O curtir(no facebook) como razão jurídica (in)válida para a dispensa motivada do empregado e os parâmetros conceituais da liberdade de expressão

Resumo: A Sociedade Digital se qualifica por ser uma sociedade da informação. Assim, a liberdade de expressão deve prevalecer, a priori, pois entre outras razões é pressuposto para outros direitos fundamentais. Qual é a eventual legitimação legal que tem o empregador de impor um determinado comportamento ao empregado, restringindo ou mesmo impedindo a discussão de certos pontos de vista discordantes, que tangenciam sua honra e boa fama? A insuficiência de debate sobre uma questão controvertida somente conduz a outras controvérsias. Assim, um empregado que “curtiu” uma mensagem desabonadora à fama de seu empregador merece a dispensa por justa causa, fundamentada no art. 482, “K”, da CLT? A significação jurídica do “curtir” apresenta uma uniformidade hermenêutica que possa conduzir indubitavelmente à conclusão de que o autor do “curtir” se coloca favoravelmente à mensagem do autor do post no Facebook?

Palavras-chave: facebook, curtir, dispensa por justa causa, liberdade de expressão, marketplace of ideas.

Sumário: Introdução; 1. Da autonomia do (des)empregado; 2. Os limites do poder disciplinar do empregador e o curtir como razão jurídica (in)válida para a dispensa motivada do empregado.Conclusão. Referências.

Introdução

Quais os limites pelos quais é dado a outro intervir em nossa autonomia?

É possível conceber-se uma fundamentação argumentativa válida a justificar a intervenção de um terceiro na autonomia que é própria de um ser humano, pleno em seu desenvolvimento intelectual, de modo a determinar a maneira pela qual esse irá conduzir a si próprio, mesmo que sob a égide de um contrato de trabalho?

Qual a ética do empregador e os limites da autonomia do empregado? Autonomia do pensar, em sua espontaneidade humana, por menos construtiva que se mostre essa opinio, mas inerente à sua singularidade, encontra onde seus limites?

Um ponto de reflexão reside na legitimação legal que tem o empregador de impor um determinado comportamento ao empregado, restringindo ou mesmo impedindo a discussão de certos pontos de vista discordantes, que tangenciam honra e boa fama daquele, assim como do estabelecimento empresarial respectivo.

Portanto, o enfoque pretendido se mostra na inserção desses parâmetros à seara digital, evolvendo, nesse pormenor, aspectos específicos, quanto à utilização do facebook como meio de prova, e a atribuição de efeitos jurídicos ao ato de “curtir” um comentário na rede social.

1.Da autonomia do (des)empregado

Quais os limites pelos quais é dado a outro intervir em nossa autonomia[1]? Ou melhor, existe uma fundamentação argumentativa valida a justificar a intervenção de um terceiro na autonomia que é própria de um ser humano, pleno em seu desenvolvimento intelectual, de modo a determinar a maneira pela qual ele irá conduzir seu viver?

A influência a que se refere trata-se, evidentemente, da que concerne à intervenção de cunho pretensamente arbitrário, fora de um âmbito racional que possa justificar a verbalização voltada à defesa de uma ideia, ou postura condizente com a etiqueta ou a moral em um ambiente determinado (no caso presente, o ambiente laboral).

A questão em si, ao se ponderar, a partir de uma dimensão individual, e privada, já se mostra delicada.

A dramaticidade se apresenta em toda a sua acepção, ao se inserir nesse debate a figura do empregador, contextualizado em uma relação empregatícia, visto que envolve um imperativo de autoridade hierárquica.

Mal comparando o convencimento, como dizia Arthur Shopenhauer (2003, p. 40), a fé como o amor, não se conquista pela força. Fazendo as devidas adaptações, diria o mesmo em relação ao convencimento. Que assim como a fé e o amor, não se prestam à violência (moral ou física). 

Um ponto de reflexão reside na legitimação de uma pessoa física ou jurídica de impor uma determinada concepção de vida. Digo impor no sentido de se restringir ou mesmo impedir a discussão de certos pontos de vista discordantes.

