Outorga uxória na união estável: aval e fiança

Resumo: O presente estudo aborda a necessidade de outorga uxória no regime de união estável caso um dos companheiros venha prestar aval ou fiança, tendo em vista que outorga uxória é o consentimento que o companheiro concede para a realização de determinados procedimentos que expõe o patrimônio familiar. Foram analisadas várias legislações e pensamentos doutrinários, levando-se em conta os mais adequados para a aplicação ao caso concreto. Buscou-se explanar sobre o fenômeno social que é a união estável, seu conceito, regime de bens e como se dá seu registro e publicidade, juntamente com a análise do conceito dos institutos aval e fiança; destacando que ambas não podem ser confundidas entre si. Verificou-se também o posicionamento doutrinário e jurisprudencial acerca da necessidade de outorga uxória no regime de união estável, bem como a validade desse contrato e a necessidade de regulamentação. Viu-se ainda que a união estável, em seus aspectos patrimoniais, não difere do casamento civil, possuindo a mesma relevância. Fez-se por fim que, caso não prestado a outorga uxória pelo companheiro, o ato deverá ser passível de nulidade, uma vez que o patrimônio foi adquirido por ambos os conviventes, assim, fazendo parte de bens que pertencem ao casal.

Palavras-chave: Outorga Uxória. União Estável. Regime de Bens. Aval. Fiança.

Abstract: The present study addresses the need for granting uxória in stable union regime if one of the companions come pay endorsement or bail, considering that uxória is the consent that granting the partner grants to carry out certain procedures that exposes the family heritage. Several legislations were analysed and doctrinal thoughts, taking into account best suited for the application to the specific case. Sought to explain about the social phenomenon that is stable, its concept, and how his record and advertising, along with the analysis of the concept of consent and bail; Noting that both cannot be confused with each other. It was also verified the doctrinal position and jurisprudence about the need of granting uxória in stable union regime, as well as the validity of the contract and the need for regulation. See the stable Union, in its aspects of assets, does not differ from civil marriage, with the same relevance. Done at last, which if not given the uxória award by the companion, the Act must be subject to nullity, since the asset was acquired by both convincing thus forming part of goods belonging to the couple.

Keywords: Grant Uxória. Stable Union. Goods Regime. Endorsement. Bail.

Sumário: 1. Introdução. 2. União estável. 2.1. Efeitos patrimoniais da união estável. 2.1.1. Considerações Gerais. 2.1.2. Regime de Bens. 2.1.3. Registro e Publicidade. 2.2. Boa-fé perante a terceiro. 3. Garantias aval e fiança. 3.1. Aval. 3.2. Fiança.3.3. Diferenças entre aval e fiança. 4. Outorga uxória no regime de união estável na prestação de aval ou fiança. 4.1. Validade do contrato celebrado sem a outorga uxória do companheiro para a prestação do aval ou fiança. 4.1.1. Necessidade de Regulamentação. 4.2. Posicionamento doutrinário e jurisprudencial sobre a outorga uxória no regime de união estável quando um dos companheiros prestar aval ou fiança. 5. Conclusão.

1 INTRODUÇÃO

A presente pesquisa tem o foco de analisar a necessidade ou não da outorga uxória, para aval e fiança, nos casos de casais em regime de união estável. É incontroverso dizer que isso não afeta os direitos de família, uma vez que, é claro dizer que ambos construíram o patrimônio juntos. Analisa-se, também, a boa-fé, do companheiro, na posição de fiador, com o patrimônio do casal e com o terceiro, tendo em vista que, não é declarado ao credor se a pessoa vive ou não em união estável com alguém.

A União Estável esta prevista em vários dispositivos do ordenamento jurídico, a começar pelo artigo 226, paragrafo 3º, da Constituição Federal de 1988, que prevê os seguintes termos de proteção: “Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”. No que diz respeito ao regime de bens, o artigo 1.725 do Código Civil configura o mesmo, como comunhão parcial de bens, salvo contrato escrito entre os companheiros.

Diante dessas questões, se buscou avaliar os reflexos que essas decisões trazem quanto à segurança jurídica dos bens dos companheiros conviventes em união estável, visando esclarecer a necessidade de ponderação de interesses dos indivíduos.

Assim, tem como objetivo analisar a possibilidade de uma regulamentação mais objetiva pelo Código Civil perante a necessidade da outorga uxória pelo companheiro em situações de aval e fiança, no caso de união estável, bem como, verificar os efeitos que a outorga uxória traz perante o contrato de união estável e os bens adquiridos pelos companheiros conjuntamente.

2 UNIÃO ESTÁVEL

A União Estável, anteriormente chamada de Concubinato, teve origem no Direito Romano. Época em que “ricos” e “pobres” não podiam realizar casamento entre si e se uniam extra – matrimonialmente. Ademais, na idade contemporânea, a França trouxe a tona tal tema, fazendo uma análise mais cautelosa em relação ao direito patrimonial da nova família, tornando-se assim um referencial em princípios da sociedade.

