Meio ambiente em perspectiva: do reconhecimento das múltiplas dimensões interdependentes do meio ambiente

Resumo: O presente artigo tem como finalidade trazer à baila as facetas do meio ambiente, superando-se a visão de que o meio ambiente está ligado apenas a natureza. Ocorre que, na verdade, o meio ambiente se faz presente em todo momento, desde o lazer às atividades laborais exercidas diariamente. Isso acontece, pois o meio ambiente se subdivide em múltiplas dimensões que são dotadas de caráter interdependente. Todavia, não se confundem essas faces do meio ambiente, quais sejam, o meio ambiente natural, cultural, artificial ou edificado, meio ambiente laboral. O meio ambiente cultural se divide, ainda, nas modalidades material e imaterial. Para que esses conceitos alcancem a sua devida compreensão, necessário se faz a delimitação conceitual de meio ambiente, tendo em vista que o inciso I do art. 3º da lei nº 6.938/81 conceitua o meio ambiente de forma ampla. O artigo supracitado considera o meio ambiente uma gama de condições, leis, influências e interações nas formas biológicas, físicas e, até mesmo, químicas que abrigam, regem e permitem a vida em todas as suas formas. Nesse talvegue, a Constituição Federal tem um capítulo, composto pelo artigo 225, que dispõe sobre o meio ambiente de forma a garantir a todos um meio ambiente ecologicamente equilibrado, sendo um bem de uso comum do povo. Bem como, delegando ao Poder Público a tarefa de defendê-lo e preservá-lo conjuntamente com a sociedade, para que as presentes e as futuras gerações possam usufruir do meio ambiente e suas dimensões de forma digna, essencial a qualidade de vida, consoante expresso no dispositivo supracitado da Lei Maior. [1]

Palavras-chave: Dimensões do meio ambiente; Direito fundamental; Meio ambiente natural; Meio ambiente cultural; Meio ambiente artificial; Meio ambiente laboral.

Sumário: Considerações iniciais; 1. Meio ambiente: delimitação da locução; 2. Meio ambiente natural; 3. Meio ambiente construído ou artificial; 4. Meio ambiente laboral; 5. Meio ambiente cultural. Considerações finais.

CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Os problemas ambientais estão cada vez mais explícitos e estão aumentando, tanto em quantidade, quanto em potencialidade, de forma que as preocupações ocupam a mídia e os debates políticos, por exemplo. Pois a vida humana está em risco diante do aquecimento global, escassez de água potável, o desmatamento e outros inúmeros problemas de aspecto ambiental. Com isso, a expressão “meio ambiente” vem sendo empregada, muitas vezes, de maneira equivocada, pois é remetida a ideia de recursos naturais, sendo que a expressão supracitada significa muito mais que isso. A Constituição Federal a recepcionou e a consagrou definitivamente da forma mais ampla possível, o que viabilizou os doutrinadores ambientais concedessem o maior número e quantidade de aspectos envolvidos (FARIAS, 2006, s.p.).

Nesse talvegue, insta salientar que a Lei Maior protege o meio ambiente como bem de uso comum do povo, imprescindível à qualidade de vida salutar, consoante expõe em seu art. 225, caput, o que configura um direito difuso, ou seja, não é possível a determinação de seus destinatários por serem todos titulares desse direito (SIRVINSKAS, 2015, p. 127). Diante do abrangente conceito constitucional de meio ambiente, com o intuito de viabilizar a identificação mais rápida do agente degradante e do bem jurídico degradado, a doutrina teve o cuidado de dividir o meio ambiente em múltiplas dimensões. Porém, não se afastando o principal objetivo que é tutelar a vida saudável, mas sim para propiciar o reconhecimento do aspecto em que os valores ambientais foram violados, consoante explica Fiorillo (2011, p. 73). Diante disso, vislumbra-se ao menos quatro das facetas ambientais, quais seja, meio ambiente natural, artificial, cultural e do trabalho.

