O direito penal do inimigo e o princípio da dignidade humana: (in)compatíveis?

Resumo: Este trabalho apresenta os pontos básicos da tese do Direito Penal do Inimigo, como a construção jusfilosófica da figura do inimigo, a existência de dois direitos penais, a teoria preventiva positiva da pena e o juízo de periculosidade, além de posições doutrinárias acerca da teoria e breves citações de exemplos da influência desta sobre legislações atuais. Após, são abordados o histórico, conceito, natureza jurídica e previsões normativas do princípio da dignidade humana, além de uma breve reflexão sobre ser possível ou não sua relativização. Por fim, confronta-se os dois temas, visando verificar se haveria incompatibilidade entre eles. Reflete-se, sobretudo, a respeito da utilização do ser humano para o alcance de metas criminais e de segurança pública e o tratamento dispensado a certos infratores para alcançar-se uma política criminal expansiva e controlada pelo poder estatal dominante.

Palavras-chave: Direito Penal. Direito Penal do Inimigo. Dignidade da pessoa humana.

 

Abstract: This paper presents the basic points of the Enemy Criminal Law, like the jusphilosophical construction of the enemy’s figure, the existence of two different criminal laws, the positive prevention theory of punishment, the dangerousness’ judgment, the criminal specialist’s opinion about that theory and its influence on the actual laws. Then, this paper tells about key elements of the human dignity principle, such as history, concept, legal, normative predictions and relativity signals. Finally, considering both studied themes, it discusses some incompatibilities between Jakobs’ thesis and the human’s dignity in the rule of law, as the objectal using of the human being towards criminal and public safety goals and the inhuman treatment of some infractors in order to reach a criminal policy that is expansive and controlled by the dominant state power.

Keywords: Criminal Law. Criminal Law of the Enemy. Dignity of the human person.

 

Sumário: Introdução. 1. O Direito Penal do Inimigo. 1.1. Fundamentos filosóficos para a construção da figura do inimigo. 1.2. Dois Direitos Penais. 1.3. A função preventiva da pena e o Direito Penal do Inimigo. 1.4. Um juízo de periculosidade. 1.5. Características básicas do Direito Penal do Inimigo. 1.6. Terceira velocidade do Direito Penal. 1.7. Direito Penal do Inimigo: um Direito Penal do Fato ou um Direito Penal do Autor? 1.8. Vestígios de aplicação do Direito Penal do Inimigo. 2. O princípio da dignidade humana. 2.1. Breve histórico do princípio da dignidade humana. 2.2. Conceito de dignidade humana. 2.3. Dignidade como característica intrínseca do ser humano. 2.4. Previsões normativas do princípio. 3. Uma crítica ao Direito Penal do Inimigo em face do princípio da dignidade humana. 3.1. Relativização da dignidade humana? 3.2. Não apenas relativização: a desconsideração da dignidade da pessoa humana. 3.3. Para o fim de manutenção da ordem social vigente. Conclusão.

 

Introdução

Uma das teorias mais recentes do Direito Penal, o denominado Direito Penal do Inimigo, apresentado, e mais tarde defendido, pelo professor alemão Günther Jakobs, ganhou força nos últimos anos como resposta ao aumento dos ataques terroristas, da criminalidade econômica[1], das organizações criminosas, dentre outros (JAKOBS, 2008, p. 35-36). Com o fim de eliminar as graves violações e ameaças ao Estado de Direito constituído, essa teoria propõe a relativização e até mesmo o suprimento de direitos e garantias penais e processuais, de acordo com um juízo de periculosidade, o qual pode autorizar a aplicação de medidas de segurança preventivamente, isto é, mesmo antes do cometimento do delito.

A partir de tais reflexões, segue-se uma indagação importante em relação à referida teoria. Se ela poderia afrontar gravemente fundamentos e princípios do Estado Democrático de Direito, mais especificamente o princípio da dignidade humana. Nesse ínterim, vale ressaltar que, segundo versa esse princípio, a dignidade do tratamento e do respeito a um ser enquanto pessoa é inerente a todos os seres humanos, o que impõe um mínimo invulnerável de direitos e garantias, os quais não podem ser ignorados ou descartados pelo arbítrio do Estado (MORAES, 2002, p. 128).

Uma vez que tem emergido inúmeros sinais de influências do Direito Penal do Inimigo no ordenamento jurídico brasileiro (GOMES, 2010, p. 2-3; GRECO, 2009, p. 23-24), torna-se de extrema relevância uma leitura de confronto dessa teoria com o princípio da dignidade humana – princípio esse petrificado na Constituição brasileira vigente -, a fim de verificar se haveria alguma incompatibilidade entre eles e, consequentemente, se haveria incoerência principiológica constitucional em se adotar elementos da teoria do Direito Penal do Inimigo no ordenamento legal brasileiro. Para analisar possíveis contradições, abordar-se-á, primeiramente, uma breve noção da teoria do Direito Penal do Inimigo, seguida de uma pequena análise epistemológica e histórica do princípio da dignidade da pessoa humana para, então, chegar-se a um estudo comparativo breve acerca dos dois temas.

1. O DIREITO PENAL DO INIMIGO

Antes de se adentrar nas principais características, importa mostrar que o Direito Penal do Inimigo, na concepção atual exposta por Günter Jakobs, possui raízes filosóficas no contratualismo social, como se verá adiante.

1.1. Fundamentos filosóficos para a construção da figura do inimigo

O Direito Penal do Inimigo busca fundamento para a ideia de inimigo nos filósofos contratualistas modernos, como Hobbes, Rousseau, Fichte e Kant. Na concepção contratualista de Estado, os homens viviam em um estado de natureza, no qual não havia ordem, lei, direitos ou deveres estabelecidos. Cada indivíduo vivia para si e por suas próprias forças. Assim, havia uma constante insegurança e instabilidade social, uma vez que todos estavam contra todos, na medida em que cada homem representava uma iminente ameaça ao seu semelhante.

Para Kant[2] (apud JAKOBS, 2008, p. 28-30), o estado de natureza é um estado de guerra, e a segurança e a ordem pacíficas somente seriam possíveis se estabelecidas pelo Estado civil. Isso teria feito os homens se reunirem e, a partir do contrato social, constituírem o Estado, o qual, composto de leis civis dirigidas aos cidadãos, limitaria uma parcela da liberdade de cada indivíduo a fim de oferecer segurança e paz a todos. Consequentemente, para a manutenção desse Estado civil, os cidadãos deveriam se subordinar de modo permanente ao ordenamento jurídico estabelecido, como forma de garantir aos demais um padrão de comportamento pessoal que não viole os direitos subjetivos de ninguém.

Caso houvesse alguma pessoa que não se conformasse a esse Estado organizado e insistisse em viver no anterior estado de natureza, essa seria considerada inimiga do Estado e deveria ser rigorosamente eliminada. Sendo assim, “se um homem permanece em estado de natureza, é considerada legítima qualquer ação que seja hostil em relação a ele, mesmo que não tenha cometido nenhum delito, pois, ao estar fora do Estado civil, considera-se como constante ameaça à paz, a sua presença” (CARVALHO JÚNIOR, 2012).

