isso se fala em publicidade limitada, interna ou restrita (BRASILEIRO, 2016, p. 116), “neste caso alguns atos ou todos eles serão realizados somente perante pessoas diretamente interessadas no feito e seus respectivos procuradores, ou, ainda, somente perante estes”.

O Inquérito Policial é instrumento que visa obter informações da autoria e materialidade de infrações, sendo assegurado às autoridades investigativas o sigilo necessário à elucidação do fato criminoso (Artigo 20, do CPP), caso em que a Autoridade Policial decretará o Sigilo das Investigações para preservar o sucesso e eficácia do procedimento, lembrando que o sigilo não alcança o Poder Judiciário nem o Ministério Público.

Quanto ao advogado do Investigado, no qual será amplamente debatido oportunamente, já existe posicionamento sumulado (Súmula nº 14, STF) de que “do plexo de direitos dos quais é titular o indiciado – interessado primário no procedimento administrativo do inquérito policial -, é corolário e instrumento a prerrogativa do advogado de acesso aos autos respectivos, explicitamente outorgada pelo Estatuto da Advocacia[3]”, todavia, dos atos já documentados, tratando-se de diligências que ainda não foram realizadas ou ainda em andamento não é garantido ao Defensor a prévia comunicação.

O Artigo 20 do Código Processual Penal trás o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade, com o objetivo de dar eficiência às investigações no propósito precípuo de elucidar os fatos supostamente criminosos, obviamente, respeitado em qualquer hipótese, o disposto no Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, quanto a assistência e garantias fundamentais.

A sua característica inquisitorial ingressa em sua Natureza Jurídica já que considerado como procedimento de natureza Administrativa pela doutrina, conduzido por Autoridades que serão responsáveis pela colheita de elementos de informação que servirão de embasamento à futura ação penal, não se tratando de Processo Administrativo ou Judicial.

Inquisitorial posto que as investigações consideradas preliminares não se sujeitam ao contraditório e a ampla defesa, pelo menos este era o entendimento jurisprudencial e doutrinário até o advento da Lei n° 13.245, de 12 de janeiro de 2016, que alterou o Artigo 7° do Estatuto da OAB (Lei no 8.906, de 4 de julho de 1994), que conferiu ao Advogado do Investigado ou Indiciado o direito “de assistir a seus clientes investigados durante a apuração de infrações, sob pena de nulidade absoluta do respectivo interrogatório ou depoimento e, subsequentemente, de todos os elementos investigatórios e probatórios dele decorrentes ou derivados, direta ou indiretamente, podendo, inclusive, no curso da respectiva apuração, podendo apresentar razões e quesitos[4]

Dessa forma, questionamentos ainda não enfrentados pela jurisprudência vêm inflamando a doutrina sobre um ponto central: Face a nova redação conferida pela Lei 8.906, de 4 de julho de 1994 – Estatuto da OAB – ao direito do Advogado, no exercício de seu ofício, à assistência dos investigados, durante a apuração de infrações, sob pena de nulidade absoluta do respectivo interrogatório ou depoimento inclusive em Inquéritos Policiais; seria o Inquérito, face aos termos da nova Lei, um procedimento sujeito ao Contraditório diferido e a Ampla Defesa perdendo sua característica de Inquisitorial? Quais os limites e interpretações possíveis conferidos pela Lei n° 13.245, de 12 de janeiro de 2016?

2. Natureza Jurídica do Inquérito Policial, finalidade e meios de prova.

Seguindo o amplo posicionamento consolidado pela doutrina, a natureza jurídica do Inquérito Policial é de procedimento de natureza administrativa, não se confundindo com um processo judicial ou administrativo. Em consequência não se extrai do mesmo nenhuma imposição de sanções por parte do Estado. Não se trata de procedimento acusatório, por tal motivo, não há que se falar em partes, não existindo ainda, como na fase processual, a existência de um contraditório entre defesa e acusação, da mesma forma, todos os meios de defesa serão observados apenas com o recebimento da Ação Penal, após o recebimento da denúncia.

Podendo ser conceituado como “um procedimento inquisitório e preparatório, presidido pela autoridade policial, consistindo num conjunto de diligências realizadas pela polícia investigativa objetivando as fontes de prova e a colheita das fontes de informação quanto a autoria e a materialidade da infração penal, a fim de possibilitar que o titular da ação penal possa ingressar em juízo.”[5]

O caráter instrumental do Inquérito tem, ao menos em tese, não apenas o objetivo de impedir a instauração de uma Ação Penal infundada, inepta preservando a garantia de inocência dos investigados, como também fornecer os elementos de informação (obtidos de forma lícita) necessários a instauração do processo penal.