Trata-se de um juízo de valor totalitário, na medida em que se pauta somente em uma visão de mundo que seja familiar a esses dirigentes. Ao revés, afastando qualquer pensamento divergente dessa realidade.

As pessoas são muitas. A independência individual de cair no erro e voltar a errar, para então acertar, parece, desse modo, ser amputada de nosso patrimônio existencial.

Como se fazer humano e não autômato se não for da forma própria de nossa natureza curiosa que nos leva a optar pela opção errada.

Já disse Riobaldo, nas linhas de Guimarães Rosa (2006, p. 39):

“O senhor… Mire veja: o mais importante e bonito, do mundo é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas –  mas que elas vão sempre mudando. Afinam ou desafinam. Verdade maior”.

Fica a reflexão: como desenvolver uma consciência moral, se, cada vez mais, fecham-se as portas, as quais se têm de passar, para se evoluir em juízos críticos, optando-se pelo certo ou pelo errado, para ir além.

A ausência de escolha livre e com independência mata a consciência moral, na medida em que não existe liberdade para o crescimento. Cada vez mais, a sociedade se torna mais policiada, em todos os seus meandros, apontando para uma concepção de vida pavimentada pela força.

Trata-se do apostar na falência da moral e na necessidade de tutelar o cidadão em todas as suas dimensões. Assim, a regulamentação pari passu combina com a desconfiança progressivamente absoluta.

Como defender, portanto, a minha verdade. Como me formar como ser humano, a partir da afinação de meu discurso, se tudo o que me é dado é somente o devido, sob a tutela dos que sabem mais do que eu, sob o ponto de vista deles.

Até que ponto,muito mal comparando, a minha intimidade (necessariamente recatada) no banheiro já não está exposta? Temo que logo mais na esquina surja uma concepção politicamente correta de como bem limpar o traseiro, imposta a todos por razões de profilaxia social, higienicamente imposta por um especialista governamental.

Se todos estão olhando o tempo todo, como sei quem eu sou, ou se sou o que os outros querem eu seja?Como transcender a minha natureza anímica para poder serhumano?

Há necessidade de um limite entre as ideias e condutas socialmente aceitas e impostas como regras, das convicções pessoais. A preservação de nossa independência individual frente às opiniões coletivas é fundamental à preservação do Estado Democrático e o combate ao “despotismo político” [2].

Parece-me que mais benfazejo, por parte do Estado, seja estimular o livre câmbio de ideias, o que por si é fundamental à construção da dimensão social e individual de cada ser humano. E mais além, propugnar pela tolerância.

A profunda tolerância em relação àqueles com que não concordamos, como política de Estado, é a base ética sob a qual é possível lavrar campo fértil para o debate.

Toda essa problemática insere-se, de uma forma mais delicada, no campo laboral, envolvendo, nesse pormenor, aspectos do direito digital, quanto à utilização do Facebook como meio de prova e osefeitos jurídicos ao ato de “curtir” um comentário na rede social.

2.Os limites do poder disciplinar do empregador e o curtir como razão jurídica (in)válida para a dispensa (i)motivada do empregado

Como gênero, a relação de trabalho apresenta-se como um conceito mais amplo que a relação de emprego, abarcando-a, portanto.

Desse modo, a relação de trabalho “constitui o gênero da prestação de serviços, do qual se originam várias espécies” (JÚNIOR, 2012, p. 141). Portanto, sempre “que o trabalho for prestado por uma pessoa em proveito de outra, sendo esse trabalho de meio ou de resultado, haverá uma relação de trabalho lato sensu” (JÚNIOR, 2012, p. 141). Assim, da relação de trabalho advém o trabalho autônomo, eventual, avulso etc.

Já a relação de emprego “trata do trabalho subordinado, do empregado em relação ao empregador” (MARTINS, 2002, p. 90).

Nesse sentido, o art. 442 da Consolidação das Leis do Trabalho estabelece que: “Contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego”.