O inimigo, ao quebrar o contrato social, abandonaria não somente o Estado civil, mas a sua titularidade como cidadão e os direitos decorrentes dela. Se ele se guia pelo estado natural, o Estado deveria tratá-lo conforme as regras do estado de hostilidade e não sob as leis civis. Nesse sentido, GOMES (2010, p. 1-2) resume bem o discurso dos contratualistas: “(a) o inimigo, ao infringir o contrato social, deixa de ser membro do Estado, está em guerra contra ele; logo, deve morrer como tal (Rousseau); (b) quem abandona o contrato do cidadão perde todos os seus direitos (Fichte); (c) em casos de alta traição contra o Estado, o criminoso não deve ser castigado como súdito, senão como inimigo (Hobbes); (d) quem ameaça constantemente a sociedade e o Estado, quem não aceita o ‘estado comunitário-legal’, deve ser tratado como inimigo (Kant)”.

Portanto, nessa concepção, as leis civis do Estado devem ser garantidas apenas ao cidadão, pois é quem se enquadra nas regras de controle social. É justamente a partir dessa dualidade entre o homem civil e o homem natural que Jakobs apresenta a necessidade de dois ordenamentos jurídicos criminais: um Direito Penal para o Cidadão e um Direito Penal para o Inimigo.

1.2. Dois Direitos Penais

Conforme Jakobs (2008, p. 28), o indivíduo que se rebela gravemente contra o ordenamento jurídico estabelecido, como em um ato de alta traição, não apenas deixa de ser cidadão, mas perde o status de pessoa, devendo ser considerando uma não-pessoa. O autor acrescenta: “De modo similar, argumenta Fichte: quem abandona o contrato cidadão em um ponto em que no contrato se contava com sua prudência, seja de modo voluntário ou por imprevisão, em sentido estrito perde todos os seus direitos como cidadão e como ser humano, e passa a um estado de ausência completa de direitos” (JAKOBS, 2008, p. 26).

Assim Jakobs fundamenta a existência de um Direito Penal para o Cidadão e um outro Direito Penal para o Inimigo. O Direito Penal do Cidadão, composto de todas as garantias penais e processuais, deve ser mantido para o cidadão delinquente eventual. Para ele, o ordenamento jurídico deve preservar o status de pessoa do cidadão criminoso, pois este tem o direito de tentar ajustar-se com a sociedade e reparar a sua transgressão (JAKOBS, 2008, p. 26).

O criminoso cidadão é um transgressor da norma em relação à sua vigência. Em princípio, ele não afronta o Direito e o Estado, mas apenas um determinado bem jurídico tutelado penalmente, a fim de conseguir alguma vantagem pessoal. Um exemplo seria o filho que mata o pai para receber a herança. Portanto, o objetivo do Direito Penal do Cidadão é reafirmar a vigência da norma para esse delinquente e para os demais cidadãos (JAKOBS, 2008, p. 22).

Por outro lado, o Direito Penal do Inimigo direciona-se ao indivíduo não-cidadão, que representa uma ameaça constante à constituição civil existente e, por isso, deve receber uma resposta não jurídica, mas coercitiva, a fim de se eliminar um perigo de guerra que ele representa (JAKOBS, 2008, p. 30). Isso porque o inimigo do Estado “não proporciona a garantia cognitiva mínima necessária a um tratamento como pessoa” (JAKOBS, 2008, p. 35). Assim, é tido como certo que, ainda que o inimigo recebesse um direito penal garantista, não se ajustaria como cidadão. Antes, voltaria, com toda certeza, presume-se, a delinquir.

O inimigo, por causa do seu comportamento grave, socialmente insubmisso, nega o estado de cidadania e de legalidade e não mostra interesse em colaborar com a manutenção da norma[3] e, consequentemente, do Estado civil. Nas palavras de Jakobs (2008, p. 37), “o Direito Penal contém dois pólos ou tendências de suas regulações. Por um lado, o trato com o cidadão, em que se espera até que este exteriorize seu fato para reagir, com o fim de confirmar a estrutura normativa da sociedade, e por outro, o trato com o inimigo, que é interceptado prontamente em seu estágio prévio e que se combate por sua perigosidade (sic)”.

Ademais, Jakobs defende que o Direito Penal do Inimigo deve ser aplicado de modo preventivo. O inimigo deve ser combatido na fase de preparação do delito, em função do seu alto grau de periculosidade ao ordenamento. Assim, justifica-se não a instauração de um processo penal, mas de um procedimento de guerra (GOMES, 2010, p. 1).

1.3 A função preventiva da pena e o Direito Penal do Inimigo

A posição de Jakobs sobre a reação do Estado ao inimigo justifica-se também pela sua defesa do funcionalismo radical da norma. Segundo Gomes (2010), “Günter Jakobs, tido como um dos mais brilhantes discípulos de Welzel, foi o criador do funcionalismo sistêmico (radical) que sustenta que o Direito Penal tem a função primordial de proteger a norma (e só indiretamente tutelaria os bens jurídicos mais fundamentais)”.

Para Jakobs, a pena significa coação. E essa coação não é apenas a imposição da norma, mas também a segurança contra a delinquência habitual, ou seja, a função preventiva que a pena exerce contra a reincidência da conduta delituosa. Por meio da coação, a pena se direciona ao fato passado – o crime -, para aplicar o juízo da norma ao criminoso e pra que seja reafirmado, para ele e para toda a sociedade, que a norma violada em nada se alterou quanto à sua vigência, devendo, portanto, ser respeitada. “A coação é portadora de um significado, portadora da resposta ao fato: o fato como ato de uma pessoa racional, significa algo, significa uma desautorização da norma, um ataque a sua vigência, e a pena também significa algo; significa que a afirmação do autor é irrelevante e que a norma segue vigente sem modificações, mantendo-se, portanto, a configuração da sociedade” (JAKOBS, 2008, p. 22).

Por outro lado, a pena também se direciona para o futuro, pois, ao ser executada no criminoso, pretende produzir segurança de que (a) o criminoso não cometerá mais crimes no âmbito da sociedade, ao menos enquanto estiver cumprindo pena de privação da liberdade, a chamada função preventiva especial da pena (JAKOBS, 2008, p. 22); (b) a partir da reafirmação da vigência da norma, evitar-se-á que outros indivíduos violem aquela norma – a chamada função preventiva geral da pena.

Ademais, a pena, para Jakobs, possui a função de fortalecer a credibilidade e a confiança sociais no Direito. Diante de uma transgressão à norma, a aplicação da pena promove a integração social, pois atende às expectativas da sociedade, frustrada pelo delito, ao assegurar que existe um ordenamento vigente que será sempre executado, o que incentivaria os cidadãos retos a continuarem a se submeter ao Direito.