Pelos motivos expostos acima, pode-se extrair sua finalidade, qual seja, a colheita de elementos probatórios capazes de subsidiar aquele que tem competência para realizar a Denúncia contra quem cometeu um suposto crime habilitando dessa forma o Estado-Juiz a iniciar a persecução penal.[6]

Sendo dessa feita duas fases distintas: a fase de investigações tem o escopo de perseguir dados de informações para viabilização da ação penal ou não (sublinhe-se que de vital importância para a persecução penal). E a fase instrutória realizada em juízo em que importa a busca de provas observadas tanto para acusação como para a defesa o contraditório e a ampla defesa dos meios probatórios com a participação dialética das partes.

Seguindo a esteira do raciocínio exposto acima, forçoso concluir que pela inobservância dos princípios do contraditório e da ampla defesa, o valor probatório daquilo que foi colhido na fase investigatória possui obviamente valor relativo. Por este motivo não poderá o juízo condenar o Réu exclusivamente nos elementos colhidos na fase de inquérito, apesar dos elementos colhidos na fase investigatória complementarem e subsidiarem as provas produzidas em juízo na fase processual.

3.  A Lei 13.245/16 e a assistência do Advogado durante a fase de apuração de infrações penais.

No que compete ao sigilo da fase processual, o Artigo 5º, Inciso XXXIII da constituição federal dispõe que “todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado” e o Artigo 8º, § 5º da Convenção Americana sobre Direitos Humanos esclarece que “O processo penal deve ser público, salvo no que for necessário para preservar os interesses da justiça”.

A publicidade dos atos processuais já vinha expressa bem antes da Constituição de 1988 conforme se depreende do Artigo 792, caput, do CPP, estabelecendo que “as audiências, sessões e os atos processuais serão, em regra, públicos e se realizarão nas sedes dos juízos e tribunais, com assistência dos escrivães, do secretário, do oficial de justiça que servir de porteiro, em dia e hora certos, ou previamente designados” salvo se puder resultar em inconveniente grave ou perigo de perturbação da ordem, sendo nestes casos realizadas em locais específicos designados pelo juiz ou tribunal.

Como pode ser observada, a regra é a publicidade dos processos judiciais, sendo limitada nos casos em que a publicidade afronte a intimidade ou interesse social do sigilo e a imprescindibilidade à eficiência das investigações, assim, verifica-se que existe a possibilidade de sigilo na fase processual, em casos excepcionais e também, caso as diligências apontem para a imprescindibilidade do sigilo, na fase das investigações preliminares.

Independente da decretação do sigilo, na fase investigatória inicial, o acesso do Advogado aos autos do Inquérito é prevista no Estatuto da Advocacia (Lei 8.906 de 04 de julho de 1994), no Inciso XIV do artigo 7º, prescrevendo que “são direitos do advogado: XIV – examinar em qualquer repartição policial, mesmo sem procuração, autos de flagrante e de inquérito, findos ou em andamento, ainda que conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos”.

Introduzindo o tema que será apontado no tópico posterior, as principais características da Investigação preliminar é que a mesma constitui um procedimento escrito, inquisitório e sigiloso, dentre outras, nesta fase de colheita de informações, costuma-se não se observar os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, já que não haveria, nesta etapa, formação de litígio propriamente dito. Todavia, por óbvio, não quer dizer que o investigado ou até mesmo o indiciado, não possua direitos nesta fase.

Garantias de todo cidadão, precipuamente o direito de ser tratado com dignidade, não ser considerado como culpado, respeitado o Direito ao silêncio e o de não produzir provas contra si e, entre outros, que serão oportunamente sublinhados, o Direito de constituir Advogado.