O meio ambiente natural, engloba a fauna, a flora, a atmosfera, o solo, por exemplo, sendo essa dimensão diretamente ligada aos recursos naturais. Já o meio ambiente artificial está relacionado a todo espaço construído, como equipamentos urbanos e edifícios comunitários, como museus e bibliotecas. Noutro giro, tem-se a face cultural do meio ambiente em que o bem protegido se refere a bens, seja materiais ou imateriais, com valores paisagísticos, históricos, artísticos, arqueológicos, ecológicos e científicos. Por fim, o meio ambiente do trabalho que se relaciona diretamente a proteção do trabalhador no local em que o mesmo desenvolva sua atividade laboral, seja essa remunerada ou não, levando sempre em consideração as normas de segurança (SIRVINSKAS, 2015, p. 127-128). Assim, compreendida essas considerações iniciais sobre as dimensões do meio ambiente, passa-se a análise de cada face separadamente, iniciando pela conceituação de meio ambiente, para que assim, se compreenda as aludidas facetas da melhor forma possível.

1 MEIO AMBIENTE: DELIMITAÇÃO DA LOCUÇÃO

Antes mesmo de adentrar ao conceito de “meio ambiente’, deve-se tecer um breve comentário do homem em relação a natureza, tendo em vista que a visão antropocentrista clássica não mais vigora, pois sob essa ótica o meio ambiente era objeto de satisfação pessoal do homem. Atualmente, o meio ambiente deve ser pensado como valor autônomo inserido em um dos polos da relação homem-natureza, onde há uma interdependência entre os mesmos, vez que o ser humano é integrante da natureza, não sendo possível a sua sobrevivência ante a inexistência desse meio (LEITE; PILATI, 2011, p. 31).

Sendo assim, o termo “meio ambiente” é alvo de críticas, considerando que meio é aquilo que está ao centro de algo e ambiente se refere ao lugar em que os seres vivos habitam. Logo, Sirvinskas (2015, p. 126) aduz que ambiente está inserto no conceito de meio, configurando-se um vício de linguagem chamado pleonasmo que se concreta quando há repetição de duas palavras com a mesma ideia ou significado com a finalidade de enfatizar. Feitas tais considerações, pode-se afirmar que o meio ambiente é o local onde vivem os seres vivos, seu hábitat que, por sua vez, está em constante interação com os seres vivos componentes do meio biótico, resultando em um conjunto harmonioso e imprescindível à sobrevivência dos seres vivos, de modo geral (SIRVINSKAS, 2015, p. 126).

Nesse sentido, Milaré (2011, p. 62) salienta que em 1835 a expressão em voga foi utulizada pela primeira vez pelo francês Geoffroy de Saint-Hilare em seu livro Études progressives d’um naturaliste e se difundiu por meio de doutrinas, jurisprudências, até mesmo consagrada pela legislação ambiental, além de estar também inserida na consciência da população (SIRVINSKAS, 0215, p. 126). Assim, o conceito jurídico de meio ambiente está expresso no inciso I do art. 3º da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências, in verbis

“Art 3º – Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:

I – meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas; […] (BRASIL, 1981)”.

Esse conceito normativo, segundo Sirvinskas (2015, p. 127) se refere as circunvizinhanças de um organismo, sendo as plantas, os animais e os microrganismos em interação, bem como os seres bióticos (com vida) e abióticos (sem vida) e, ainda, os meios físicos, químicos e biológicos de qualquer organismo vivo, além de todas as influências externas que interferem na vida e no desenvolvimento de organismos (SILVA, 2005, p. 52/53). Nesse passo, em consonância com a sistematização de meio ambiente exposta pela Constituição Federal de 1988, verifica-se que houve a recepção do conceito transcrito alhures, pois a Carta Magna tutela o meio ambiente em diversas dimensões, quais sejam, natural, artificial, cultural ou do trabalho (FIORILLO, 2011, p. 72/73). Ou seja, a definição legal é ampla e sua proteção abarca a todas as formas de vida, inclusive a vida humana, por estar inserida como elemento da natureza (LEITE; PILATI, 2011, p. 31). Contudo, Celso Fiorillo (2011, p. 73), em seu escólio, afirma que “o termo meio ambiente é um conceito jurídico indeterminado, cabendo, dessa forma, ao intérprete o preenchimento do seu conteúdo”.