Portanto , no Direito Penal do Cidadão, a pena assume uma função contrafática, isto é, de contrariar a violação da norma. Por esse motivo, Jakobs propõe uma teoria da prevenção geral positiva da pena: “prevenção geral para que produza efeito em todos os membros da sociedade, e positiva, para que o efeito gerado não seja o medo frente à pena, mas sim a certeza da vigência da norma, que foi agredida pela infração e tornou a ser fortalecida pela pena” (MORAES apud CARVALHO JÚNIOR, 2012)

Para o autor, a pena deverá ser direcionada apenas ao cidadão, aquele que é visto como pessoa, como um sujeito de direitos, o qual será reprovado por um juízo de culpabilidade pelo fato que cometeu. Já no Direito Penal do Inimigo, uma vez que este representa um perigo, uma ameaça de violações futuras ao ordenamento, deve-se haver um juízo de periculosidade. Para o inimigo, não resta a pena, mas sim, a medida de segurança (JAKOBS, 2008, p. 37), como se explicará à frente.

1.4. Um juízo de periculosidade

Jakobs (2008, p. 36) argumenta que o inimigo deve ser tratado conforme sua periculosidade e deve ser combatido previamente ao cometimento de delitos, uma vez que ele já representa uma ameaça à norma. Não se deve esperar ocorrer um fato criminoso, antes o Estado deve se antecipar, de modo a eliminar o perigo que o inimigo representa e se sobrepor a ele, como ocorre no confronto de guerra.

O perigo de dano futuro, presumido a partir das normas vigentes no presente, encontra-se no âmbito interno do indivíduo (CARVALHO JÚNIOR, 2012). Nesse ponto, Greco (2009, p. 18) explica que “Há pessoas, segundo Jakobs, que decidiram se afastar, de modo duradouro, do Direito, a exemplo daqueles que pertencem a organizações criminosas e grupos terroristas. Para esses, ‘a punibilidade se adianta um grande trecho, até o âmbito da preparação, e a pena se dirige a assegurar fatos futuros, não a sanção de fatos cometidos’ ” .

Jakobs (2008, p. 36) cita, como exemplo, o terrorista, um indivíduo perigoso, de quem não se deve esperar qualquer garantia de comportamento em conformidade com a norma, pois o seu objetivo, a princípio, é destruir a ordem social vigente. Assim, para essa não-pessoa, a qual representa iminente perigo, o Estado deve aplicar imediata e previamente uma medida de segurança, à semelhança da que é dada para os penalmente inimputáveis, como o deficiente mental, que não pode garantir à sociedade que se portará em conformidade com a norma.

Por fim, Jakobs (2008, p. 39-41) argumenta que, mesmo que não se adote expressamente um Direito Penal do Inimigo, há vários institutos de Direito Processual Penal adotados pelos Estados contemporâneos que estão fundamentados em tal juízo de periculosidade. O autor cita como exemplo a prisão preventiva, a qual seria uma forma de coação física que visa à segurança social, justificada por conceitos legais vagos. Cita, também, as investigações secretas por meras suspeitas, os agentes policiais infiltrados e outros.

1.5. Características básicas do Direito Penal do Inimigo

A partir da exposição de Jakobs e dos estudos posteriores sobre o Direito Penal do Inimigo, pode-se apontar diversas características da referida teoria. Meliá (p. 79-81 apud GRECO, 2009, p. 19) aponta três elementos formadores do Direito Penal do Inimigo que podem ser considerados como características centrais: “em primeiro lugar, se constata um amplo adiantamento da punibilidade, quer dizer, que neste âmbito, a perspectiva do ordenamento jurídico-penal é prospectiva (ponto de referência: o fato futuro), em lugar de – como é habitual – retrospectiva (ponto de referência: o fato cometido). Em segundo lugar, as penas previstas são desproporcionadamente altas: especialmente, a antecipação da barreira de punição não é tida em conta para reduzir em correspondência a pena ameaçada. Em terceiro lugar, determinadas garantias processuais são relativizadas ou, inclusive, suprimidas”.

Gomes (2010, p. 2) elucida as seguintes particularidades do Direito Penal do Inimigo: “(a) o inimigo não pode ser punido com pena, sim, com medida de segurança; (b) não deve ser punido de acordo com sua culpabilidade, senão consoante sua periculosidade; (c) as medidas contra o inimigo não olham prioritariamente o passado (o que ele fez), sim, o futuro (o que ele representa de perigo futuro); (d) não é um Direito Penal retrospectivo, sim, prospectivo; (e) o inimigo não é um sujeito de direito, sim, objeto de coação; (f) o cidadão, mesmo depois de delinquir, continua com o status de pessoa; já o inimigo perde esse status (importante só sua periculosidade); (g) o Direito Penal do cidadão mantém a vigência da norma; o Direito Penal do inimigo combate preponderantemente perigos; (h) o Direito Penal do inimigo deve adiantar o âmbito de proteção da norma (antecipação da tutela penal), para alcançar os atos preparatórios; (i) mesmo que a pena seja intensa (e desproporcional), ainda assim, justifica-se a antecipação da proteção penal; (j) quanto ao cidadão (autor de um homicídio ocasional), espera-se que ele exteriorize um fato para que incida a reação (que vem confirmar a vigência da norma); em relação ao inimigo (terrorista, por exemplo), deve ser interceptado prontamente, no estágio prévio, em razão de sua periculosidade”.

Como o Direito Penal do Inimigo não considera que o indivíduo perigoso seja sujeito de direitos, a finalidade de aniquilar o perigo justificará o uso de meios desproporcionais, inquisitórios e arbitrários, se comparados ao Direito Penal do Cidadão. Assim, a tese em questão viola frontalmente diversos princípios e garantias de proteção ao ser humano, à medida em que os relativiza ou até mesmo os suprime, seja no âmbito do Direito Penal Material ou no âmbito do Direito Penal Processual.

1.6. Terceira velocidade do Direito Penal

Greco (2009, p. 19-20) afirma que o Direito Penal do Inimigo, em relação ao processo de expansão do Direito Penal[4] descrito por Jésus Maria Silva Sánchez[5] (apud GRECO, 2009, p. 19), enquadra-se na terceira velocidade do Direito Penal. A primeira velocidade seria representada pela aplicação da pena privativa de liberdade, com todas as garantias penais e processuais presentes. Já a segunda velocidade caracterizar-se-ia pela aplicação de penas não privativas de liberdade, como as penas restritivas de direito e a multa, havendo uma certa relativização das garantias, a fim de tornar mais célere a aplicação da lei penal.

A terceira velocidade seria um modelo misto, ou híbrido, dessas duas velocidades, de modo a combinar a aplicação da pena privativa de liberdade com uma flexibilização dos princípios e regras de culpabilidade, a fim de agilizar a condenação e o cumprimento da política criminal (MELIÁ, 2008, p. 68-69)[6].

1.7. Direito Penal do Inimigo: um Direito Penal do Fato ou um Direito Penal do Autor?

A partir das características explicitadas, é possível concluir que o Direito Penal do Inimigo é um Direito Penal do Autor, uma vez que pune o indivíduo não pelo fato criminoso, mas pelo seu estilo de vida ou pelas suas características pessoais. Não pela conduta praticada, mas, sob o prisma preventivo, pune-se o indivíduo pelo que ele é e pelo que representa socialmente. Quanto a essa classificação, Roxin[7] (apud GRECO, 2008, p. 394) explica que “por direito penal do fato se entende uma regulação legal, em virtude da qual a punibilidade se vincula a uma ação concreta descrita tipicamente e a sanção representa somente a resposta ao fato individual, e não a toda a condução de vida do autor ou aos perigos que no futuro se esperam do mesmo. Ao contrário, se tratará de um direito penal do autor quando a pena se vincule à personalidade do autor e seja a sua anti-socialidade (sic) e o grau da mesma que determinem a sanção”.