Para o doutrinador Bittencourt (1980, p.40): “entre os gregos, a concubinagem não acarretava qualquer desconsideração e era, em certa medida, reconhecida pelas leis”. E aponta que a França foi à origem legislativa do direito concubinário, influenciando a legislação brasileira na aplicabilidade deste direito, bem como, auxiliando os operadores de direito em suas reflexões de evolução legislativa e jurisprudencial.

Com a criação do Código Civil de 1916, ficou estabelecido que família seria oriunda do casamento, havendo proteção para a mesma apenas através do casamento. Tal código trouxe vários atos discriminatórios, como por exemplo, não se tratar de uma forma legítima de família e ser discriminada pela sociedade civil. Posteriormente, tais atos foram revogados pela Constituição Federal de 1988.

Neumann (1998), fala em sua obra sobre os atos discriminatórios contra esta forma de família:

“A perseguição à família ilegítima foi inserida na sociedade moderna pela igreja católica, seguindo – a as demais correntes do cristianismo. Como país católico, Portugal regia suas colônias e súditos com normas do direito Canônico, as derradeiras foram as Ordenações Filipinas que negavam qualquer direito a concubina salvo o de indenização pelo comércio sexual que na década de 1930 foi substituído pela expressão de serviços prestados inclusive punindo os que praticassem, considerando o casamento religioso a única forma de constituição de família. Esta regra perpetuou-se no Código Civil de 1916 com uma pequena adaptação: não mais o casamento religioso, mais o casamento civil legitimaria a família.” (NEUMANN, 1998, p. 103)

A Constituição Federal de 1988 assegura às pessoas que se encontram em união estável a mesma proteção jurídica conferida àquelas que optam pelo casamento de regime de comunhão parcial de bens. A Carta Magna em seu artigo 226, parágrafo 3º, diz que: “Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua convenção em casamento”.

Assim, qualquer forma de entidade familiar, deve ter a devida proteção, não justificando tratamento desigual e/ou discriminatório.

Como dito, a Constituição Federal de 1988 reconheceu a convivência entre um homem e uma mulher como forma de entidade familiar. Mas em contrapartida, não definiu os direitos assegurados aos conviventes, posteriormente realizado pelo legislador infraconstitucional pelas Leis 8.971 de 29 de Dezembro de 1994 e 9.278 de 10 de maio de 1996, Súmula 380 do STF e os artigos 1.723 a 1.727 do Código Civil.

“A Lei 8.971/94 determinou regras sobre alimentos e direito sucessório aos companheiros, conceituando a união estável como a união de pessoas solteiras, separadas judicialmente, divorciadas ou viúvas, que convivam por mais de 5 anos ou que tenha filhos comuns. Mais tarde, a Lei 9.278/96 ao conceituar a união estável, retirou o prazo de duração da relação, bem como o estado civil das partes e indicou novos requisitos como: durabilidade; publicidade do relacionamento e objetivo de constituir família. Portanto, a lei atual não estabelece mais prazo de duração do relacionamento para ser considerado como entidade familiar formada pela união estável. O Código Civil atual praticamente reproduziu o que consta da lei de 1996, acrescentando, entretanto, mais um requisito, qual seja, a não existência de impedimento matrimonial, exceto no caso de pessoas separadas de fato ou judicialmente (artigo 1723 do Código Civil). Como podemos verificar, a lei não diz claramente o que é ou não uma união estável, mas fornece elementos para que o magistrado possa formar um convencimento a respeito da constituição da entidade familiar, dependendo do caso concreto.” (CAVALCANTI, 2009, p. 1)

Sendo assim, a Lei 8.971/94 estabeleceu os requisitos para a caracterização da união estável, como por exemplo, o prazo de cinco anos para que a mesma fosse válida. Já a Lei 9.278/96, de acordo com o seu artigo 1º, retirou o referido prazo de cinco anos, definindo assim: “a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com o objetivo de constituição de família".

A Súmula 380 do STF traz que: “Comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum”. A partir daí, o direito de partilha de bens adquiridos em comum pelos conviventes, começa a ser reconhecido.

Com o advento do Novo Código Civil de 2002, as leis de 1994 e 1996 foram revogadas, dando um aperfeiçoamento melhor ao Instituto da União Estável. (MARQUES, 2008, p.1)

A legislação brasileira não definiu ao certo o conceito da união estável, ficando assim, espaço para a doutrina conceituá-la. Vale ressaltar que este conceito deve acompanhar as transformações sociais e culturais da sociedade.

Segundo o conceito do doutrinador Coelho (2012):

“A união estável caracteriza-se pela convivência entre o homem e a mulher desimpedidos, como se casamento fosse, baseada pela convivência pública, contínua, duradoura e estabelecida com o objetivo de constituir família, entre homem e mulher desimpedidos para o casamento.” (COELHO, 2012, p. 124)

Assim, a união estável é a convivência entre duas pessoas desimpedidas, mas que para sua caracterização necessita do cumprimento de alguns requisitos que os diferem do simples namoro.