Consequência das garantias do cidadão, o direito de toda pessoa (de seus advogados legalmente constituídos), o acesso às informações já introduzidas ou documentadas nos autos, lembrando o ministro Ayres Brito nos autos do HC 92331-3/PB, 16/06/2008, “o que vem para os Autos torna-se público”, assim é o teor da Súmula Vinculante n° 14 que dispõe ser “direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao direito de defesa”

Importante observar que a Súmula trata de procedimentos investigatórios realizados pela polícia judiciária, o que foi ampliado pela Lei 13.245/16 para a apuração de quaisquer infrações, sendo o acesso pelo advogado de todos os elementos investigatórios e probatórios dele decorrentes ou derivados, direta ou indiretamente, tanto pela polícia judiciária, processos administrativos diversos ou investigações conduzidas pelo órgão do Ministério Público, podendo, inclusive, no curso da respectiva apuração, apresentar razões e quesitos.

O Artigo 7º da Lei 13.245/16, publicada em 12 de janeiro de 2016, alterou alguns incisos do Artigo  7º do Estatuto da OAB, reforçando as prerrogativas anteriormente existentes, a princípio, fornecendo ao Advogado, instrumentos mais efetivos para a defesa técnica. Em resumo temos as seguintes modificações do Artigo 7º da Lei 13.245/16:

a) A assistência do advogado em atos de interrogatório, depoimentos e de quaisquer outros que decorram direita ou indiretamente destes passa a ser obrigatória, sendo permitida a apresentação de razões e quesitos. E ainda, a ausência dessa assistência culminará em nulidade absoluta do interrogatório (Artigo 7º, Inciso XIV e XXI);

Apesar da prescindibilidade do advogado na fase preliminar de investigação, a nova redação do Estatuto da OAB reforçou a prerrogativa da participação do Advogado no interrogatório do investigado ou indiciado no interesse deste. Assim, direito assiste ao Advogado na defesa de seu cliente para que não se efetive a nefasta situação da produção de prova em desfavor do investigado na fase pré-processual ainda que inadvertidamente.

Desta forma, caso seja negado o acesso do Advogado aos atos de interrogatório, depoimentos e de quaisquer outros que decorram direita ou indiretamente, a consequência, nestes casos, será a nulidade absoluta do ato, nulidade agora prevista em disposição legal.

Outra inovação do Inciso XIV, do Artigo 7º da Lei 13.245/16 é a possibilidade de apresentação, nos Autos da Investigação preliminar, por parte do Advogado, de razões e quesitos a Autoridade que conduz as apurações, o que de certa forma, se pensarmos na eficiência e no objetivo final do inquérito que é o indiciamento ou não, tem o objetivo de evitar uma ação penal desnecessária, tais quesitos devem por princípio visar auxiliar a correta apuração dos fatos. Conveniente destacar que toda condução é realizada pela Autoridade que preside as investigações podendo admitir ou não os quesitos, não havendo poder requisitório do advogado, o que, aliás, foi vetado pelo executivo no projeto de Lei.

b) Responsabilidade administrativa do funcionário público por abuso de autoridade em caso de retirada de peças já documentadas ou em caso de negativas dos autos em caso de solicitação do Defensor (Artigo 7º, § 12);

Reforçando que o Artigo 3º, letra “j”, da Lei 4.898/65 (lei de Abuso de autoridade) pune atentado “aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício profissional”, o dispositivo do § 12, pune a forma dolosa daquele que retira peças já documentadas ou aquele que nega acesso aos autos por solicitação do Defensor.

c) Permitida a extração de cópias em meios físicos ou digitais (podendo ser realizadas por cópias, scanners, pen drive etc) e apontamentos de autos findos ou em andamento, inclusive os conclusos a Autoridade Policial ou qualquer instituição responsável por investigações (Artigo 7º, Inciso XIV);

A primeira observação referente ao dispositivo é a alteração da expressão “repartição policial” contida no dispositivo anterior para “qualquer instituição responsável por conduzir investigação” assim maior liberdade assiste ao Advogado dentro de suas prerrogativas, na defesa de seu cliente, a quaisquer autoridades que presidam investigações, sejam elas inclusive administrativas ou do próprio Ministério Público.

Não apenas no que se refere a crimes, o inciso XIV não mais se restringe a investigações criminais, como ocorria antes da Lei nº 13.245/2016, mas a quaisquer procedimentos investigatórios, podendo na oportunidade além de tomar apontamentos, utilização de scanner portátil ou mesmo tomada de  fotos, com seu celular, dos autos dos findos ou em andamento.

