Auxílio-reclusão: critérios burocráticos para a obtenção de um benefício social

Resumo: Este artigo tem por objetivo abordar os critérios, muitas vezes extremamente burocráticos, para se alcançar o benefício do auxílio-reclusão (benefício este assegurado pela nossa Carta Magna aos dependentes de segurado de baixa renda). Diante de tal situação, os dependentes, quase sempre, ficam a beira da exclusão social, visto que não conseguem preencher a contento o rol de exigências do Instituto Nacional de Previdência Social. Cheio de peculiaridades, o auxílio-reclusão se trata de um dos mais complexos concedidos pelo nosso Estado, enquanto que deveria ser um dos mais simples, dado a sua natureza. Por ser um benefício previdenciário, de forma concisa, passaremos a explanar a situação histórico-constitucional da Previdência Social, apresentando seus princípios fundamentais e norteadores, conceitos, beneficiários e prestações previdenciárias. Também foi analisado neste estudo a fundamentalidade do direito à seguridade social, demonstrando que o direito à seguridade social é um direito fundamental, visto que encontra-se de forma implícita em cláusula pétrea inserida no texto constitucional.

Palavras-chave: auxílio-reclusão; preso; dependentes; benefício; critérios.

Abstract: This article aims to address the criteria, in order to achieve the benefit of confinement (Benefit ratio guaranteed by our Magna Carta to dependents of low-income insured). Faced with such a situation, the dependents, almost always, are on the verge of social exclusion, since they can not fill to the satisfaction of the list of requirements of the National Institute of Social Security. Full of peculiarities, the reclusion aid is one of the most complex granted by our State, while it should be one of the simplest given its nature. For being a social security benefit, in a concise manner, we will begin to explain the historical-constitutional situation of Social Security, presenting its fundamental principles and guiding principles, concepts, beneficiaries and social security benefits. Also analyzed in this study was the fundamentality of the right to social security, demonstrating that the right to social security is a fundamental right, since it is implicit in a stony clause inserted in the constitutional text.

Key words: Confinement-aid; stuck; dependents; benefit; criteria

Sumário: Introdução. Do auxílio-reclusão. Dos dependentes. Os empecilhos burocráticos para a sua concessão. Da (in)constitucionalidade do limite por baixa renda. Conclusão. Referências.

INTRODUÇÃO

Rapidamente, passaremos a explanar sobre a previdência social no Brasil, a modo de chegarmos no benefício ora explanado, o auxílio-reclusão.

A previdência social é o instituto da seguridade social que tem caráter contributivo compulsório, vez que a cobertura previdenciária é devida somente aos indivíduos que contribuem para o regime. Esta condição é primordial para a concessão de benefícios e serviços aos seus segurados e dependentes.

De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o direito à seguridade social é um direito inerente ao ser humano, visto que é uma necessidade social e econômica. Em tempo, nos traz:

“Neste sentido recomenda ainda que os paises deveriam “estabelecer progressivamente e manter sistemas de segurança social completos e adequados, coerentes com os objetivos políticos nacionais, e procurar coordenar as políticas de segurança social com outras políticas públicas.” (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, 2017)

Pois bem! Em nosso país, com a lei 3807/60, ocorreu a uniformização da legislação previdenciária, assegurando aos trabalhadores benefícios tais como: auxílio-funerário, auxílio- maternidade e o auxílio-reclusão.

Anos depois, veio nossa Carta Magna, em seu artigo 194 e definiu as nuances da seguridade social, senão vejamos:

“Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.

Parágrafo único. Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com base nos seguintes objetivos:

I – universalidade da cobertura e do atendimento;

II – uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais;

III – seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços;

IV – irredutibilidade do valor dos benefícios;

V – eqüidade na forma de participação no custeio;

VI – diversidade da base de financiamento;

VII – caráter democrático e descentralizado da administração, mediante gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgãos colegiados.” (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 2017)

Mais precisamente, em seu artigo 201, a Constituição também nos trouxe:

“Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: 

I – cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada;  II – proteção à maternidade, especialmente à gestante;

III – proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário;

IV – salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda; 

V – pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, observado o disposto no § 2º.” (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 2017)

Ítalo Romano trata o assunto em seu Curso de Direito Previdenciário, como podemos ver:

“A Previdência Social tem caráter social e o objetivo de distribuir renda, principalmente para as pessoas de baixa renda. Como os recursos são finitos e as necessidades da população são “infinitas”, o sistema tem de estabelecer preferência, de acordo com as possibilidades econômico-financeiras, ou, melhor dizendo, tratar desigualmente os desiguais, favorecendo, portanto, os indivíduos que se encontrarem em situação inferior. Exemplos disso são os benefícios salário-família e auxílio reclusão, que são devidos somente aos segurados e dependentes dos segurados, respectivamente, de baixa renda.” (EDUARDO, 2013, p. 45)