O namoro não se caracteriza como forma de família, sendo apenas uma expectativa de que se forme a mesma. Nesse sentido:

“Passo importante na escalada do afeto ocorre se o encontro inicial revela o início de uma efetiva relação amorosa. Dá-se então, o namoro, já agora um compromisso assumido entre homem e mulher que se entendem gostar um do outro. Pode ser paixão à primeira vista, embora nem sempre isso aconteça, pois o amor vai se consolidando aos poucos, com encontros e desencontros do casal embevecido. Do latim in amoré, o namoro sinaliza situação mais séria de relacionamento afetivo.” (OLIVEIRA, 2006, p. 256)

O referido autor diz que o namoro é um processo de convivência que está em crescimento, podendo futuramente tornar-se uma família. Não se tem na legislação um conceito de namoro, não há requisitos legais para o mesmo. O que se pode falar como requisitos do namoro são os que a sociedade impõe aos cidadãos, sendo eles morais e os de costumes da época ou de determinado local.

Os requisitos da união estável estão previstos no artigo 1.723 do Código Civil: “É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”.

Portanto, o que diferencia o namoro da união estável, é o intuito de constituir família. O objetivo de constituir família não deve ser futuro e sim estar de fato formada.

2.1 EFEITOS PATRIMONIAIS DA UNIÃO ESTÁVEL

2.1.1 Considerações Gerais

Os efeitos patrimoniais da união estável são de uma forma geral, os direitos que os conviventes adquirem em relação aos bens conquistados durante a relação.

Comparando as regras da união estável com a do casamento, pode-se dizer que a principal diferença entre ambos é a legal, ou seja, apenas para as decisões jurídicas. Sobre as diferenças, tem-se em primeiro ponto, a informalidade da união estável e a formalidade do casamento. O doutrinador Tartuce (2014) trata de outras diferenças entre ambas com uma maestria singular:

“Primeira diferença: O casamento exige expressamente a fidelidade; a união estável exige lealdade. Pelo senso comum, a lealdade engloba a fidelidade, mas não necessariamente. Isso demonstra que na união estável há uma liberdade maior aos companheiros do que no casamento, o que diferencia substancialmente os institutos, mormente se a conclusão for pela persistência do dever de fidelidade no último. Segunda diferença: O casamento exige expressamente ida em comum no domicílio conjugal; a união estável não, por não exigir convivência sob o mesmo teto, conforme a remota Súmula382 do STF.” (TARTUCE, 2014, p. 42)

A união estável surge da convivência entre um homem e uma mulher, tendo como objetivo fidelidade, lealdade, respeito com o companheiro, assim como se exige no casamento.

2.1.2 Regime de Bens

A Constituição Federal de 1988 assegura às pessoas que se encontram em união estável a mesma proteção jurídica conferida àquelas que optam pelo casamento de regime de comunhão parcial de bens. A Carta magna em seu artigo 226, parágrafo 3º, diz que: “para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua convenção em casamento”.

E pelo fato de ser uma entidade protegida e amparada pela Constituição Federal, os companheiros possuem a proteção jurídica necessária para evitar injustiças que possam vir a ocorrer quando houver o rompimento do casal.

Conforme artigo 1.725 do Código Civil: "Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens".

No que tange ao artigo 5º da Lei 9278/1996:

“Os bens móveis e imóveis, adquiridos por um ou por ambos os conviventes, na constância da união estável e a titulo oneroso, são considerados fruto do trabalho e da colaboração comum, passando a pertencer a ambos, em condomínio e em partes iguais, salvo estipulação contrária em contrato escrito.”

Com o advento da Lei, pode-se dizer que o patrimônio constituído por ambos os conviventes durante a relação, pertencem aos dois, podendo ser partilhado de forma igualitária conforme menciona a Súmula 380 do STF: é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum.”

Neste sentido entende o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

“UNIÃO ESTÁVEL – DISSOLUÇÃO – PARTILHA – BENS MÓVEIS – PROVA. Comprovada a união estável, os bens adquiridos na constância da vida em comum devem ser partilhados  de forma igualitária, pouco importando qual tenha sido a colaboração prestada individualmente pelos conviventes. Recurso provido. (TJRS – Apelação Cível 70.018.869.891- Relatora: Desembargadora Maria Berenice Dias).” 

Nesta modalidade de constituição de família, embora os conviventes possuam a liberdade em disciplinar seu patrimônio como lhes convierem, se não houver uma estipulação contratual, o regime de bens adotado será o de comunhão parcial de bens.

Acerca do que é o regime de comunhão parcial de bens, tem-se como conceito:

“A comunhão parcial, também chamada de comunhão dos aquestos ou de adquiridos, é o regime no qual cada um dos cônjuges mantém como próprios os seus bens anteriores ao casamento, comunicando-se os adquiridos onerosamente na vigência da sociedade conjugal.” (WALD, 2002, p. 124)

Assim, os bens particulares adquiridos antes da relação, são preservados com titularidade exclusiva, bem como, os bens adquiridos durante a relação pertencem aos companheiros de forma igual, presumindo terem sido adquiridos por esforço comum de ambos. A intenção do regime de comunhão parcial de bens é evitar o enriquecimento sem causa de qualquer um dos conviventes. (DUARTE, 2010, p.1)

2.1.3 Registro e Publicidade

Durante a relação de união estável, todos os atos patrimoniais praticados pelos companheiros terão efeitos obrigacionais, inclusive quanto a terceiros. Isso quer dizer que, conforme dispõe o artigo 219 do Código Civil: “As declarações constantes de documentos assinados presumem-se verdadeiras em relação aos signatários. Paragrafo único. Não tendo relação direta, porém, com as disposições principais ou com a legitimidade das partes, as declarações enunciativas não eximem os interessados em sua veracidade do ônus de prova-las”.