Cumpre reforçar todavia que a Autoridade Policial responsável pela investigação poderá não juntar aos autos os documentos relacionados com as diligências ainda em andamento. É o que dispõe o § 11 do art. 7º do Estatuto da OAB, também acrescido pela Lei nº 13.245/2016, já que se tais informações forem repassadas ao advogado, a eficácia das investigações restaria prejudicadas.

d. Exigência da procuração apenas na hipótese dos autos estarem sujeitos ao Sigilo, consequência, o Advogado poderá, mesmo sem procuração, examinar autos de flagrante delito e investigações de quaisquer naturezas, em quaisquer instituições responsáveis por apurações de possíveis infrações (Artigo 7º, Inc XIV, § 10);

e. Finalmente, é garantido o acesso do Advogado aos autos mesmo estando as diligências em andamento e ainda não documentados nos Autos, exceto nos casos em que este acesso comprometa a eficiência, eficácia ou a finalidade das investigações (Artigo 7º, § 11).

Como salientado em tópico específico, o sigilo interno é inerente a própria investigação no objetivo de dar eficiência às investigações, não havendo que se falar em intimação do Defensor nos casos de investigações em andamento. Pela interpretação do § 11, Artigo 7º, é possível acesso do Defensor aos Autos, independente das diligências estarem em andamento ou não, documentadas ou não, sendo esta a regra, havendo exceção nos casos em que este acesso comprometa a eficiência, eficácia ou a finalidade das investigações, devendo ser delimitado o acesso pela Autoridade que preside as investigações, já que, conforme disposição da Súmula Vinculante nº 14, ainda em vigor, o direito que assiste ao Advogado é referente às peças já documentadas nos Autos, não àquelas em curso.  

Para concluir, resta-nos considerar que é fato que as investigações policiais têm força para restringir à liberdade e o patrimônio do Investigado, mesmo com respeito a doutrina que sustenta que os vícios do Inquérito Policial constitua uma “mera irregularidade” a jurisprudência dos tribunais mostra o contrário[7]. Inegável, portanto, face às consequências patrimoniais e, sob pena de não garantir adequadamente a observância do rol dos Direitos Fundamentais do investigado, a necessária (não ainda a imprescindibilidade) assistência do Advogado na fase de apuração preliminar mesmo que limitadas aos aspectos legais.

3.1. A Investigação Preliminar e as garantias do contraditório diferido.

Tomando por alicerce o que foi detalhado anteriormente, temos como principais características de uma investigação preliminar o fato da mesma ser um procedimento escrita (art. 9º., CPP), sigilosa (apesar das exceções demonstradas) e inquisitória, pois não admitem o contraditório e a ampla defesa. O contraditório é a base essencial à validade democrática dos elementos capazes de serem utilizados para condenar alguém[8], apesar da quase que inexistência deste ou da sua existência diferida, não significa que o indiciado ou investigado não seja um sujeito de direitos, muito pelo contrário, são lhes garantidos outros direitos, além dos já consagrados pela constituição, como o direito ao silêncio, o de ser tratado com dignidade, o de não se produzir provas contra si, direito a intimidade, vida privada, a imagem e a honra.

Aury Lopes Júnior (2017, p. 406), enfrentando o tema, expôs alguns desses direitos em obra que versa exclusivamente sobre as investigações preliminares. Em seu trabalho ensina que assiste ao investigado a garantia de “comunicação imediata da existência de uma imputação tão logo exista uma imputação contra pessoa determinada ou elementos suficientes que permitam identificar o potencial autor do delito, este deve ser chamado a comparecer perante a autoridade encarregada da investigação preliminar”.

Ainda esclarece que nesta “comunicação deverá constar uma síntese da imputação e esclarecer em que qualidade comparece para declarar. Deverá ser-lhe comunicado o direito de comparecer acompanhado de advogado ou solicitar a nomeação caso não tenha condição econômicas de constituir”.

Outra garantia exaustivamente exposta é o Direito ao silêncio e de solicitar diligências. Este direito deve se manifestar no momento do interrogatório, comunicando ao Investigado que o direito ao silêncio é constitucionalmente assegurado haja vista que não lhe cabe produção de provas que possam, no futuro, servir de base a uma futura incriminação. Ressalte-se que tal Direito reveste-se de uma garantia que não acarretará no futuro quaisquer consequências jurídicas. Da mesma forma, também deverá a autoridade advertir ao investigado, ou ao seu defensor, o direito de indicar provas e solicitar diligências além de apontar elementos de convicção que possam lhes ser úteis.