Nessa linha de raciocínio, Talden Queiroz Farias (2006, s.p.) afirma que o meio ambiente é algo que compõe a vida de cada ser humano que, por sua vez, também está inserido nesse meio. Outrossim, Milaré (2011, p. 64) conceitua o meio ambiente como um agrupamento de elementos bióticos (fauna e flora) e abióticos (físicos e químicos), estruturados em ecossistemas distintos, seja naturais ou sociais que o ser humano encontra-se em processo de interação, individual ou social, que propicie o desenvolvimento das atividades humanas, à preservação de recursos naturais e das características substanciais do entorno, dentro dos parâmetros legais e qualitativos definidos. Sob a ótica técnica de meio ambiente, Araújo elucida que

“Na linguagem técnica, Meio Ambiente é a combinação de todas as coisas e fatores externos ao indivíduo ou população de indivíduos em questão, suas relações e interações. No conceito jurídico, o meio ambiente é a expressão do patrimônio natural e as relações com e entre os seres vivos, em visão estrita (ARAUJO, 2012, p. 41)”. (grifo do autor)

Portanto, o conceito de meio ambiente apresenta diversas faces ou dimensões quais seja, natural, artificial, cultural e do trabalho. Assim, viabiliza o estudo de cada uma desses enfoques de forma separada para que assim se compreenda de fato o meio ambiente. Entretanto, não se pode desconsiderar a interdependência entre todas as perspectivas que serão analisadas nos próximos tópicos (SIRVINSKAS, 2015, p. 128).

2 MEIO AMBIENTE NATURAL

Inicialmente, cumpre salientar que o meio ambiente natural configura uma das espécies de meio ambiente ecologicamente equilibrado, tutelado pelo art. 225 da Constituição Federal (SIRVINSKAS, 2015, p. 285). Nesse sentido, o inciso V do art. 3º da Lei nº 6.938/81, prevê expressamente os componentes do meio ambiente em estudo, quais sejam, a atmosfera, as águas interiores, bem como as subterrâneas e as superficiais, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a fauna e a flora (BRASIL, 1981). Segundo Fiorillo (2012, p. 74), no meio ambiente natural ocorre o fenômeno denominado homeostase, ou seja, onde ocorre o equilíbrio de forma dinâmica entre os seres vivos e o meio em que esses vivem.

Nesse seguimento, pode-se considerar o meio ambiente natural aquele precedente à existência da humanidade. Uma vez que os recursos naturais são elementos viscerais do meio ambiente em voga, tanto os componentes bióticos, quanto os abióticos. Assim, com o surgimento da humanidade, o homem fora inserido no contexto como animal, o que o fez mais um componente dessa espécie de meio ambiente (ARAUJO, 2012, p. 43). Desse modo, Fiorillo (2012, p. 74) aduz que o meio ambiente natural encontra-se tutelado de forma mediata pelo art. 225 do diploma constitucional, bem como de imediato pelos incisos I, III e VII desse mesmo artigo, in verbis

“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:

I – preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; [omissis]

III – definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; [omissis]

VII – proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade” (BRASIL, 1988).

Verifica-se então, a facilidade de identificação do meio ambiente natural, vez que é a razão de existir do planeta Terra e abrange toda a natureza. Ademais, os elementos que o compõem são aqueles formados pelos recursos naturais, fisicamente dizendo, como já salientado alhures (SODRÉ, 2012, s.p.). Sendo assim, Araujo (2012, p. 44) defende que o meio ambiente natural é aquele criado de forma original pela natureza, não sofrendo interferência pelo ser humano que venha acarretar alteração substancial desse meio.

Por outro lado, existe uma corrente minoritária que versa sobre a interferência humana, seja ela qual for, se não refletir significativamente ou alterar aspectos do meio ambiente natural, esse meio continuará sendo considerado da espécie natural (ARAUJO, 2012, p. 44). De uma maneira exemplificativa, Brito (2007, s.p.) busca esclarecer o teor do posicionamento em tela, o relacionando ao cultivo da soja. Ora, no caso em que um agricultor aplicou suas técnicas e tecnologias para a obtenção de uma boa colheita de soja, embora constatada a interferência humana, esta não desclassifica o meio ambiente natural, considerando a ausência de alteração substancial dos aspectos desse meio. Entrementes, se nesse mesmo cultivo de soja, a plantação se efetivar por meio de sementes transgênicas, ou seja, alterando a substância da soja para que a mesma produza efeitos diversos aos que seriam alcançados de maneira natural, a figura do meio ambiente natural é afastada, pois no caso em tela, vislumbra-se a configuração de um meio ambiente artificial. Nessa esteira, Brito continua