A partir do momento em que a união estável é reconhecida juridicamente, submete-se o terceiro aos seus efeitos. Como exemplo disso, pode-se citar o fato da escritura de um determinado imóvel, onde consta somente o nome de um dos companheiros; o documento gozará de validade, porém, não há nada que comprove que este bem pertence ao outro companheiro. Vale ressaltar que o documento é valido, sem vícios quanto seu registro. Agora, analisando o lado do terceiro de boa-fé, este não poderá ser prejudicado, uma vez que o companheiro que fez a reclamação não possui o nome inserido no registro do bem.

Nessa linha de raciocínio, Diniz (2014) afirma que:

“Se o bem estiver em nome de um dos conviventes, pois a venda poderá vir a ser anulada pelo outro, se reconhecido for o direito à meação. Afirma ainda o artigo 5º do Projeto de Lei nº 2686 requer que, no instrumento firmado com terceiro, os conviventes mencionem a existência de união estável, sob pena de pagar perdas e danos a terceiro de boa-fé e de sofrer sanção penal por falsidade ideológica.” (DINIZ, 2014, p.399)

Sendo assim, a união estável precisa ser notória, não podendo ser uma relação escondida. Ana Claudia Scalquette (2009) afirma que: “não quer dizer que os atos praticados pelo casal devam ser levados ao conhecimento de todos, mas sim que o relacionamento não aconteça às escondidas e que ambos ajam naturalmente como qualquer outro casal”. Ainda, o sistema jurídico brasileiro valoriza a publicidade registral, assim, tutela os interesses do terceiro para garantir a segurança do tráfico jurídico.

A publicidade registral, conforme informações do Cartório 4º Registro de Imóveis de Goiânia, seria a averbação da união estável na matrícula do imóvel, assim ficando clara a sua existência o que de fato obrigaria o terceiro a exigir a anuência de ambos os conviventes.

2.2 BOA-FÉ PERANTE A TERCEIRO

É um princípio constitucional, sendo assim, constitui valores relevantes de determinada ordem jurídica.

Nas palavras de Barroso (1999):

“O ponto de partida do intérprete há que ser sempre os princípios constitucionais, que são o conjunto de normas que espelham a ideologia da Constituição, seus postulados básicos e seus fins. Dito de forma sumária, os princípios constitucionais são as normas eleitas pelo constituinte como fundamentos ou qualificações essenciais da ordem jurídica que institui.” (BARROSO, 1999, p. 147)

A boa-fé é um valor, norteador de todo o ordenamento jurídico, que exprime confiança, lealdade, honestidade; princípios que as pessoas devem usar em seu comportamento social.

Em se tratando do terceiro de boa-fé, este possui proteção jurídica, vez que se a união estável não estiver averbada na matrícula e a relação dos companheiros não for pública, não há como o terceiro comprador do imóvel saber da existência de união estável. Assim, só estará obrigado a exigir a outorga uxória se a união estável estiver averbada na matrícula, isso porque a publicidade da união estável não é um ato formal. Para este caso, a solução seria dar mais publicidade à união estável assim como no casamento civil. (IMÓVEIS, 2014, p. 1)

“RECURSO ESPECIAL. DIREITO PATRIMONIAL DE FAMÍLIA. UNIÃO ESTÁVEL. ALIENAÇÃO DE BEM IMÓVEL ADQUIRIDO NA CONSTÂNCIA DA UNIÃO. NECESSIDADE DE CONSENTIMENTO DO COMPANHEIRO. EFEITOS SOBRE O NEGÓCIO CELEBRADO COM TERCEIRO DE BOA-FÉ.

1. A necessidade de autorização de ambos os companheiros para a validade da alienação de bens imóveis adquiridos no curso da união estável é consectário do regime da comunhão parcial de bens, estendido à união estável pelo art. 1.725 do CCB, além do reconhecimento da existência de condomínio natural entre os conviventes sobre os bens adquiridos na constância da união, na forma do art. 5º da Lei 9.278/96, Precedente.

2. Reconhecimento da incidência da regra do art. 1.647, I, do CCB sobre as uniões estáveis, adequando-se, todavia, os efeitos do seu desrespeito às nuanças próprias da ausência de exigências formais para a constituição dessa entidade familiar.

3. Necessidade de preservação dos efeitos, em nome da segurança jurídica, dos atos jurídicos praticados de boa-fé, que é presumida em nosso sistema jurídico.

4. A invalidação da alienação de imóvel comum, realizada sem o consentimento do companheiro, dependerá da publicidade conferida a união estável mediante a averbação de contrato de convivência ou da decisão declaratória da existência união estável no Ofício do Registro de Imóveis em que cadastrados os bens comuns, ou pela demonstração de má-fé do adquirente.