É permitido ao Indiciado participar ativamente da produção antecipada de provas, de perícia técnicas e provas exauríveis (que não podem ser repetidas), oferecendo quesitos e atestando os resultados, sob pena de nulidade de acordo com o artigo 156 do CPP.

Ainda necessário um filtro de admissibilidade pré-processual para a denúncia que incumbirá ao juiz garante, esta seria uma fase intermediária contraditória. É imprescindível que exista um juízo de pré-admissibilidade da acusação, presidido por um juiz e que este ato seja contraditório (LOPES JÚNIOR, 2017, p. 407), estes elementos investigatórios (e não provas) colhidos nesta fase, precisam ser confirmados pelo Juízo, legitimando a fase posterior, a ação penal.

 Por tais motivos defendemos, fortalecido por balizada doutrina que os atos produzidos sem a obediência às garantias, não terão valor processual, não integrarão os autos do processo, com o objetivo de se evitar a contaminação do processo, ressalvadas as provas produzidas no respectivo incidente de produção antecipada e das provas técnicas exauríveis.

Finalmente oportuno transcrever trecho da decisão proferida em Mandado de Segurança do Excelentíssimo Juiz André Andreucci nos autos do recurso de apelação no 31.228-3/SP em que expôs de forma brilhante que “Toda autoridade que não respeitar as prerrogativas legítimas do Advogado, no exercício regular de seu legal ministério privado, será tida como arbitrária e deverá ter seu comportamento coibido pelo Judiciário, ontem, hoje e sempre, no estado de direito, a esperança dos que buscam Justiça, dos que esperam receber o que lhes é devido por Lei”.

4. A investigação preliminar como meio de defesa para a garantia dos Direitos Humanos.

Apesar da dispensabilidade do Inquérito, inegável a importância do procedimento para o exercício do jus puniendi do Estado, todos os elementos investigatórios serão fornecidos através da denúncia, iniciando a fase processual. Todavia, há que se sublinhar que antes do indiciamento existe uma investigação que tem o objetivo de apontar um transgressor da norma material e antes da existência de um possível violador da norma existe um ser humano, digno de direitos, direitos naturais que lhes são intrínsecos.

Tais direitos foram se adaptando durante décadas, amoldaramm-se à sociedade de uma determinada época, positivados de acordo com a necessidade e valores aceitos por todos. Tais mudanças na sociedade fortaleceram as constituições modernas, enriquecidas por princípios programáticos ou já efetivamente aplicados na defesa dos Direitos Humanos. Neste contexto, está o indiciado/investigado sujeito de direitos que lhe são inerentes, e, por tais motivos, deve estar localizado no centro do sistema, sendo-lhe conferido garantias pré-processuais, à luz dos direitos fundamentais e dos tratados e normas internacionais tudo com o escopo de salvaguardar e até mesmo de dar validade a investigação.

Apesar da desonrosa constatação da resistência do modelo da não anulação dos atos produzidos na fase pré-processual, este paradigma deve ser analisado com ressalvas já que violações de direitos historicamente consagrados constitui retrocesso às conquistas obtidas a custa do sangue dos nossos antecessores. Partindo desta premissa, apenas para ilustrar o debate, vejamos alguns exemplos: o desrespeito ao “nemo tenetur se detegere” no curso da investigação, mal justificada sob a duvidosa inexistência de prejuízo, por ser o procedimento inquisitório, devem contaminar a fase processual; da mesma forma, provas obtidas por meios ilícitos, sob a égide da proporcionalidade acarretam vícios que se transportam à fase processual, o mesmo desrespeito se observa também quanto a falta de informação e esclarecimentos sobre o direito à assistência do Advogado ou o direito ao silêncio, dentre outros.

Por tais razões, deve ser vista, não como empecilho, mas como meio de efetividade do próprio processo penal, a Lei nº 13.245/2016, que acresceu o art. 7º da Lei n. 8.906/94 (Estatuto do Advogado) já que proporcionou maior efetividade de participação do advogado na fase preliminar de investigação, sendo o inciso XXI no art. 7º da Lei n. 8.906/94 já com as alterações da Lei, um norte facilitador para a incidência da ampla defesa na fase de investigação preliminar, uma vez que dispôs ser direito do advogado assistir seu cliente investigado durante a apuração de infrações, sob pena de nulidade absoluta, tanto no interrogatório, como no depoimento, e ainda, dos atos subsequentes dele dependentes, reforçando as garantias constitucionais já existentes e o arcabouço jurídico internacional dos direitos humanos sobre o tema.