“Deve-se lembrar, o meio ambiente natural é aquela classe que envolve a natureza em sua forma primitiva e original, sem a intervenção substancial do homem, embora o homem (enquanto animal; ser vivo) faça parte desse meio natural. Se a alteração genética propiciada pelo homem, faz com que a soja ou o trigo produza mais do que deveria produzir e tenha mais resistência a pragas do que naturalmente teria, diz-se que a naturalidade do vegetal, contida em sua genética, foi sufocada, ao menos onde interessava, pela artificialidade da ação humana, só restando classificá-la como meio ambiente artificial” (BRITO, 2007, s.p.).

Verifica-se, em suma, que a interferência humana que desclassifica o meio ambiente natural, altera substancialmente a característica desse. Não sendo passível de artificialização, toda e qualquer ação por parte do homem em relação ao meio ambiente natural Brito (2007, s.p.).

3 MEIO AMBIENTE CONSTRUÍDO OU ARTIFICIAL

Inicialmente, vale conceituar o meio ambiente artificial que, segundo Fiorillo (2011, p. 74), é o espaço urbano construído formando assim, um conjunto de edificações denominados espaços urbanos fechados, bem como os espaços urbanos abertos que consiste os espaços ou equipamentos públicos, como praças e lagos. Já na concepção de Sirvinskas (2015, p. 759), o meio ambiente artificial é uma das ramificações do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado assegurado pelo art. 225 da Constituição Federal, considerando a sua construção pelo homem esse pode se localizar tanto em áreas urbanas, quanto em áreas rurais, pois trata-se da ocupação dos espaços naturais que são convertidos em urbanos artificiais. Esses espaços urbanos, são classificados entre abertos e fechados, a título de exemplo, consideram-se os componentes do meio ambiente artificial aberto as ruas, praças, avenidas, por outro lado, os espaços urbanos fechados são os edifícios, casas, clubes, shoppings.

Ainda ao que tange ao conceito dessa face do meio ambiente, Fiorillo (2011, p. 75) defende que guarda uma relação com a definição de cidade. Nesse sentido Spantigati leciona

“Vale verificar que o vocábulo “urbano”, do latim urbs, urbis, significa cidade e, por extensão, seus habitantes. Não está empregado em contraste com o termo campo ou rural, porquanto qualifica algo que se refere a todos os espaços habitáveis, “não se opondo a rural, conceito que nele se contém: possui, pois, uma natureza ligada ao conceito de território” (SPANTIGATI, 1969, p. 11). (grifo do autor)

Sob a ótica de Farias (2006, s.p.), o meio ambiente em tela é aquele que sofreu alteração por parte do ser humano, configurando sua composição por espaços abertos e fechados, como já aludido alhures. Apesar desse conceito nos remeter a ideia de cidade, esse abarca a área rural no que se refere aos espaços habitáveis, local onde o espaço natural cedem lugar ou, até mesmo, se integram às edificações urbanas de aspectos artificiais.

Insta salientar, que o meio ambiente encontra-se tutelado, não apenas pelo art. 225 do diploma Constitucional, mas também no art. 182 ao se referir as políticas urbanas, bem como no art. 20, inciso XX, ao delegar a União Federal o estabelecimento de diretrizes ao desenvolvimento urbano, englobando habitação, saneamento básico e transportes urbanos, como também no art. 5º, inciso XXIII, que se refere a função social da propriedade, todos da Constituição Federal, entre demais do referido diploma (FIORILLO, 2011, p. 75).

Nessa esteira, Sirvinskas (2015, p. 759) esclarece que a ocupação das áreas urbanas se tornou complexa e numerosa desencadeando a necessidade de se instaurar uma regulamentação para aplicar a política pública urbana. Dessa forma, o “crescimento da urbanização leva a conflitos com o meio ambiente, por vezes desastrosos, principalmente ao se considerarem as condições de vida das futuras gerações” (BRUNA, 2002, p. 25). Essas áreas urbanas são compostas por regiões metropolitanas, microrregiões ou aglomerações urbanas, formadas pelo conjunto de municípios limítrofes, com o objetivo de integração ao planejamento e a execução de funções públicas em prol do interesse comum.