5. Hipótese dos autos em que não há qualquer registro no álbum imobiliário em que inscrito o imóvel objeto de alienação em relação a co-propriedade ou mesmo à existência de união estável, devendo-se preservar os interesses do adquirente de boa-fé, conforme reconhecido pelas instâncias de origem.

6. RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.”

No caso em análise o relator negou provimento, pois não há averbação da união estável na matrícula do imóvel, assim privilegiando a boa-fé do terceiro adquirente. Mas também não tirou o direito da autora de discutir os prejuízos sofridos com a alienação do bem que pertencia ao casal durante a relação, podendo entrar com ação própria para alegar tais direitos.

Como dito, a boa-fé, tanto do terceiro como do companheiro que prestará o aval ou fiança, é essencial para que nenhuma das partes sofram prejuízos causados pela falta da outorga uxória.

3 GARANTIAS – AVAL E FIANÇA

São dois institutos diferentes, porém muitas vezes confundidos entre si nas relações jurídicas realizadas no cotidiano. Cada uma detém de peculiaridades e regramento próprio. Nelas, existe a figura de uma pessoa, podendo ser física ou jurídica, que possui condições econômicas assumindo a garantia do pagamento de um titulo.

3.1 AVAL

O Dicionário Aurélio (2010) conceitua aval, na sua forma natural, como: “Garantia pessoal, plena e solidária, que se dá de qualquer obrigado ou coobrigado em título cambial, ou figurativamente é o apoio moral ou intelectual”.

Tem-se, por outro lado, o conceito jurídico que é de garantia plena e solidária, prestada por uma terceira pessoa, com sentido figurativo de apoio moral ou intelectual. Segundo Coelho (2000), "aval é ato cambiário pelo qual uma pessoa (avalista) se compromete a pagar titulo de crédito, nas mesmas condições do devedor deste titulo (avalizado)". Todos os conceitos de aval trazem em comum ser uma declaração firmada pelo avalista que garante total ou parcialmente, o pagamento do título.

O aval assegura o cumprimento da obrigação expressa no título. Ele se dá quando há inadimplência pela parte, assim respondendo com o seu patrimônio pelo pagamento. Então, aval tem como principal a obrigação de pagar.

Vale ressaltar que aval é um negócio jurídico simples, não sendo uma forma de contrato, mas sim uma obrigação que se assume materializando-se por meio de um título de crédito.

3.2 FIANÇA

Esta por sua vez, possui natureza contratual sendo uma garantia pessoal prestada por determinada pessoa garantindo o pagamento ao credor por uma obrigação que deveria ter sido paga pelo devedor principal.

A fiança deve ser obrigatoriamente escrita, e por depender de forma prescrita em lei, devem ser observadas suas formalidades para ter validade. Seu regulamento esta no Código Civil a partir do artigo 818. Tal artigo define: “pelo contrato de fiança, uma pessoa garante satisfazer ao credor uma obrigação assumida pelo devedor, caso este não a cumpra”. 

Para Diniz (2014):

“A garantia […] poderá efetivar-se mediante a entrega de um bem móvel ou imóvel, pertencente ao próprio patrimônio do obrigado (penhor, hipoteca ou anticrese), para responder preferencialmente pelo resgate da dívida, caso em que se terá garantia real, ou, então, mediante promessa de terceiro, estranho à relação jurídica, de solver pro debitore, hipótese em que se configurará a garantia pessoal ou fidejussória, ou melhor, a fiança, que, além de garantir a boa vontade do devedor, completará a sua insuficiência patrimonial com o patrimônio do fiador […]” (DINIZ, 2014, p.572)

A fiança seria uma forma de aumentar as chances do credor receber sua dívida. É uma garantia de grande importância, pois se o devedor for inadimplente é o fiador quem será executado para fazer o pagamento da dívida.

3.3 DIFERENÇAS ENTRE AVAL E FIANÇA

São dois institutos autônomos e ambos possuem regramento diverso que os regem. Embora existam aqueles que entendem que o aval é uma espécie de fiança, sendo que para eles todas as regras da fiança deveriam ser aplicadas ao aval.

 Pereira (2013) traz as diferenças entre aval e fiança de forma resumida e simples:

“Não há confundir fiança e aval. Ambos são tipos de garantia pessoal, mas, enquanto a fiança é uma garantia fidejussória ampla, e hábil a aceder a qualquer espécie de obrigação, convencional, legal ou judicial, o aval é restrito aos débitos submetidos aos princípios cambiários. Em razão da velocidade dos títulos desta espécie, não está o aval sujeito às restrições de que padece a fiança, no tocante à outorga do outro cônjuge. E nos seus efeitos também difere, gerando o aval responsabilidade solidária, ao contrário da fiança, que pode sê-lo ou não.” (PEREIRA, 2013, p. 495)

Sendo assim, sinteticamente, tem-se como diferenças entre os institutos onde o fiador tem obrigação acessória em relação ao devedor, enquanto a obrigação do avalista é autônoma. A fiança seria um instituto de Direito Civil enquanto o aval é utilizado no direito cambial, tratado pelo Direito Empresarial.