Assim, o contrato de trabalho figura como gênero, abarcando, portanto, o contrato (relação) de emprego. Esse, por seu turno, “diz respeito à relação entre empregado e empregador e não a outro tipo de trabalhador” (MARTINS, 2002, p. 90).

Quanto à figura do empregado, a sua importância reside na constatação de que “é ele o destinatário das normas protetoras que constituem este Direito. Daí a conveniência de um estudo mais particularizado a esse respeito” (GOMES; GOTTSCHALK, 2004, p. 68).

O cerne da polêmica se mostra na análise do poder de direção do empregador, no contexto da regulação do Estado às relações capitalistas.

Assim, por “ser o dono do empreendimento e correr o risco do negócio, o empregador tem o poder diretivo do contrato de trabalho, podendo variar algumas cláusulas contratuais de acordo com a tendência econômica ou interesse da empresa” (CASSAR, 2014, p. 247).

A partir do Poder de Direção emana o chamado Poder Disciplinar do empregador. Assim, tal poder “traduz‑se no poder que tem o patrão de impor punições aos empregados” (CASSAR, 2014, p. 295).

A questão gira em torno da indefinição de limites onde acaba a relação jurídica e onde começa uma relação moral. Assim, em um ambiente externo ao da prestação do serviço, há subordinação entre empregado e empregador?[3]

Nesse sentido, se o empregador ordena e você se coloca na posição de não recusar a ordem, por imperativos de várias naturezas (visto que são insondáveis), estará incorrendo em uma relação de comando e obediência, renunciando sua autonomia privada?[4]

Dentro dessa ótica, ou seja, a dificuldade de regulação externa do arbítrio (e até a dificuldade de regulação interna do arbítrio), o Estado não se apresenta como ente neutro. Ele regula a relação entre o capital e trabalho, a partir de um viés ideológico (a organização política da Sociedade- intervém na economia – para garantir a relação de produção).

A significação jurídica do Sistema Capitalista como “o direito de ser legalmente explorado”, com registro na CTPS, e “o direito de legalmente explorar”, mediante paga de salários; figura, fora de um o viés marxista, com conotação pejorativa. No entanto, valer-se de eufemismos não muda a realidade econômica (sem esquecer o disciplinamento Constitucional da quaestio, como se pode verificar do art. 170 da CF[5]).

Explica-se que como o capital apresenta uma racionalidade sistêmica que prescinde de identidades culturais (“o capital não tem nome tem cheiro”), o Estado, juridicamente organizado, tende a aplicar o chamado “Estado de Exceção” quando há risco do capital se volatizar.

Nesse particular, uma interessante discussão reside na suposta suspensão das garantias trabalhistas durante a Copa, adotando-se como discurso oficial o discurso da FIFA.Ora, não questionar esse sistema de coisas trata-se da filosofia do Peru, que nos adverte Tobias Barreto[6].

No entanto, tal discussão, no presente trabalho, serve como pano de fundo, e exigirá em seu devido tempo, reflexão muito mais aquilatada. Por agora, importante pontuar a presença desse fenômeno contextual, que se coloca como catalisador da deterioração das bases normativas do Direito Laboral, instando soluções pragmáticas voltadas à manutenção da atividade econômicas, sem maiores questionamentos de matriz axiológica.

Desse modo, retornando ao ambiente digital e as relações de trabalho propriamente ditas, a grande questão que se apresenta aqui é como agir, de modo geral, e mais especificamente, considerando as interações inerentes à seara trabalhista, sem afrontar os limites preceituados pela Constituição Federal e as demais leis subjacentes, como a própria CLT, considerando os enunciados normativos emanados do Direito Digital, do Direito do Trabalho e do Direito Constitucional.

Nesse passo, a Constituição Federal de 1988, ao tratar dos direitos individuais, em seu artigo 5º, inciso IV[7], assegura a liberdade de manifestação do pensamento. Por sua vez, no art. 5º, inciso XII[8]determina ser inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas e de dados assim como as comunicações telefônicas; ressalvando, nesse último caso, por determinação judicial e conforme a lei estabelece, para fins de investigação criminal ou instrução processual penal, o acesso a tais dados[9].