Também Meliá (2008, p. 80) conclui que há uma afronta ao clássico princípio da punição pelo fato no Direito Penal do Inimigo, o que prejudica o tratamento igualitário na tipificação e punição de diferentes delinquentes, “como é sabido, o Direito penal do inimigo jurídico-positivo vulnera, assim se afirma habitualmente na discussão, em diversos pontos, o princípio do direito penal fato. Na doutrina tradicional, o princípio do direito penal fato se entende como aquele princípio genuinamente liberal, de acordo com o qual devem ser excluídos da responsabilidade jurídico-penal os meros pensamentos, isto é, rechaçando-se um Direito penal orientado na ‘atitude interna’ do autor”.

1.8. Vestígios de aplicação do Direito Penal do Inimigo

Embora encontre forte resistência doutrinária e legislativa, o Direito Penal do Inimigo influencia vários institutos e regulamentações pontuais dos ordenamentos jurídicos contemporâneos ocidentais. Devido ao crescente clamor popular por penas mais rígidas, inflamado pelo sensacionalismo midiático, adota-se um Direito Penal Máximo para a punição dos inimigos sociais, lançando mão de penas desproporcionais e de métodos imprecisos de investigação.

Nesse sentido, pode-se identificar, inclusive no Brasil, algumas aplicações pontuais do Direito Penal do Inimigo em meio ao Direito Penal garantista adotado por alguns Estados: “(a) flexibilização do princípio da legalidade (descrição vaga dos crimes e das penas); (b) inobservância de princípios básicos como o da ofensividade, da exteriorização do fato, da imputação objetiva etc.; (c) aumento desproporcional de penas; (d) criação artificial de novos delitos (delitos sem bens jurídicos definidos); (e) endurecimento sem causa da execução penal; (f) exagerada antecipação da tutela penal; (g) corte de direitos e garantias processuais fundamentais; (h) concessão de prêmios ao inimigo que se mostra fiel ao Direito (delação premiada, colaboração premiada etc.); (i) flexibilização da prisão em flagrante (ação controlada); (j) infiltração de agentes policiais; (l) uso e abuso de medidas preventivas ou cautelares (interceptação telefônica sem justa causa, quebra de sigilos não fundamentados ou contra a lei); (m) medidas penais dirigidas contra quem exerce atividade lícita (bancos, advogados, joalheiros, leiloeiros etc.)” (GOMES, 2010, p. 2-3).

No contexto brasileiro, pode-se acrescentar o rigoroso tratamento legislativo dado ao traficante de drogas na então vigente Lei n. 11.343, de 23 de agosto de 2006. Prova de tal tratamento diferenciado é o fato de o crime de tráfico de drogas ter previsão legislativa de ser equiparado a crime hediondo e, em razão disso, possuir regime inicial de cumprimento de pena obrigatoriamente fechado, contendo condições mais rigorosas de progressão de regime e não permitindo a aplicação dos benefícios penais de indulto, graça e anistia[8]. Outro exemplo é a chamada lei brasileira do abate, que permite a derrubada e destruição de aeronaves sob suspeita de tráfico de substâncias entorpecentes e drogas afins, a partir do argumento de que essas podem representar uma ameaça à segurança pública[9].

Nesse contexto, Jakobs (2008, p. 43-44) critica as legislações penais dos Estados contemporâneos, pois adotam um Direito Penal de garantias, mas aplicam pontos do Direito Penal do Inimigo sem prévio planejamento e coerência, transportando o juízo de periculosidade do inimigo para crimes mais simples, como o roubo, a fim de combater não uma grave ameaça à constituição do Estado de Direito, mas um mero dano pontual à vigência de uma norma específica. “Um Direito penal do inimigo, claramente delimitado, é menos perigoso, desde a perspectiva do Estado de Direito, que entrelaçar todo o Direito penal [do Cidadão] com fragmentos de regulações próprias do Direito penal do inimigo” (JAKOBS, 2008, p. 49-50).

Por fim, Jakobs (2008, p. 47-48) vai além e demonstra que vários Tribunais Penais Internacionais estabelecidos para processar e julgar graves violações a direitos humanos, como os conhecidos Tribunais de Nuremberg, de Tóquio e o Tribunal Internacional para Ruanda, nada mais são do que uma aplicação acelerada do Direito Penal do Inimigo. Isso porque tais tribunais, instituídos após os acontecimentos dos fatos, adotam um processo de exceção – ad hoc –, e condenam o infrator sem a existência de uma norma penal previamente positivada. “A punição internacional ou nacional de vulnerações dos direitos humanos, depois de uma troca política, mostra traços próprios do Direito penal do inimigo, sem ser só por isso ilegítima” (JAKOBS, 2008, p. 50).

2. O Princípio da dignidade humana

2.1. Breve histórico do princípio da dignidade humana

A ideia de dignidade do homem foi concebida paulatinamente, tendo recebido diferentes contribuições ao longo da História. É possível identificar a origem da ideia de dignidade como algo inato a todo ser humano na filosofia judaico-cristã. Noção que foi expandida e salientada pelos discursos de Jesus sobre igualdade de valor entre homens e mulheres, ricos e pobres, sacerdotes e marginais, conforme colocado por Greco (2009, p. 55). Mais tarde, o movimento iluminista dos séculos XVII e XVIII ressaltou o valor intrínseco do ser humano racional e a necessidade de respeito de sua dignidade por todos, principalmente pelo monarca e pelo Estado.

Barroso mostra que ao longo da história da civilização judaico-cristã, a noção de valorização do ser humano teve diferentes sentidos: “A dignidade da pessoa humana, na sua acepção contemporânea, tem origem religiosa, bíblica: o homem feito à imagem e semelhança de Deus. Com o Iluminismo e a centralidade do homem, ela migra para a filosofia, tendo por fundamento a razão, a capacidade de valoração moral e autodeterminação do indivíduo. Ao longo do século XX, ela se torna um objetivo político, um fim a ser buscado pelo Estado e pela sociedade. Após a 2ª. Guerra Mundial, a idéia (sic) de dignidade da pessoa humana migra paulatinamente para o mundo jurídico, em razão de dois movimentos. O primeiro foi o surgimento de uma cultura pós-positivista, que reaproximou o Direito da filosofia moral e da filosofia política, atenuando a separação radical imposta pelo positivismo normativista” (BARROSO, 2010, p. 4).

2.2. Conceito de dignidade humana

O significado de dignidade humana não é fácil de ser definido. Isso porque cada cultura, região geográfica e época diferente possui valores e percepções igualmente diferentes para definir o conceito de homem e quais direitos são essenciais e inerentes a ele (BARROSO, 2010, p. 21). Como exemplo, temos o costume da excisão feminina, que é visto com normalidade em regiões da África, ao mesmo tempo em que importa em uma grave violação de direitos humanos para outros países. Também a pena de morte, aplicada legalmente em estados estadunidenses, a qual é alvo de grandes críticas em várias nações ocidentais (GRECO, 2009, p. 56).