Em se tratando dos efeitos que o aval e a fiança trazem para quem vive em união estável, pode-se dizer que os companheiros passam a partilhar de todo o patrimônio que vier a ser adquirido na constância da união estável. Assim, ao praticar qualquer um dos institutos, aval ou fiança, estará dispondo do patrimônio familiar.

4 OUTORGA UXÓRIA NO REGIME DE UNIÃO ESTÁVEL NA PRESTAÇÃO DE AVAL OU FIANÇA

A Constituição Federal equipara a união estável ao casamento, no entanto, por não existir na legislação brasileira previsão expressa que a outorga uxória é necessária, nos casos de aval ou fiança, em se tratando de união estável, grande discussão há sobre o tema.

Como dito, Código Civil em seu artigo 1725, dispõe que na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.

Assim, não existindo contrato escrito, os companheiros passam a partilhar todo o patrimônio (bens móveis e imóveis) adquirido na constância da união estável, razão pela qual se questiona a necessidade da outorga uxória ao praticar um dos institutos, aval ou fiança, pois se assim o fizer, estará dispondo do patrimônio que pertence ao casal.

O Código Civil em seu artigo 1647, inciso III, traz que exceto no regime de separação absoluta, nem um dos cônjuges pode sem autorização do outro prestar aval ou fiança.

Nesse sentido, Marilene Silveira Guimarães, citada por Maria Helena Diniz, afirma que:

“Deve exigir outorga de companheiro na alienação de imóvel adquirido onerosamente durante união estável, sob pena de anulabilidade, ou, até mesmo, um “registro de união estável” para que haja segurança nas negociações imobiliárias à terceiros de boa-fé e aos companheiros (artigo 4º e 5º, e por analogia o artigo 1647, CC).” (DINIZ, 2007)

Nas palavras de Luís Paulo Cotrim Guimarães (2003):

“A falta de autorização do outro convivente, como causa de pedir para a invalidade do ato praticado, haverá de ser considerada dentro de um contexto mais global, inserindo-se como elemento integrante do defeito do negocio efetivado com terceiro, não se trata, pois, de uma causa isolada, mas sim, integrada, já que diz respeito a uma fundamentação decisiva.” (GUIMARÃES, 2003 )

Ainda no raciocínio de Guimarães, o autor diz que a mera iniciativa de esconder que se vive em união estável, já se caracteriza como uma ação dolosa, tendo como intenção causar prejuízo alheio, caso haja alienação a terceiros de boa-fé.

É preciso analisar o caso concreto, uma vez que é tutelado o terceiro de boa-fé. Isso quer dizer que, caso o companheiro prejudicado prove que o terceiro, adquirente do imóvel, sabia da existência da união estável, tal alienação pode ser passível de anulação.

Outrora, o Superior Tribunal de Justiça diz que tal ato não é passível de anulação, visto que, sacrificaria a segurança jurídica assim como o prejuízo do credor. Súmula 332 do STJ: "A fiança prestada sem autorização de um dos cônjuges implica a ineficácia total da garantia". Observa-se uma contradição, onde o STJ diz que o ato não é anulável para a união estável, sendo aplicável tal súmula somente para quem é casado civilmente.

O importante é que, independente dos referidos posicionamentos, a preocupação se dá em fazer constar a ciência do companheiro nos atos em que há alienação dos bens que pertencem ao casal.

4.1 VALIDADE DO CONTRATO CELEBRADO SEM A OUTORGA UXÓRIA DO COMPANHEIRO PARA A PRESTAÇÃO DO AVAL OU FIANÇA

O objetivo da outorga uxória, consentimento de ambos os companheiros para o aval ou a fiança, é prevenir a dilapidação do patrimônio do casal por um dos conviventes. Isto é, caso um dos companheiros venha a prestar fiança ou aval, deverá obter a permissão do outro companheiro, para evitar futuros conflitos em uma eventual partilha, bem como preservar o terceiro de boa-fé envolvido.

Não há nada expresso no ordenamento jurídico brasileiro e tampouco uma definição doutrinária ou jurisprudencial, da obrigatoriedade ou não da outorga uxória nos casos de união estável, fato que traz grande dilema quanto a validade dos contratos celebrados por apenas um dos companheiros.

Isto se justifica pelo fato de que a união estável não é um ato jurídico formal no qual se tem a publicidade do estado civil dos contratantes, pois mesmo existindo uma escritura pública entres os conviventes, esta nem sempre relata o início e o termino da união, bem como não altera o estado civil dos mesmos. Assim, pertinente a discussão se é anulável ou não a fiança prestada por convivente em união estável.

Existindo o ato (aval ou fiança) sem o consentimento do cônjuge, ou seja, contrato celebrado sem a outorga uxória, poderá ser passível de anulação, desde que observado o prazo prescricional (2 anos) para a propositura da ação de anulabilidade, conforme preconiza o artigo 1649 do Código Civil.