Desse modo, tem-se que o e-mail corporativo, oferecido pelo empregador é passível de fiscalização por parte deste[10].Assim, em se demonstrando, a partir desse meio de prova, que houve, por parte do empregado, qualquer comportamento descrito no art. 482 da CLT, em tese, a rescisão do contrato por justa causa é possível.

No entanto,o e-mail pessoal não está adstrito a tal ação disciplinar do empregador. Analogicamente, a proteção constitucional estende-se ao tal derivação digital, na teleologia de se proteger a intimidade do trabalhador.

O Facebook vai na mesma linha. Assim, a informação lá veiculada tem destinatários certos, apesar de muitas vezes ser de acesso irrestrito por terceiros, que reverberam as mensagens postadas.

E se o comentário maldoso lançado fosse feito, à meia voz, por exemplo, na mesa de um bar, onde uma mesa, sob a qual uma cerveja aberta, ladeada por dois copos vazios, ornava os dois amigos (o empregado e o desempregado), frente a frente, em suas respectivas cadeiras, numa tarde de sexta-feira. O empregado diria qualquer coisa de desabonador ao ex-patrão, e o empregado nada iria, mais balançaria afirmativamente sua cabeça (por aprovação efetivamente ou por solidariedade possivelmente). E, que por razões, que a própria razão desconhece, viesse ao conhecimento do patrão, o teor da conversa e a circunstância em que essa ocorreu.

Ora, com as mensuras devidas, portanto, o âmbito das manifestações deve ser amplo, dentro da Teoria do Marketplace of ideas (não se chegando ao ponto, portanto, de sustentar o direito de se veicular mentiras na rede de computadores).

Assim, como justificar a demissão por justa causa, com fundamento no art. 482, letra “K” da CLT, valendo-se como meio de prova, de dados do Facebook[11].

E mais, no caso em pauta, as afirmações em si não foram o motivo preponderante, mas o “curtir” do empregado internauta amigo do malsinado empregado demitido, que se valeu do Facebook para lamber suas feridas, motivou a rescisão do contrato de trabalho[12].

A fluidez dos conceitos coloca em xeque tanto o elemento objetivo da justa causa, ou seja, a exata tipificação do ato praticado pelo empregado no preceito legal, assim como gravidade do ato praticado, quanto ao postar o “curtir”, como apto a abalar a fidúcia inerente à relação de emprego. Assim como, de outra parte, o elemento subjetivo, no sentido da clara intenção do empregado de “ferir a honra e a boa fama do empregador ou superiores hierárquicos […]” (MARTINS, 2014, p. 130).

Nesse ponto, portanto, os diversos parâmetros dessa discussão se encontram. A preservação da intimidade do trabalhador, que no caso já havia sido demitido; os limites do poder disciplinar do empregador[13], e a liberdade de expressão de todos os empregados demitidos (a se considerar, o âmbito de abrangência da conversa veiculada no Facebook, como, talvez, confidência entre amigos no ambiente digital) e, finalmente, a real intenção veiculada pelo ato de “curtir” uma mensagem veiculada pelo Facebook.

Assim, é imperioso partir do pressuposto de que o “curtir” tem uma acepção voltada à satisfação pessoal e anuência com a mensagem veiculada. Esse pormenor, no entanto, não está indene de elucubrações, havendo quem defenda que a significação do “curtir” se esgota na manifestação de solidariedade com o emissor da mensagem.

Ora, se Sociedade Digital se qualifica por ser uma sociedade da informação, pois se trata de “uma sociedade de serviços em que a posse da informação prevalece sobre a posse dos bens de produção” (PINHEIRO, 2009, p. 40), que melhor cenário há para se defender a Teoria do Marketplace of ideas.