Apesar do constante choque devido às relativizações e as peculiaridades culturais, a noção de dignidade humana tornou-se um princípio que integra o ordenamento jurídico de vários Estados, a partir do qual se baseiam direitos e garantias fundamentais, os quais devem ser reconhecidos a toda pessoa e perante qualquer forma de Estado (MORAES, 2012, p. 19). Nesse sentido, Sarlet[10] buscou construir um conceito universal e mínimo de dignidade da pessoa humana: “a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que asseguram a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável (sic) nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos” (apud GRECO, 2009, p. 57).

A partir dessa definição, Barroso (2012, p. 23) enumera alguns direitos fundamentais, provenientes da dignidade humana: direito à vida, direito à igualdade, direito à integridade física e direito à integridade moral e psíquica, o qual engloba o direito de ser reconhecido como pessoa e de possuir nome, privacidade, honra e imagem.

2.3. Dignidade como característica intrínseca do ser humano

Como demonstrado, a dignidade da pessoa humana é tido como algo inerente ao homem, como uma característica natural e intrínseca ao ser humano. Conforme ensina Barroso, é uma decorrência natural da natureza humana, a qual é apenas reconhecida pelo Direito, não criada por este, visto ter sua existência baseada no próprio ser humano, anteriormente a qualquer norma. Não é construída pela sociedade, nem é condicionada às características do indivíduo, antes é um elemento objetivo aos seres humanos e indisponível. Assim, “é por ter o valor intrínseco da pessoa humana como conteúdo essencial que a dignidade não depende de concessão, não pode ser retirada e não é perdida mesmo diante da conduta individual indigna do seu titular. Ela independe até mesmo da própria razão, estando presente em bebês recém-nascidos e em pessoas senis ou com qualquer grau de incapacidade mental” (BARROSO, 2010, p. 22).

No mesmo sentido, Reale, ao discorrer sobre a cultura e o valor da pessoa humana, afirma que “o homem é o valor fundamental, algo que vale por si mesmo, identificando-se seu ser com a sua valia.” (1999, p. 210). Todos os valores da cultura e do Direito existem relacionados ao homem como sujeito universal, pois ele é quem tem a capacidade de valorar a realidade, de compreendê-la e de tomar posições perante os fatos.

Ademais, Reale defende que a pessoa humana é o valor-fonte de todos os valores e contesta a ideia de que essa dignidade seja uma construção histórica da sociedade, como defendido por alguns. A ideia de tratar o homem como pessoa fundamenta-se na sua natureza humana, que já o torna valioso, digno, mesmo que não se tenha uma civilização organizada ou que o próprio sujeito não tenha consciência de sua dignidade. “O fato de o homem só vir a adquirir consciência de sua personalidade em dado momento da vida social não elide a verdade de que o “social” já estava originariamente no ser mesmo do homem, no caráter bilateral de toda atividade espiritual: a tomada de consciência do valor da personalidade é uma expressão histórica de atualização do ser do homem como ser social, uma projeção temporal, em suma, de algo que não teria se convertido em experiência social se não fosse intrínseco ao homem a “’condição transcendental de ser pessoa”. Entre pessoa e sociedade há, pois, uma correlação primordial, um vínculo de implicação e polaridade, de tal sorte que o homem vale como homem na sociedade, ainda que só milênios após tenha podido atingir a consciência de sua individualidade ética e de sua coparticipação a uma ‘comunidade de pessoas’ ” (REALE, 1999, p. 214).

Por fim, Kant[11] (apud BARROSO, 2010, p. 15-16) discorre que a pessoa humana, por ser dotada de racionalidade, possui dignidade como característica natural. De todos os seres, o homem é o único com capacidade de agir com a razão e o dever, de dominar seus instintos e de discernir qual a conduta correta para si. Devido a esse poder de autodeterminação, exercido por meio de leis construídas e aceitas pela razão, o homem possui autonomia, o que fundamenta a sua dignidade perante outros.

Nesse diapasão, cada homem é um ser livre e singular, não podendo ser tratado como as coisas, que podem ser substituídas por outras equivalentes ou semelhantes em valor. Assim, Kant[12] (apud BARROSO, 2010, p. 17-18) defende que toda pessoa, todo ser racional existe como fim em si mesmo, e não como meio para o uso arbitrário pela vontade alheia. “Este princípio do indivíduo como fim em si mesmo “é a condição suprema que limita a liberdade das ações de cada homem”. Na formulação mais analítica do autor: “Os seres cuja existência depende, não em verdade da nossa vontade, mas da natureza, têm contudo, se são seres irracionais, apenas um valor relativo como meios e por isso se chamam coisas, ao passo que os seres racionais se chamam pessoas, porque a sua natureza os distingue já como fins em si mesmos, quer dizer como algo que não pode ser empregado como simples meio e que, por conseguinte, limita nessa medida todo o arbítrio” (KANT[13] apud BARROSO, 2010, p. 18).

Consequentemente, a ideia do homem como um fim em si mesmo invalida concepções utilitaristas que possam reduzir a dignidade do indivíduo com fundamento em um interesse público genérico, a exemplo da ideia de suprimir garantias penais e processuais do acusado para dar maior resposta aos anseios sociais por punição e redução da criminalidade. Quanto a isso, Sarlet (2008, p. 12) resume: “enfatiza-se que a formulação central do pensamento kantiano […] coloca a ideia (sic) de que o ser humano não pode ser empregado como simples meio (ou seja, objeto) para a satisfação de qualquer vontade alheia, mas sempre deve ser tomado como fim em si mesmo (ou seja, sujeito) em qualquer relação, seja em face do Estado seja em face de outros indivíduos. Com tal entendimento, está-se a atribuir um valor intrínseco a cada existência humana, demarcando o respeito à sua condição de sujeito nas relações sociais e intersubjetivas”.

2.4. Previsões normativas do princípio

Um documento histórico que reconheceu a dignidade a todo homem foi a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, o qual resultou da Revolução Francesa. Ele dizia, em seu preâmbulo, que os homens possuem direitos naturais, inalienáveis e sagrados[14]. Também merece destaque, como um marco do século XX, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, promulgada pelas Nações Unidas, a qual trouxe explicitamente as expressões dignidade da pessoa humana e direitos humanos[15].

No Brasil, a noção de dignidade humana ganhou posição normativa constitucional ao ser prevista como fundamento da República Federativa do Brasil no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal de 1988[16]. Por tal motivo, Greco (2009, p. 59) defende que essa dignidade possui hierarquia superior para dirigir obrigatoriamente o legislador na criação de normas e princípios, devendo sempre prevalecer no conflito normativo, a fim de invalidar leis que sejam incompatíveis consigo, como tipos penais e espécies de penas que vão de encontro ao princípio da dignidade humana.

Ademais, Barroso (2014, p. 273) acrescenta que a dignidade humana é concebida como um valor fundamental, independentemente de positivação pelo Estado. Por possuir natureza jurídica de princípio constitucional, deve ser fonte direta de direitos e deveres na aplicação ao caso concreto e ser norteador interpretativo do ordenamento jurídico[17].