DO AUXÍLIO-RECLUSÃO

O auxílio-reclusão, conforme art. 80 da Lei de Benefícios (Lei 8.213/91), assim como a pensão por morte, é destinado exclusivamente aos dependentes do segurado e independe de carência. Neste caso, o benefício será pago aos dependentes, enquanto o segurado preso estiver recolhido ou detido à prisão, ou seja, durante o período em que estiver sob o regime fechado ou semi-aberto.

Ainda, o segurado não poderá receber salário de empresa e nem outro tipo de benefício, tais como: auxílio-doença, aposentadoria ou abono de permanência ao serviço. Deverá também, de três em três meses, comprovar a condição de presidiário mediante atestado fornecido pela penitenciária. Entretanto, o benefício é único e independe da quantidade de filhos que o preso possui.

Destarte, o último salário-de-contribuição do segurado deverá estar abaixo do valor previsto na legislação, conforme a época de sua prisão, e aí aparece, com freqüência, o início da complexidade em receber o referido benefício. No ano de 2017, por exemplo, o valor total do benefício não pode ultrapassar o teto pré-estabelecido pela previdência (R$ 1.292,43 a partir de 01/01/17, conforme Portaria N°8, de 13/01/2017). Caso o segurado receba qualquer valor a mais, seu benefício será negado.

A renda mensal será de 100% da renda da aposentadoria por invalidez a que o segurado teria direito, rateada em partes iguais entre os dependentes.

Segundo IBRAHIM (2012, p. 674-675), o pedido de auxílio-reclusão deverá ser concedido mesmo que ainda não tenha ocorrido o trânsito em julgado da sentença. Basta que, qualquer decisão judicial determine a prisão do segurado, ainda que seja temporária. O autor nos traz ainda que, em caso de fuga, o benefício será suspenso e apenas voltará a ser pago quando o segurado for recapturado; caso tenha decorrido o período da graça, tal benefício não voltará ser pago.

DOS DEPENDENTES

Serão aqueles que dependem economicamente do segurado e para o INSS são separados por classe, como podemos ver:

“Os segurados filiados ao RGPS podem ter como dependentes:

CLASSE DEPENDENTES

1a classe: O cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado de qualquer condição, menor de 21 anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente.

2a classe: Os pais.                                        

3a classe: O irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 anos ou inválido ou que tenha defiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativa.” (GOUVEIA, 2017)

A dependência econômica com os dependentes da 1ª classe por si só é presumida, enquanto que, às demais classes, terá de ser comprovada.

OS EMPECILHOS BUROCRÁTICOS PARA A SUA CONCESSÃO

A menção genérica contida anteriormente no art.201, II, da Constituição Federal, em relação a fixação da baixa renda, passou a ser expressamente aplicada ao auxílio-reclusão com a leitura do artigo 13 da Emenda Constitucional nº 20.

Art. 13 – Até que a lei discipline o acesso ao salário-família e auxílio-reclusão para os servidores, segurados e seus dependentes, esses benefícios serão concedidos apenas àqueles que tenham renda bruta mensal igual ou inferior a R$ 360,00 (trezentos e sessenta reais), que, até a publicação da lei, serão corrigidos pelos mesmos índices aplicados aos benefícios do regime geral de previdência social.” (BRASIL, 2017)

Porém, a Lei de Benefícios não nos traz nenhuma menção em relação à baixa renda, a qual é citada somente no artigo 116 do Regulamento da Previdência Social:

Art. 116. O auxílio-reclusão será devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado recolhido à prisão que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, aposentadoria ou abono de permanência em serviço, desde que o seu último salário-de-contribuição seja inferior ou igual a R$ 360,00 (trezentos e sessenta reais).

(…)”  (BRASIL, 2016)

Infelizmente, ainda não foi publicada a lei mencionada no artigo 13 da EC nº 20/98 que regularia o acesso ao auxílio-reclusão. Portanto, os valores apontados no dispositivo citado (e também no artigo 116 do Decreto 3.048) vem sendo atualizados através de Portarias Ministeriais / Interministeriais, anualmente, regulando o valor que será analisado junto a Autarquia.

O STF concluiu, há alguns anos, que é a renda do preso que deve ser considerada para a concessão de auxílio-reclusão. Essa decisão teve repercussão geral.