Considerando o grande número de pessoas, as áreas chamadas urbanas passam a ser insuficientes, carecendo de investimentos para atender a demanda, esses espaços são conhecidos como cidades. Sendo essa, a área em que vive o homem precisa de alimentação, saneamento básico, água potável, transporte, entre demais necessidades, por esse motivo se instaura a política de desenvolvimento urbano com o intuito de promover o pleno desenvolvimento urbano, ou melhor, das funções sociais da cidade assegurando o bem-estar daqueles que nele habitam, conforme preconiza o art. 182, caput, da Constituição Federal de 1988 (SIRVINSKAS, 2015, p. 760).

4 MEIO AMBIENTE LABORAL

O meio ambiente laboral ou meio ambiente do trabalho é considerado uma das espécies de meio ambiente, tutelados pelo art. 225 da Constituição Federal, posto que se configura no local em que os indivíduos desenvolvem sua atividade laboral, ou seja, onde as pessoas trabalham de forma remunerada ou não. Isso significa que o todos têm direito a um meio ambiente do trabalho propício à saúde, tendo como base a salubridade e a ausência de agentes comprometedores da integridade físico-psíquica dos trabalhadores (FIORILLO, 2012, p. 77). Assim, considerando que esse é o meio ambiente em que os indivíduos estão expostos aos riscos oferecidos pelo contato com produtos perigosos ou até mesmo atividades insalubres, deve ser proporcionado um ambiente adequado de maneira que o empregado desenvolva suas atividades de forma digna. Isso se dá, pois o meio ambiente não se preocupa apenas em relação a poluição lançada pelas indústrias, mas também com os trabalhadores em contato direito aos agentes agressivos (SIRVINSKAS, 2015, p. 861).

A localização do meio ambiente do trabalho, geralmente, concentra-se nos grandes centros (SIRVINSKAS, 2015, p. 861), todavia existem casos de exceções, tendo em vista que os aspectos caracterizadores desse meio são os “complexos de bens móveis de uma empresa ou sociedade, objetos de direitos subjetivos privados e invioláveis da saúde e da integridade física dos trabalhadores que a frequentam” (GIAMPIETRO, 1988, p. 113). Nesse sentido, Júlio César de Sá da Rocha argumenta que

“Não se limita ao empregado; todo trabalhador que cede sua mão de obra exerce sua atividade em um meio ambiente de trabalho. Diante das modificações por que passa o trabalho, o meio ambiente laboral não se restringe ao espaço interno da fábrica ou da empresa, mas se estende ao próprio local de moradia ou ao ambiente urbano. Muitos trabalhadores exercem suas atividades percorrendo ruas e avenidas das grandes cidades como, por exemplo, os condutores de transportes urbanos” (ROCHA, 1997, p. 30).

Nesse seguimento, Talden (2006, s.p.) defende que o meio ambiente laboral configura uma extensão do meio ambiente artificial, pois é o conjunto de fatores que compõem o ambiente de trabalho. Tais como, máquinas, ferramentas, agentes químicos, físicos e biológicos, as operações, os processos, a interação do empregado com esse meio descrito. Sendo que o centro desse ambiente é a promoção da salubridade e incolumidade, tanto física, quanto psicológica, do trabalhador independentemente do local de atuação e da atividade desenvolvida. Noutra senda, o entendimento do STF contraria o quanto exposto anteriormente, considerando que o mesmo não adota o entendimento que o meio ambiente do trabalho é uma espécie de meio ambiente (gênero), mas essa segregação feita tem como finalidade viabilizar a fiscalização e sua regulamentação por parte dos Estados e municípios (FURLAN; FRACALOSSI, 2010, p. 34). A tutela do meio ambiente laboral, encontra-se em evidência de maneira expressa no art. 200, inciso VIII da Constituição Federal, in verbis

“Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei: [omissis]

VIII — colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho’ (BRASIL, 1988).