3. Uma crítica ao direito penal do inimigo EM face Do princípio da dignidade humana

Após este trabalho abordar resumidamente o Direito Penal do Inimigo e o Princípio da Dignidade Humana, resta agora, realizando-se um confronto entre eles, apontar possíveis pontos conflitantes.

3.1. Relativização da dignidade humana?

Para a doutrina majoritária, o princípio da dignidade humana não é absoluto, pois, a depender do caso concreto, deverá ser ponderado com outros princípios também importantes (GRECO, 2009, p. 61). No Direito Penal, por exemplo, ao punir-se um agente criminoso com pena privativa de liberdade, afasta-se, no momento, o seu direito à liberdade para a consagração do direito de proteção dos bens jurídicos de outrem, no caso concreto, e da sociedade, de forma geral.

Entretanto, diante de uma relativização da dignidade humana, deve-se respeitar um núcleo essencial de direitos, os quais compõem uma parcela de direitos invioláveis do indivíduo. Sendo a dignidade um valor espiritual e moral inerente à pessoa, qualquer limitação aos direitos fundamentais deve ser excepcional e “sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos” (MORAES, 2012, p. 19). Por isso que, mesmo sendo necessária a persecução penal e a punição do infrator, o Estado deverá obedecer aos limites investigatórios e processuais que garantem o mínimo de dignidade à pessoa, sem degradar ou retirar a sua humanidade (GRECO, 2009, p. 61).

Ademais, parte da doutrina defende que esse mínimo de dignidade deverá prevalecer até mesmo contra a própria vontade do indivíduo, justamente porque é indisponível. Tem-se, por exemplo, o famoso costume de arremesso remunerado de anões na França, o qual foi proibido pelo Estado francês por violar a dignidade humana, independentemente da vontade e do ganho financeiro dos indivíduos (GRECO, 2009, p. 61).

3.2. Não apenas relativização: a desconsideração da dignidade da pessoa humana

A proposta do Direito Penal do Inimigo, como visto em tópico próprio, inicia-se retirando a condição de pessoa do indivíduo considerado como inimigo pelo ordenamento jurídico. Essa desconsideração do ser enquanto pessoa é justificada pelo perigo que a forma de condução de vida e o estilo de comportamento adotado por tal indivíduo representaria para o Estado vigente. Por consequência, a norma não se preocuparia em prever um fato criminoso a ser cometido, mas em descrever e em delimitar quem seria o agente perigoso que deve ser neutralizado o mais breve possível (MELIÁ, 2008, p. 81). Todavia, o problema reside, principalmente, em quem poderá ser considerado como inimigo, isto é, quais serão os critérios utilizados para se definir o inimigo e quem os determinará. Além, claro, da problemática anterior quanto à legitimidade de se suprimir a condição de pessoa de um indivíduo qualquer.

Greco (2009, p. 20) inicia sua crítica a esse ponto do Direito Penal do Inimigo afirmando que se está diante de um verdadeiro direito penal do autor, em lugar de um direito penal do fato. O jurista alerta que tal orientação foi adotada pelo partido nacional-socialista de Hitler ao assumir o poder na Alemanha, a partir de 1933. Dentre as promessas de reformas no Estado Alemão, incluía-se um novo procedimento para os chamados estranhos à comunidade.

“Tal projeto, considerado como um dos mais terríveis da história do Direito Penal, propunha, dentre outras coisas: a) a castração dos homossexuais; b) a prisão por tempo indeterminado dos considerados associais, ou seja, pessoas que tivessem um comportamento antissocial, a exemplo dos vadios, prostitutas, alcoólatras, praticantes de pequenas infrações penais, etc., sem que houvesse necessidade, inclusive, de que tivessem praticado qualquer delito; c) a esterilização, a fim de evitar a propagação daqueles considerados associais e inúteis para a sociedade. Na verdade, apontava determinadas pessoas como perigosas, a exemplo do que ocorria com os delinquentes habituais, e sobre elas fazia recair uma espécie de “tratamento”, que podia, segundo a sua estúpida visão, curá-los, aplicando-lhes medidas de internação por tempo indeterminado, inclusive nos conhecidos campos de concentração, ou, quando fossem reconhecidamente entendidos como incuráveis, condenados à morte, ou ainda, em algumas situações, utilizados como carne de canhão, ou seja, aquelas pessoas que durante a Segunda Guerra Mundial eram colocadas no front de batalha” (GRECO, 2009, p. 21).

No regime nazista, já havia um Direito Penal dualista: de um lado, um Direito Penal de garantias para os amigos da comunidade, fundamentado no juízo de culpabilidade. De outro, um Direito Penal para os inimigos da comunidade, fundamentado no juízo de periculosidade – como hoje defende Jakobs (GRECO, 2009, p. 22). Tal juízo de periculosidade, como quer o Direito Penal do Inimigo, atropela o princípio da dignidade da pessoa humana, pois além de deixar nas mãos do detentor do poder estatal as definições de amigo e inimigo, as quais podem variar conforme os interesses políticos e sociais, instrumentaliza o indivíduo para os interesses de um Direito Penal simbólico e punitivista.

Mesmo que haja uma regulação legal, em stricto sensu, da aplicação do Direito Penal do Inimigo, o perigo de arbitrariedade permaneceria pelo fato de que também os órgãos legislativos dos ditos Estados Democráticos de Direito são formados, mesmo que em uma escala menor, por posições políticas e filosóficas dominantes que direcionam a criação normativa para interesses determinados. Nesse ponto, Meliá (2008, p. 74) evidencia que a norma não é juridicamente pura no sentido absoluto do dever ser, pois sempre recebe uma carga de valoração política que reside em uma zona cinzenta, isto é, abrange um certo recorte da realidade que sempre agradará a uns e desagradará a outros. Assim também esclarece Carvalho: “Nas situações jurídicas concretas, não temos questões “puramente jurídicas”, mas questões humanas. É esse contexto que fornece “conteúdo” para a norma jurídica “formal” […] Diferentes cosmovisões nos conduzirão a diferentes conceitos positivos de Justiça, afetando o julgamento jurídico até mesmo em pequenos detalhes” (p. 39-40).

Além disso, Meliá (2008, p. 75) afirma que não existe concepção teórica – como o Direito Penal do Inimigo – que não possa ser corrompida ou distorcida para finalidades ilegítimas. Da mesma forma, não existe um sistema jurídico-penal invulnerável a proposições injustas do governante ou do partido que ocupa o poder estatal, como ocorreu na Alemanha nazista e como ocorreu na Colômbia[18]. Nesse sentido, seria um grande risco para A inviolabilidade da dignidade do ser humano autorizar que o Estado nomeie quem pode ou não ser considerado como pessoa para fins jurídicos (MELIÁ, 2008, p. 79). Assim, é válido o alerta de Greco: “Isso, para a nossa própria segurança. Como já deixamos antever acima, quem são os inimigos? Alguns, com segurança, podem afirmar: os traficantes de drogas, os terroristas, as organizações criminosas especializadas em sequestros para fins de extorsões. E quem mais? Quem mais pode se encaixar no perfil do inimigo? Na verdade, a lista nunca terá fim. Aquele que estiver no poder poderá, amparado pelo raciocínio do Direito Penal do Inimigo, afastar o seu rival político sob o argumento da sua falta de patriotismo por atacar as posições governamentais. Outros poderão concluir que também é inimigo o estuprador de sua filha. Ou seja, dificilmente se poderá encontrar um conceito de inimigo, nos moldes pretendidos por essa corrente, que tenha o condão de afastar completamente a qualidade de cidadão do ser humano, a fim de tratá-lo sem que esteja protegido por quaisquer das garantias conquistadas ao longo dos anos” (GRECO, 2009, p. 23).