Reafirmando as lições de Guilherme Nucci (2014. p. 519), “o processo penal é regido pelo princípio da prevalência do interesse do réu“, e o direito do Réu tem seu embrião na fase investigatória, importância disto foi a alteração do inciso XXI no art. 7º da Lei n. 8.906/94 pela Lei n. 13.245/2016, revelando de certa forma a importância do Contraditório, mesmo que diferido a esta fase da persecução, uma vez que inócuo garantir apenas à fase judicial  o contraditório e a ampla defesa, se tais princípios não foram minimamente observados na fase embrionária da investigação, maculando o procedimento investigatório por vícios. Neste contexto apresenta-se como relevante a investigação preliminar como meio de defesa para a garantia dos Direitos Humanos.

 Cumpri-nos como exemplo, balizando o que será explanado posteriormente, a transcrição de alguns artigos que versam sobre o tema. Assim, importante transcrição do Artigo 5º, LXIII, da CF/88, no qual “o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado”; o art. 8, 2, “g”, do Pacto de São José da Costa Rica, Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa.  Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas (…) Direito de não ser obrigado a depor contra si mesma, nem a declarar-se culpadae finalmente o art. 14, 3, “g” do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos 3. Toda pessoa acusada de um delito terá direito, em plena igualmente, a, pelo menos, as seguintes garantias: g) De não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a confessar-se culpada.”

Os atos de investigação preliminares originam-se a partir de situações concretas ou informações que são levadas aos órgãos de investigação, que vão desde um depoimento, mesmo que informal, até uma notícia exposta por um meio de qualquer meio comunicação, infinitas possibilidades para o estopim investigatório. O que não se pode olvidar é que deflagrado o início do inquérito em que haja investigados, surgem para estes vários reflexos decorrentes. Não perdendo o foco principal, qual seja, a de que o acusado, investigado ou indiciado é a princípio inocente. Vejamos a seguinte hipótese:

Imagine-se o cidadão, cercado por uma investigação, receba em seu desfavor uma intimação de uma Autoridade de Polícia Judiciária versando sobre um suposto delito por ele praticado. A lei Processual permite que medidas cautelares sejam decretadas desde o início da investigação e podem ser aplicadas para infração que tenha pena restritiva de liberdade, desde que atendidos os requisitos do artigo 282 do Código de Processo Penal: necessidade de garantia da lei e do processo penal e adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado, conforme previsto na Lei 12.403/11, que alterou o CPP e ainda cabe ressaltar que, caso verifique-se o descumprimento das medidas cautelares impostas, a prisão preventiva pode ser decretada.

De logo percebe-se que iniciado um Inquérito, este possui grande relevância no status quo do indivíduo, considerá-lo como um mero procedimento, é, não só inapropriado, pois desmerece o trabalho da própria autoridade presidente, como temeroso, já que o cidadão verá sua esfera jurídica invadida pelo transtorno investigatório. Por esta razão revela-se acertada a fundamentação do ato de indiciamento pelo delegado de polícia ao fundamentar o ato por meio de uma decisão, expondo seu convencimento com as razões de fato e de direito (a Lei 12.830/13).

Relevante destacar que no exemplo anterior tratamos da investigação, imaginemos agora o indiciamento? Ao concluir pelo indiciamento, a Autoridade Policial, mesmo cercada por todos os cuidados de praxe, apontará o investigado como provável Autor do crime. Assim, primeiramente ocorrerá a sua identificação criminal (com as ressalvas da Lei 12.037/09) e identificação datiloscópica, se não tenha sido civilmente identificado, depois poderá o indiciado ver, dependo da legislação aplicável, o seu afastamento do cargo público (12.683/12- Lavagem de Capitais), outras legislações o estigmatizam como sujeito ativo de um crime equiparado a hediondo (Lei 11.343/06 – Lei de Drogas) e também o impede para aquisição de arma de fogo, nos termos do artigo 4º, inciso II, do Estatuto do Desarmamento, sem falar na marca social do indiciamento, que o denigre perante a sociedade, certamente trazendo reflexos em sua vida pública, profissional e familiar, além de um forte indicativo de o mesmo ser submetido à fase processual onde provavelmente responderá a uma Ação Penal, correndo o risco de ser condenado e preso.