Todavia, no caso da união estável, existe a dúvida quanto à extensão de tal sanção. Saber se referida ausência da outorga uxória invalida o ato jurídico, ainda é uma matéria que gera polêmica para a doutrina e jurisprudência. Nessa linha de raciocínio, Madaleno (2010) afirma que no casamento, se não houver a outorga uxória, o negócio não será consolidado. Mas na união estável, se não for declarado a sua existência e o terceiro estiver de boa-fé, o ato de disposição patrimonial será valido.

Em sentido oposto, Tartuce (2011), com base no artigo 5º da Lei 9278/96 e artigo 1725 do Código Civil, diz que, os bens adquiridos onerosamente durante a união estável, pertencem a ambos os companheiros de forma igualitária.

Analisando outro ponto, caso o terceiro, de boa-fé, tenha conhecimento de vínculo existente entre os companheiros, o mesmo deve exigir a anuência de ambos para que a alienação de bens tenha garantia plena.

Se a aplicação do artigo 1725 do CC é extensiva à união estável, sendo forma de entidade familiar, não pode sofrer limitações ou discriminações em comparação ao casamento civil, bem como, é válido dizer, que a união estável não pode gozar de privilégios processuais pelo fato de não ter regras específicas assim como o casamento civil.

4.1.1 Necessidade de Regulamentação

Tal matéria sempre foi acompanhada de incertezas e com isso foi reconhecida juridicamente como uma união de fato, posteriormente criando seus efeitos legais. A união estável busca se adaptar à evolução dos costumes e da sociedade; é reconhecida como entidade familiar, sendo uma situação fática decorrente do cotidiano.

Na prática, o Direito tem o dever de conciliar os efeitos legais de duas pessoas que se relacionam. A formação da união estável é livre e o legislador deve respeitar a liberdade pela qual optaram. Situação na qual é fundamental apara a resolução dos problemas existentes entre os próprios companheiros com terceiros.

Nesse sentido, é imprescindível uma normatização da união estável para que o julgador possa analisar o caso e buscar a solução mais justa. E por ter falta de regulamento, é um instituto frágil, pois os companheiros tomam suas decisões livremente sem a interferência do legislador.

É dever do Direito de Família cuidar dos efeitos que essas relações causam perante a sociedade e até mesmo ao Estado. É importante ter como base a redação da Constituição Federal que considera a união estável como uma entidade familiar.

4.2 POSICIONAMENTO DOUTRINÁRIO E JURISPRUDÊNCIAL SOBRE A OUTORGA UXÓRIA NO REGIME DE UNIÃO ESTÁVEL QUANDO UM DOS COMPANHEIROS PRESTAR AVAL OU FIANÇA  

É pacífico por boa parte da doutrina, a validade da fiança prestada por fiador em união estável, sem a anuência de seu companheiro. Em se tratando de jurisprudências, boa parte das decisões, dizem que não é nula nem anulável a fiança prestada por pessoa convivente em união estável sem a anuência de outro companheiro, assim entendendo a não incidência da Súmula 332 do STJ à união estável. Isso porque, O STJ entende que a fiança prestada sem a outorga do companheiro é válida, pelo fato de ser impossível ao credor saber se o fiador vive ou não em união estável com alguém.

Em primeira análise, tem-se como exemplo de inaplicabilidade da Súmula 332 do STJ que privilegia a boa-fé do terceiro:

“DIREITO CIVIL-CONSTITUCIONAL. DIREITO DE FAMÍLIA. CONTRATO DE LOCAÇÃO. FIANÇA. FIADORA QUE CONVIVIA EM UNIÃO ESTÁVEL. INEXISTÊNCIA DE OUTORGA UXÓRIA. DISPENSA. VALIDADE DA GARANTIA. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA N. 332/STJ. 1. Mostra-se de extrema relevância para a construção de uma jurisprudência consistente acerca da disciplina do casamento e da união estável saber, diante das naturais diferenças entre os dois institutos, quais os limites e possibilidades de tratamento jurídico diferenciado entre eles. 2. Toda e qualquer diferença entre casamento e união estável deve ser analisada a partir da dupla concepção do que seja casamento – por um lado, ato jurídico solene do qual decorre uma relação jurídica com efeitos tipificados pelo ordenamento jurídico, e, por outro, uma entidade familiar, dentre várias outras protegidas pela Constituição. 3. Assim, o casamento, tido por entidade familiar, não se difere em nenhum aspecto da união estável – também uma entidade familiar -, porquanto não há famílias timbradas como de "segunda classe" pela Constituição Federal de 1988, diferentemente do que ocorria nos diplomas constitucionais e legais superados. Apenas quando se analisa o casamento como ato jurídico formal e solene é que as diferenças entre este e a união estável se fazem visíveis, e somente em razão dessas diferenças entre casamento – ato jurídico – e união estável é que o tratamento legal ou jurisprudencial diferenciado se justifica. 4. A exigência de outorga uxória a determinados negócios jurídicos transita exatamente por este aspecto em que o tratamento diferenciado entre casamento e união estável é justificável. É por intermédio do ato jurídico cartorário e solene do casamento que se presume a publicidade do estado civil dos contratantes, de modo que, em sendo eles conviventes em união estável, hão de ser dispensadas as vênias conjugais para a concessão de fiança. 5. Desse modo, não é nula nem anulável a fiança prestada por fiador convivente em união estável sem a outorga uxória do outro companheiro. Não incidência da Súmula n. 332/STJ à união estável. 6. Recurso especial provido.”