DA (IN)CONSTITUCIONALIDADE DO LIMITE POR BAIXA RENDA

A Seguridade Social, por si só, já visa alguns princípios norteadores para que seja regida, tais como a universalidade da cobertura e do atendimento, uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais, irredutibilidade do valor os benefícios e o mais importante: o princípio da dignidade da pessoa humana. Logo, estando esses princípios previstos na Constituição Federal, dever-se-ão serem cumpridos a fim de que não se fira tal direito.

Porém, o que vemos é que há uma problemática em questão que está ligada ao requisito baixa renda, tornando-se este um limitador do benefício, ou seja, somente o receberá aquele que possuir baixa renda.

Ora, se todos são iguais perante a lei, por que somente aquele que possui “baixa renda” deverá receber o benefício? Ademais, a Constituição Federal não definiu, exatamente, qual é a definição de baixa renda.

Para QUINTO (2017):

(…) o critério da baixa renda não pode ser encarado de uma perspectiva meramente matemática. Os problemas que se apresentam devem ser solucionados por equidade quando o caso concreto revela a necessidade de proteção social, bem como de reafirmação dos princípios constitucionais, sobretudo da proteção à família, da solidariedade social, da dignidade humana, da erradicação da pobreza e seletividade.

CONCLUSÃO

O objetivo desse trabalho foi o de compreender que a intenção do auxílio-reclusão não é a de “presentear” o apenado com um beneficio social, isentando-o da obrigação de amparar a sua família, e sim o amparo assistencial do estado junto a família do preso que muitas vezes é surpreendida com a detenção ou reclusão do responsável pelo sustento familiar.

A questão da baixa renda por muitas vezes prejudica esses familiares, que dependem desta questão para que recebam ou não tal benefício. Ademais, ainda restam os impecilhos para que tal benefício seja implantado junto a família do apenado, se não pelo seu processo burocrático, será por infringir um direito garantido por lei, tal como uma rotulação do que é “baixa renda”, atrapalhando assim o processo de dignificar a pessoa humana, para que esta seja “beneficiada” pelo Estado Democrático de Direito ao qual vivemos.

 

Referências
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em 16 abril 2017
BRASIL. Emenda Constitucional nº 20. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc20.htm. Acesso em: 25 abr 2017
BRASIL. Previdência Social. 2016. Disponível em: http://www.previdencia.gov.br/servicos-ao-cidadao/todos-osservicos/auxilio-reclusao/valor-limite-para-direito-ao-auxilio-reclusao. Acesso em: 15 abril 2017
EDUARDO, Ítalo Romano e EDUARDO, Jeane Tavares Aragão. Curso de Direito Previdenciário. 10ª edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013. p. 45
FEDERAL. Supremo Tribunal. Supremo estabelece que renda de segurado é parâmetro para concessão de auxílio-reclusão. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=105293. Acesso em 01 mai 2017
GOUVEIA, Carlos Alberto Vieira de. Os dependentes e os principais aspectos na concessão dos benefícios previdenciários. Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=6196. Acesso em: 23 abril 2017
IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 17ª Ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2012, p. 674-675
LIMA, Michele de Andrade. Auxílio Reclusão. Disponível em: http://www.oabsp.org.br/subs/santoanastacio/institucional/artigos-publicados-no-jornal-noticias-aulistas/auxilioreclusao. Acesso em: 20 abril 2017
ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Recomendação nº 202. Genebra: OIT, 2012. Disponível em: http://www.ilo.org/public/portugue/region/eurpro/lisbon/html/portugal_recomendacao_202_pt.htm. Acesso em 20 abril 2017
QUINTO, Eliana Monteiro Staub. Auxílio-reclusão: a inconstitucionalidade do critério de baixa renda. Disponível em: http://www.dpu.def.br/images/esdpu/jornaldpu/edicao_4/Artigo_3_-_Aux%C3%ADlio-reclus%C3%A3o_a_inconstitucionalidade_do_crit%C3%A9rio_de_baixa_renda.pdf. Acesso em 25 abril 2017

Informações Sobre os Autores

Edjane Maria Barbosa Aquino

Bacharela em Direito pela Universidade Nove de Julho e pós-graduanda em Direito da Seguridade Social pela Faculdade Legale

Carlos Alberto Vieira de Gouveia

Carlos Alberto Vieira de Gouveia é Mestre em Ciências Ambientais e Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais; Vice-Presidente para a área Previdenciária da Comissão Direitos e Prerrogativas e Presidente da Comissão de Direito Previdenciário ambas da OAB-SP Coordenador do curso de pós-graduação em Direito Previdenciário da Faculdade Legale


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