Outra relativização da dignidade humana é a redução utilitarista do agente criminoso às finalidades de duas manifestações da chamada expansão do Direito Penal[19]: o Direito Penal simbólico e o punitivismo.

No Direito Penal simbólico, a norma penal é utilizada primordialmente como um instrumento político tranquilizador da população para mostrar que o legislador está atento e atuante. Não se preocupa com as causas da criminalidade na sociedade nem com as consequências da pena para o condenado, mas com a identificação de um determinado tipo de infrator como sendo o outro, que não pertence à identidade social (MELIÁ, 2008, p. 59 e 65). Já o punitivismo é a ideia de endurecimento qualitativo e quantitativo da norma penal como meio mais eficaz de combate à criminalidade, seja multiplicando as novas tipificações penais, seja aumentando acentuadamente as penas dos crimes já existentes (MELIÁ, 2008, p. 60).

Uma vez que o Direito Penal do Inimigo preocupa-se com a identificação de um tipo de infrator para tipifica-lo como inimigo e propõe mecanismos penais mais rígidos como instrumento neutralizador do perigo, conclui-se que ambas as vertentes são abraçadas pela teoria de Jakobs. Porém, Meliá afirma que, mais do que apontar um inimigo a aniquilar, intenta-se, na verdade, satisfazer a necessidade de formação social do inimigo comum, um contraponto na construção identitária social, delimitando os que são excluídos e, por consequente, os que estão incluídos nessa identidade: “é um reconhecimento de função normativa do agente mediante a atribuição de perversidade, mediante sua demonização. […] Neste sentido, a carga genética do punitivismo (a ideia do incremento da pena como único instrumento de controle da criminalidade) se recombina com a do Direito penal simbólico (a tipificação penal como mecanismo de criação de identidade social) dando lugar ao código do Direito penal do inimigo” (MELIÁ, 2008, p. 72).

Ora, pelo princípio da dignidade da pessoa humana, não se poderia admitir a redução da pessoa do indivíduo infrator aos fins simbólicos e punitivistas supracitados. O status de pessoa do indivíduo é próprio de sua condição humana e não pode ser relativizado ou excluído sob a justificativa de manutenção da ordem ou do contrato social (MELIÁ, 2008, p. 79). “Embora um indivíduo cometa um crime e viole a dignidade humana, o Estado, por isso, não está legitimado a atacar a dignidade do criminoso, posto que a superioridade moral do Estado para infligir castigo está justamente na renúncia em adotar as técnicas repugnantes dispensadas pelo delinquente” (CARVALHO; MONTEIRO, 2008, p. 132).

3.3. Para o fim de manutenção da ordem social vigente

O Direito Penal do Inimigo viola a dignidade humana quando utiliza a necessidade de manutenção da ordem jurídica e da integração social como fundamentos para tratar o inimigo como uma não pessoa e, assim, diminuir ou suprimir garantias penais e processuais. Como já visto, Jakobs (2009, p. 8-14) sustenta que o Direito Penal do Cidadão é apenas destinado aos considerados como tais, aqueles que cometem crimes pontuais sem intento de destruir a organização social estabelecida. Já o inimigo, por meio do ato criminoso organizado, desejaria abalar a estrutura social e destruir o Estado e o Direito vigentes, não oferecendo garantias de que se retratará e se submeterá à norma como um cidadão. Dessa forma, para a segurança da comunidade civilizada, o inimigo deve ser combatido e eliminado o mais rápido e da forma mais eficiente possível.

Ora, percebe-se uma grave violação à dignidade humana nessa característica do Direito Penal do Inimigo. Como ensina Barroso (2013, p. 274), o fato de o homem possuir um valor intrínseco impede que ele seja usado como mero objeto para o cumprimento de metas coletivas ou de políticas públicas, inclusive a partir de motivos genéricos. O imperativo categórico kantiano, por exemplo, veda posturas que reduzam o homem ao utilitarismo social ou ao autoritarismo estatal: “Age de tal maneira que uses a humanidade, tanto na tua pessoa como na pessoa de qualquer outro, sempre e simultaneamente como fim e nunca simplesmente como meio.” (KANT[20] apud BARROSO, 2013, p. 274).

Por outro lado, também se pode dizer que o homem em sociedade deve sujeitar-se a determinadas responsabilidades e deveres para a própria existência mínima da comunidade e para a preservação dos direitos dos demais. Nesse ponto, fala-se, na doutrina constitucionalista, sobre o valor comunitário da dignidade, o qual possui como principais objetivos: “a) a proteção do próprio indivíduo contra atos autorreferentes; b) a proteção de direitos de terceiros; e c) a proteção de valores sociais, inclusive a solidariedade” (BARROSO, 2010, p. 28). Além disso, Sarlet faz expõe que “é possível destacar uma dimensão social (ou comunitária) da dignidade da pessoa humana, já que a dignidade, apesar de ser sempre em primeira linha a dignidade da pessoa concreta, individualmente considerada, necessariamente implica um permanente olhar para o outro, visto que o indivíduo e a comunidade são elementos integrantes de uma mesma (e única) realidade político-social-estatal. Em outras palavras, a dignidade do indivíduo nunca é a do indivíduo isolado ou socialmente irresponsável, projetando-se na dignidade de todos os integrantes do grupo social”. Como acentua Cármen Lúcia Antunes Rocha, à luz de uma perspectiva fundada no princípio constitucional da solidariedade, “a dignidade humana – mais que aquela garantida à pessoa – é a que se exerce com o outro”, com o que apenas se enfatiza a perspectiva relacional da pessoa humana em face do corpo social que integra, bem como o compromisso jurídico (e não apenas moral) do Estado e dos particulares na composição de um quadro social de dignidade para (e com) todos” (2008, p. 10).

Entretanto, não se pode utilizar abusivamente dessa dimensão comunitária da dignidade para justificar qualquer tipo de relativização do valor humano do indivíduo. Toda redução dos direitos e garantias fundamentais de alguém deveria passar pelo crivo de justificativas racionais e claras, com ampla participação e concordância do corpo social. Com isso, tolher-se-ia reduções arbitrárias do valor humano do indivíduo, por parte da autoridade estatal, com fundamento em conceito jurídicos indeterminados como interesse público, ordem pública ou segurança nacional[21]. Nesse sentido, Barroso (2010, p. 28-29) alerta que “é preciso ter especial cuidado para alguns graves riscos envolvidos, que incluem: a) o emprego da expressão como um rótulo justificador de políticas paternalistas; b) o enfraquecimento de direitos fundamentais em seu embate com as 1razões de Estado1; e c) problemas práticos e institucionais na definição dos valores compartilhados pela comunidade, com os perigos do moralismo e da tirania da maioria”.