Tal jurisprudência, em um primeiro ponto, diz que o casamento civil não se difere em nenhum momento da união estável. Mas ao decorrer de sua defesa, diz que são dois institutos diferentes no que se refere à alienação de bens. O que vale ressaltar é que, o que está sendo alienado é um bem que pertence a ambos os companheiros. É preciso analisar a boa-fé, e presente tal princípio, não há o que se falar em validade do contrato de alienação. 

Ainda nessa linha de raciocínio, Cahali (2002), em sua doutrina, diz que a união estável confere entre as partes um direito pessoal, no que tange aos bens adquiridos durante a relação, e não um direito real, assim, não existindo qualquer possibilidade de resultado de sequela.

Ademais, passa-se a análise de defesas a favor de anulação do ato sem o consentimento do companheiro:

“Processo: APC 20130110067310

Relator (a): GILBERTO PEREIRA DE OLIVEIRA

Julgamento: 29/04/2015

Órgão Julgador: 3ª Turma Cível

Publicação: Publicado no DJE: 07/05/2015. Pág. 222

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. DUPLO APELO. EMBARGOS DE TERCEIRO. UNIÃO ESTÁVEL. INCIDÊNCIA DO ART. 1.725 DO C.C. REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL DE BENS. CONTRATO LOCAÇÃO. FIADOR. OUTORGA UXÓRIA. NECESSIDADE. PENHORA ANULADA. BEM DE FAMÍLIA. IMPENHORABILIDADE. QUALIDADE DE ENTIDADE FAMILIAR. NÃO COMPROVADA.

ACÓRDÃO: conhecer e dar provimento, unânime.”

Analisando a jurisprudência acima citada, ficou claro que a fiadora não poderia prestar fiança sem a outorga uxória de seu companheiro, acarretando nulidade da fiança prestada, razão pela qual a constrição sob o imóvel deve ser desfeita. Vale ressaltar, também, que o imóvel que a fiadora alienou trata-se da única residência da família.

Diante do exposto, é necessário que se faça prova apta para comprovação da entidade familiar. A apelação dos embargantes foi conhecida e provida.

“Assim, a partir do reconhecimento da união estável como entidade familiar, as mesmas regras protetivas do casamento deverão lhes ser estendidas para salvaguardar o patrimônio do casal e os interesses dos terceiros de boa-fé. Contudo, mesmo considerando a outorga um dever imposto aos companheiros que vivem em união estável por força dos dispositivos legais acima transcritos e em virtude dos princípios protetivos da família, muitas vezes a necessidade dessa autorização não é respeitada, sobretudo pela conotação de informalidade característica deste tipo de relação. Por conta disso, a ausência de norma que regulamente essa sistemática gera situações conflituosas envolvendo os próprios companheiros e também terceiros, especialmente em razão da mencionada falta de publicidade que reveste estas uniões “de fato”.” (SANTA MARIA, 2010, p.24)

Contudo, pode-se dizer que a outorga uxória na união estável é necessária para a prestação tanto do aval quanto da fiança, sob pena de anulação do ato, com fulcro no artigo 5º da Lei 9.278/96 e artigo 1.725 do Código Civil, já mencionados anteriormente, no que tange à relação patrimonial entre os conviventes.

5 CONCLUSÃO

Conclui-se que a outorga uxória é de suma importância no regime de união estável quando há alienação de bens adquiridos conjuntamente. A conscientização deve ser clara caso um dos companheiros venha prestar aval ou fiança, assim não acarretando prejuízos ao companheiro ou terceiro de boa-fé.

Sua ampla utilização no meio social aponta para uma maior regulamentação legislativa, de forma que esse assunto não acarrete mais dúvidas nos processos judiciais.

Embora boa parte da doutrina e jurisprudência entenda que não há a necessidade de autorização de ambos os conviventes em união estável, existem os que defendem a ideia de que a união estável se compara com o casamento civil, tendo a mesma proteção jurídica quanto ao patrimônio familiar. Entendendo que há uma necessidade de maior regulamentação por ser um direito real e não simplesmente pessoal. 

Conclui-se também, que é necessária a outorga uxória, na união estável, para a prestação de aval ou fiança, visto que o patrimônio foi conquistado com esforço de ambos os conviventes durante a relação. E por ser considerada uma forma de entidade familiar, não poderá sofrer limitações em comparação ao casamento civil, ficando clara a necessidade de incidência da Súmula 332 do STJ.

É necessária uma maior regulamentação, assim não gerando situações conflituosas entre os companheiros e o terceiro de boa-fé, em especial no que tange a mencionada falta de publicidade. Não deve ser caracterizada válida a fiança ou o aval prestado sem a outorga uxória vez que o patrimônio pertence a ambos os conviventes.

 

Referências
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Informações Sobre os Autores

Gabrieli Lapazini

Acadêmica de Direito na Faculdade UNIVEL

Deisi Cardoso

Professora do Curso de Direito da UNIVEL – Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas de Cascavel


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