Ademais, a Lei Maior não tutela somente o meio ambiente laboral, como também sobre a redução dos riscos advindos do exercício laboral. Consoante o exposto no art. 7º do diploma constitucional, em seu inciso XXIII, busca-se dirimir os riscos presentes no desenvolvimento do trabalho, tanto urbano, quanto rural por intermédio de normas de saúde, higiene e segurança (BRASIL, 1988). Todavia, insta salientar o aspecto protecionista do direito do trabalho, não se confunde com a garantia ao meio ambiente laboral, considerando que essa última se refere à saúde e a segurança do trabalhador em seu ambiente de trabalho. Já o direito do trabalho visa disciplinar as relações, através de normas jurídicas, entre empregado e empregador (FIORILLO, 2012, p. 78).

5 MEIO AMBIENTE CULTURAL

O meio ambiente cultural é uma das facetas do meio ambiente protegida e reconhecida pela Constituição Federal em vigor. Antes mesmo de conceituar esse aspecto do meio ambiente, Sirvinskas (2015, p. 735) teve o cuidado de esclarecer o que é cultura, que por sua vez, consiste no elemento de identificação das sociedades humanas, abarcando a língua de comunicação entre o povo, o manejo culinário, a forma em que externa sua história e poesias, a maneira como se veste e local em que constitui moradia, como também suas crenças, danças, religião, seus direitos. Além disso, as armas, as lendas, as técnicas relacionadas a agricultura e os instrumentos de trabalho, de igual modo compõem os elementos de caracterização e identificação de um povo, sob o ponto de vista antropológico (SOUZA FILHO, 2006, p. 15).

Nesse contexto, Farias (2006, s.p.) salienta que essa dimensão do meio ambiente se configura pelo patrimônio de aspecto histórico, artístico, paisagístico, ecológico, científico e turístico, sendo composto por diversos bens, seja material ou imaterial, de acordo com sua relevância cultural e especial adquirida. Na visão de Fiorillo (2011, p. 76), esses bens que integram o meio ambiente cultural são aqueles que representam a história daquele povo, como ocorreu a sua formação, o desenvolvimento da sua cultura, logo, sendo esses os elementos identificadores de sua cidadania, sendo esse, princípio fundamental norteador do diploma constitucional em vigor.

Dessarte, o patrimônio cultural é composto por uma gama de bens (produtos e subprodutos) advindos da sociedade. Esses bens são protegidos sob a justificativa de que os mesmos integram a memória de um povo/país, não se considerando o interesse particular, nesse caso (SIRVINSKAS, 2015, p. 735). Nessa continuidade, Fiorillo elucida que

“Um dos primeiros conceitos de patrimônio cultural foi trazido pelo art. 1º do Decreto-Lei n. 25/37, que determinava constituir patrimônio histórico e artístico nacional o conjunto dos bens móveis e imóveis existentes no País, cuja conservação seja de interesse público, quer por vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico” (FIORILLO, 2011, p. 407).

Já o conceito legal de meio ambiente cultural trazido pela Constituição Federal, se encontra no art. 216, in verbis

“Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material ou imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem:

I — as formas de expressão;

II — os modos de criar, fazer e viver;

III — as criações científicas, artísticas e tecnológicas;

IV — as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais;

V — os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico” (BRASIL, 1988).

Diante da transcrição do art. 216 da Constituição Federal, observa-se que o legislador não apontou distinção entre os bens quanto a sua natureza, abrindo margem para a sua classificação entre material e imaterial, singular ou coletivo, móvel ou imóvel. Não obstante, esses bens são protegidos no âmbito constitucional, independentemente se foram criados através de intervenção humana ou não, consoante o entendimento de Fiorillo (2011, p. 408). Esse autor assevera ainda, que o requisito para que o bem seja considerado patrimônio cultural, o mesmo deve guardar relação com a identidade, a ação e as memórias dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, essa relação é denominada de nexo vinculante, pelo doutrinador supracitado.

Sendo assim, todo bem que remeta a cultura, identidade e memória de um povo, será resguardado como bem ambiental, consequentemente, difuso, uma vez que reconhecido como patrimônio cultural (FIORILLO, 2011, p. 408-409). No Brasil, existe um instituto responsável por promover e coordenar o processo de preservação e valorização do Patrimônio Cultural Brasileiro, material e imaterial, denominado Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan (BRASIL, 2009, s.p.).