Por este motivo, o artigo 7°, inciso XXI, “a”, do Estatuto da OAB, com as inovações trazidas pela lei nº 13.245/2016, permite que o advogado possa apresentar razões e quesitos, o que demonstra uma aproximação do legislador dos princípios da ampla defesa e do princípio do contraditório, inclusive sob pena de nulidade absoluta em casos de inobservância, como já salientado, obviamente que de forma diferida haja vista as características do procedimento investigatório.

Não por outro motivo, Lopes Jr. (2017, p. 470) explica que a intenção da lei não foi limitar o contraditório aos acusados em ações penais, mas aos acusados em geral, inclusive nos Inquéritos, “devendo nela ser compreendidos também o indiciamento e qualquer imputação determinada, pois não deixam de ser imputação em sentido amplo.”. E ainda, como se trata de direitos fundamentais, a interpretação buscará sempre uma interpretação ampliativa e nunca restritiva, fortalecendo a tese da aplicação do contraditório no procedimento, desde que não prejudique ou limite as investigações posto que neste primeiro momento, estamos nos referindo a informação, reforçando – se que não se pode vislumbrar a plenitude do contraditório numa fase pré-processual.

Ao que parece, viabilizando os princípios fundamentais a nova Lei 13.245/16, busca tornar viável a participação da defesa técnica na fase preliminar de investigação dando oportunidade do advogado (presidido e sob o crivo da Autoridade Policial) de fazer perguntas ao investigado ou às testemunhas durante o inquérito policial, acompanhando o procedimento como prerrogativa de seu ofício, podendo de certa forma, auxiliar o convencimento do magistrado na próxima fase, a fase da ação penal, na busca da verdade real.

Por estas poucas razões, vemos na investigação preliminar e no indiciamento, não um “mero” procedimento desprovido de importância, mais um ato impregnado de complexidade para a vida do cidadão. Assim, aumenta a importância do cuidado que deve ser conferido a figura do investigado/indiciado na fase pré-processual.

Tendo com linha diretriz a ideia de que o investigado não deve ser considerado como objeto de direito, mas como sujeito de direito, cercado por todas as garantias a ele inerentes, podendo utilizar de todos os meios que lhe permitam confrontar (e aí temos o contraditório) os elementos de prova que digam respeito à autoria ou materialidade da infração na fase preliminar auxiliando os órgãos de investigação e a justiça (porque este deve ser o entendimento, auxilio a Polícia Judiciária em seu mister) no intuito de evitar que processos desprovidos de legalidade possam culminar em ações penais.

Conclusão

Diante do exposto e, apesar do contexto histórico Brasileiro que cercou a edição da Lei 13.245, de 12 de janeiro de 2016, nunca antes levado “às claras” como agora, deve se ter em mente a prevalência de seu objetivo que é o fortalecimento dos direitos fundamentais, Direitos estes, obtidos muitas vezes, fruto de verdadeiras revoluções e mudanças de modelos constitucionais. A efervescência deste contexto, todavia, não pode criar mais embaraços à justiça, o acesso a informação, a oportunidade de apresentação de quesitos ou questões, o Direito da presença do Advogado em interrogatórios, deve sim, alinhar-se aos ideais de justiça tão perseguidos neste País ou em qualquer lugar do mundo, desrespeitá-los seria um retrocesso.

Assim, do ponto de vista processual constitucional e humanitário, a Lei n° 13.245, de 12 de janeiro de 2016, que alterou o Artigo 7° do Estatuto da OAB (Lei Lei no 8.906, de 4 de julho de 1994) de certa forma, fortaleceu e atualizou o entendimento de que, nos mais diversos procedimentos investigatórios, devem ser observados a presença dos princípios do contraditório e da ampla defesa, ainda que com o alcance mais limitado que aqueles já conhecidos na fase processual.

 Cabendo ainda retomar que o investigado ou o indiciado ainda na fase pré-processual pode ser obejeto de medidas cautelares, o que por si só, independente da efetiva Ação Penal, já é um transtorno incalculável como já debatido. Por tais motivos, concluímos que o objetivo da lei é orientar a condução da persecução penal, fortalecendo o contraditório no inquérito policial, obviamente, sempre que não houver risco à eficácia das investigações.