Portanto, pode-se concluir que não é possível haver regulamentação e aplicação de um Direito Penal do Inimigo em um Estado Democrático de Direito que seja fundado na dignidade da pessoa humana, pois nenhuma meta coletiva ou valor social poderá retirar o valor intrínseco de cada indivíduo (BARROSO, 2010, p. 30), o qual é elemento essencial para a própria existência da sociedade e do Estado e, como anterior e razão de existência desses, deve ser a finalidade precípua de toda legislação penal e processual penal.

CONCLUSÃO

Em análise conjunta com o ordenamento jurídico brasileiro, especialmente com a Constituição Federal, percebe-se, pela exposição argumentativa aqui apresentada, que o Direito Penal do Inimigo é largamente incompatível com os direitos e as garantias constitucionais, notadamente com o princípio da dignidade da pessoa humana. Não se pode permitir um sistema jurídico dualista que afirma direitos fundamentais do homem, e, ao mesmo tempo, prevê a eliminação desse reconhecimento para certos indivíduos, identificados à mercê do Estado. A experiência na história da humanidade demonstra o perigo de se permitir ao Soberano, ao grupo político ou a quem quer que seja o poder de eleger quem são os inimigos da sociedade ou do Estado, como ocorreu no Estado de Direito Nazista, que visava a aniquilação dos que supostamente seriam uma ameaça ao povo alemão (judeus, deficientes físicos, homossexuais, cristãos dissidentes etc).

É indubitável que no contexto atual há grandes desafios para o Estado a fim de combater a nova criminalidade organizada, composta de uma rede de relações altamente complexa, com uma organização robusta e até mesmo globalizada. Também se verifica que a sociedade ocidental e os canais de mídia pressionam cada vez mais as instituições de política criminal a legislarem e a agirem com mais rigor e punição. Entretanto, o Direito Penal e o Direito Processual Penal não podem ser internamento contraditórios com os princípios jurídicos elementares nos quais se baseiam para atender a clamores sociais, ainda que os fins sejam legítimos. Isso porque a concepção de Estado Democrático de Direito pressupõe a pessoa humana como centro de valores e de finalidades do Estado e do Ordenamento. Como ensina Reale[22], a dignidade do homem é anterior ao Estado organizado e ao suposto contrato social, não podendo ser reconhecida apenas em circunstâncias favoráveis.

Assim, é preciso ajustar as Ciências Criminais em um ponto de equilíbrio em que a ordem e a paz social sejam alcançadas, os direitos alheios sejam respeitados, as leis sejam cumpridas – como quer Jakobs –, porém sempre dentro de limites fundamentais mínimos inafastáveis, inclusive pelo legislador, como é o caso dos princípios e das vedações penais previstas na Constituição Federal brasileira, notadamente a dignidade do ser humano.

 

Referências
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Notas
[1] No âmbito de criminalidade econômica, por exemplo, incluem-se os crimes de abuso do poder econômico e contra a livre concorrência; os crimes contra a economia popular; os crimes contra as relações de consumo; os crimes falimentares; os crimes contra o sistema financeiro nacional; os crimes fiscais; e os crimes cambiais e aduaneiros.
[2]KANT, Immanuel. Zum ewigen Frieden: ein philosophisher Entwurf. 1907.
[3]Jakobs cita como exemplos de comportamentos graves na atualidade os criminosos econômicos, os terroristas, os integrantes de organizações criminosas e os autores de delitos sexuais (2008, p. 35).
[4]Em síntese, a ideia de expansão do Direito Penal seria um conjunto de medidas penais rígidas e extensas identificadas na política criminal das sociedades pós-industriais, como a rápida produção legislativa para a criação e a reforma de tipo penais, a criminalização no estado prévio à lesão de bens jurídicos e o estabelecimento de sanções desproporcionalmente altas (JAKOBS; MELIÁ, 2008, p. 55-57).
[5]SILVA SÁNCHEZ, Jésus-Maria. La expansión del derecho penal. p. 159.
[6] Exemplo recente de aplicação desse modelo foi o julgamento do Habeas Corpus n. 126292, pelo STF, em que o princípio da presunção de inocência até o trânsito em julgado de decisão condenatória foi relativizado para permitir a execução imediata da pena após o julgamento pela 2ª instância. Conforme o voto do Ministro Relator Teori Zavaski, tal decisão é “mecanismo legítimo de harmonizar o princípio da presunção de inocência com o da efetividade da função jurisdicional do Estado”. O ACÓRDÃO AINDA NÃO FO PUBLICADO. VER COMO É NA ABNT.
[7]ROXIN, Claus. Derecho penal Parte general, t. I, p. 176-177.
[8]Artigo 2º, caput e parágrafos, da Lei n. 8.072/1990.
[9]Artigo 303, parágrafo 2º, da Lei n. 7.565/1986, regulamentado pelo Decreto n. 5.144/2004.
[10]SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais. p. 60.
[11]KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes. Ed. Peter Singer. 2004.
[12]Idem, op. cit., p. 71 e 68.
[13]Idem, op. cit., p. 71 e 68.
[14]Para saber mais, vide preâmbulo no Sítio do Senado Francês, disponível em: <http://www.senat.fr/lng/pt/declaration_droits_homme.html>, acessado em: 26 out. 2014.
[15]Para saber mais, vide preâmbulo no Sítio da Organização das Nações Unidas no Brasil, disponível em: <http://www.onu.org.br/img/2014/09/DUDH.pdf>, acessado em: 26 out. 2014.
[16]Conforme artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal de 1988: “Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: […] III – a dignidade da pessoa humana;”.
[17]Nesse sentido, Barroso (2013, p. 273) exemplifica: “o conteúdo essencial da dignidade humana implica a proibição da tortura, mesmo em um ordenamento jurídico no qual não exista regra expressa impedindo tal conduta. Já no seu papel interpretativo, o princípio da dignidade humana vai informar o sentido e o alcance dos direitos fundamentais.”.
[18] Conforme MELIÁ, 2008, p. 75, na justificativa de combater a guerrilha e o narcotráfico, o governo colombiano promulgou várias normas penais influenciadas pelo Direito Penal do Inimigo.
[19]Vide nota n. 5.
[20]KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes. Ed. Peter Singer. 2004.
[21]Cita-se, como exemplo, o crime de terrorismo previsto de modo vago na Lei de Segurança Nacional – Lei n. 7.170: “Art. 20 – Devastar, saquear, extorquir, roubar, sequestrar, manter em cárcere privado, incendiar, depredar, provocar explosão, praticar atentado pessoal ou atos de terrorismo, por inconformismo político ou para obtenção de fundos destinados à manutenção de organizações políticas clandestinas ou subversivas. Pena: reclusão, de 3 a 10 anos.” (BRASIL, 1983).
[22]Conforme exposto na p. 14.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Falkner de Araújo Botelho Júnior

 

Advogado pós-graduado em Direito Penal e Direito Processual Penal pelo Centro Universitário UNA

 


 

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