Como cediço, os bens culturais podem ser, tanto materiais, como imateriais. Os bens considerados imateriais estão diretamente ligados aos saberes, habilidades, crenças, práticas e ao modo de ser de um determinado povo. Diante disso, os bens imateriais são conhecimentos fixados na rotina das comunidades; a maneira de se expressar através de literaturas, músicas, plásticas, cênicas e lúdicas, como também rituais e festas tradicionais que marcam a vivência coletiva em diversos âmbitos, como na religiosidade e do entretenimento. Não obstante, os mercados, feiras, santuários, praças e outras áreas que se reproduzem as ações culturais, também são consideradas bens culturais. O Brasil tem como exemplo, o frevo, a capoeira, o modo artesanal de fazer Queijo de Minas, entre outros (BRASIL, 2009, s.p.).

Já, no que se refere ao patrimônio material, têm-se aqueles que pelo seu modelo, seja arqueológico, paisagístico e etnográfico; histórico; belas artes ou das artes aplicadas, são resguardados constitucionalmente, estes se subdividem em bens imóveis e móveis. Os bens imóveis são núcleos urbanos, sítios arqueológicos e paisagísticos. Já os bens móveis são coleções arqueológicas, acervos museológicos, documentais, bibliográficos, arquivísticos, videográficos, fotográficos e cinematográficos. No que tange aos bens materiais brasileiros, tem-se como exemplo os conjuntos arquitetônicos de cidades como Ouro Preto, localizada no estado de Minas Gerais, Paraty, localizada no estado do Rio de Janeiro, entre outras. Quanto aos bens materiais paisagísticos brasileiros, têm-se os Lençóis, localizada no estado da Bahia, Serra do Curral localizada no estado de Belo Horizonte, Grutas do Lago Azul e de Nossa Senhora Aparecida localizadas na cidade de Bonito no estado do Mato Grosso do Sul e o Corcovado localizado no Rio de Janeiro.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ante o exposto, vislumbra-se que a ideia de meio ambiente vincula-se a diversas dimensões, ultrapassando a visão de que o meio ambiente está somente ligado as questões naturais. Percebe-se então, que o meio ambiente acompanha o ser humano por onde ele for, seja em seu labor ou em momento de lazer, resguardando seu direito a qualidade de vida. Com isso, a Constituição Federal de 1988 deu um largo passo no que se refere ao reconhecimento das múltiplas dimensões do meio ambiente como bem jurídico comum, acautelando o ser humano das presentes e futuras gerações no que se refere a garantia de um meio ambiente equilibrado que propicie a vida salutar, sendo obrigação do Estado e da sociedade preservá-lo.

Ora, isso não só apenas no que se refere aos recursos naturais, como também ao meio ambiente artificial, garantindo áreas verdes para recreação, por exemplo, não se afastando a sua extensão que se compreende o meio ambiente do trabalho de modo que o empregado venha desenvolver suas tarefas laborais em boas condições, em locais salubres, preservando a sua integridade física e psíquica. Por fim, visou-se preservar também o meio ambiente cultural que se concretiza por meios de bens, tangíveis e intangíveis, de acordo com a sua relevância para a cultura do povo. Portanto, é importante destacar que o meio ambiente é algo que faz parte da vida do ser humano, independentemente de onde se encontra, pois esse também integra o meio ambiente.

 

Referências:
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Notas
[1] Artigo vinculado ao Projeto de Iniciação Científica intitulado “Tutela Penal do Meio Ambiente à luz da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: o artigo 56 da Lei de Crimes Ambientais em exame, no período de 2010-2016”.


Informações Sobre os Autores

Anysia Carla Lamão Pessanha

Acadêmica de Direito da Faculdade Metropolitana São Carlos FAMESC Unidade Bom Jesus do Itabapoana

Tauã Lima Verdan Rangel

Doutorando vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF), linha de Pesquisa Conflitos Urbanos, Rurais e Socioambientais. Mestre em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal Fluminense. Especializando em Práticas Processuais – Processo Civil, Processo Penal e Processo do Trabalho pelo Centro Universitário São Camilo-ES. Bacharel em Direito pelo Centro Universitário São Camilo-ES


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