Ao que parece, não sendo intenção nem do legislador, nem do constituinte negar a oportunidade de maior participação da defesa aos trabalhos balizados pela Autoridade presidente do Inquérito ou das Investigações. Fortaleço o posicionamento de que restringir a Defesa na fase pré processual é suprimir importante momento para o investigado tomar ciência dos fatos que pesam contra si mediante prévia e reservada orientação do seu advogado, conhecer as consequências dos riscos e benefícios do seu interrogatório, entender a extensão das garantias ao silencio, da mesma forma, exercer sua defesa de forma plena auxiliado pela técnica, como é do espírito democrático.

 

Referências
ALEXY, Robert. Teoría de los Derechos Fundamentales. Madrid: Centro de Estúdios Políticos y Constitucionales, 2002. p.89
BITENCOURT,  Cezar Roberto. Manual de Direito Penal – Parte Geral – Ed. Revistas dos Tribunais – 4a ed. 2017, p. 45.
BRASIL, Lei 11.343, de 23 de agosto de 2006. URL: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11343.htm. Acesso  em: 23.05.2017; 21:00.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília: Senado Federal, 1988.Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm> Acessado em: 15/05/2017; 12:25
BRASIL. Código de Processo Penal. decreto lei nº 3.689, de 03 de outubro de 1941. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/Decreto-Lei/Del3689.htm. Acesso em: 22 jul 2017, 16:25:00
BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Editora Elsevier Brasil, 1992.
LOPES JÚNIOR, Aury.. Investigação Preliminar No Processo Penal. 6ª Edição, São Paulo: Editora Saraiva, 2017.
LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal, vol. Único, 4. ed. Salvador, BA: Juspodivm, 2016.
NUCCI. Guilherme de Souza. “Código de Processo Penal Comentado”. 13. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2014.
 
 Notas:
 
[1] BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Organização de Alexandre de Moraes. 16.ed. São Paulo: Atlas, 2000. P. 133

[2]   Art. 405.  Do ocorrido em audiência será lavrado termo em livro próprio, assinado pelo juiz e pelas partes, contendo breve resumo dos fatos relevantes nela ocorridos. § 1o  Sempre que possível, o registro dos depoimentos do investigado, indiciado, ofendido e testemunhas será feito pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica similar, inclusive audiovisual, destinada a obter maior fidelidade das informações § 2o  No caso de registro por meio audiovisual, será encaminhado às partes cópia do registro original, sem necessidade de transcrição (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

[3] BRASIL, Supremo Tribunal Federal. HC: 82.354 PR. Relator: PERTENCE, Sepúlveda. Disponível em: https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/767739/habeas-corpus-hc-82354-pr. Acessado em 15/07/2017; 12:25.

[4] Inciso XXI, do Artigo 7º da Lei n° 13.245, de 12 de janeiro de 2016, que alterou o Artigo 7° do Estatuto da OAB (Lei Lei no 8.906, de 4 de julho de 1994).

[5] LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal, vol. Único, 4. ed. Salvador, BA: Juspodivm, 2016, p. 107.

[6] Cumpre salientar que apesar do imprescindível lastro probatório apontado pela autoridade policial nas investigações consolidadas através do Inquérito, é característica do mesmo, seu caráter dispensável, ou seja, caso existam elementos suficientes para que o Ministério Público possa denunciar o possível autor da Infração, esta denúncia será realizada independente da prévia instauração do Inquérito Policial.

[7] STF, RE 680.557, Relator Min Luis Fux, DJ 24/06/15; STF, HC 106.566, Relator Min Gilmar Mendes, DJ 16/12/14; STJ, HC 137.349, Relator Min Maria Thereza de Assis Moura, DJ 20/02/10; STJ HC 149.250, Relator Min Adilson Vieira Macabu, DJ 07/06/11.

[8] ROSA, Alexandre Moraes da. Porque as testemunhas precisam depor em juízo penal?< http://emporiododireito.com.br/tag/investigacao-preliminar/#_ftnref5> Acesso em 25/07/17.


Informações Sobre o Autor

Ricardo Pessoa Gomes

Graduado em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco. Pós Graduado em Direito Administrativo Público pela Universidade Castelo Branco – RJ. Pós Graduando em Direito Penal e Processo Penal pela Escola de Direito do Ministério Público – MS. Assessor Jurídico


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