Portanto, essa “característica faz com que a proteção do Direito à Informação seja um dos princípios basilares do Direito Digital, assim como a proteção de seu contradireito, ou seja, do Direito à não-Informação” (PINHEIRO, 2009, p. 40).

Dessa forma, no caso em pauta, existe ainda a possibilidade de se apontar para o Princípio da Proteção do Trabalhador, princípio basilar que emana do Direito do Trabalho a fundamentar o que se está por se preceituar.

No entanto, o enfoque que avulta, apresenta-se, a partir da prevalência do benefício da dúvida[14] em homenagem à livre expressão das ideias (ainda que no caso se esteja a tratar de uma questão afeta à honra e boa fama do empregador, quanto ao emissor da mensagem referida), em detrimento de uma sanção tal qual que se mostre restritiva de qualquer expressão, como o “cala boca” da demissão com justa causa, ainda mais pelo talvez insensato “curtir” em um comentário carente, acredito, de maior significação apofântica (por carecer de credibilidade, já que emana de um empregado demitido).

De outro giro, a reação do empregador, voltada a desmentir os comentários maldosos, valendo-se, para tal expediente, de argumentos com uma maior qualidade semântica, representaria uma resposta adequada a tal postura belicosa, por parte do ex-empregado, até porque o mesmo já havia sido demitido.

A verdade prepondera sobre a mentira e a resposta cortês a um comentário mal educado, revela maior apuro do espírito, e granjeia respeito de todos os que tomam conhecimento do ocorrido, o que gera credibilidade da empresa perante todos os clientes e demais empregados.

A insuficiência de debate sobre uma questão controvertida somente conduz a outras controvérsias (eventualmente uma eventual ação civil de reparação de danos, com fulcro no art. 5º, V da Constituição Federal, poderia se mostrar também adequada, a fim de se garantir o contraditório)[15].

Com relação ao empregado que “curtiu” a referida mensagem, existe uma insegurança semântica inerente a tal comportamento.

A reação do empregador em relação a um empregado, em valer-se de um fundamento legal inerente à conduta de terceira pessoa (não mais pertencente aos quadros da empresa), que por extensão, tem sua abrangência configurada no descumprimento do referido preceito legal, a partir de uma interpretação duvidosa de sua conduta (o “curtir” do empregado), fora do ambiente de trabalho, em um âmbito pretensamente estrito, ao menos não deliberadamente, público, destoa dos preceitos inerentes a um ambiente democrático, e se mostra exagerada, ao se apontar para a proporcionalidade que poderia nortear a aplicação de uma eventual reprimenda.

Além disso, a significação jurídica do “curtir” mostra-se no mínimo plurívoca, não se podendo concluir que sempre caminha para a mesma direção apontada pelo post.

Assim, levando-se em consideração a principiologia inerente ao Direito Laboral, notadamente o princípio da proteção do trabalhador, em sua vertente do in dubio pro operario, não se mostra balizada, também por falta de proporcionalidade, uma demissão por justa causa, tendo como fundamento, unicamente a quebra de fidúcia advinda da pretensa natureza ofensiva do argumento que se lança mão, vinculado pelo caractere “curtir”, sem outros esclarecimentos que pudessem evidenciar a vontade do empregado em ofender a honra ou a boa fama do empregador[16].

Conclusão

A Sociedade Digital se qualifica por ser uma sociedade da informação. O Estado Democrático se pavimenta pelo livre trânsito das ideias. E, nesse pormenor, não se questiona a qualidade dessas ideias. Muitas vezes desprezíveis, outras, alvissareiras. Fato é que pelo debate amplo desse conjunto pluriforme de visões de mundo, o amálgama de um mundo melhor ganha corpo.

Temos para nós, que a liberdade de expressão deve prevalecer, a priori, pois entre outras razões é pressuposto para outros direitos fundamentais. Apesar de não ser dado a ninguém o direito de praticar ofensas injuriosas, ou veicular mentiras na rede mundial de computadores, o ônus argumentativo deve recair aos que se opõem ao livre câmbio das ideias (independentemente da qualidade dessas, beirando, em alguns casos o discurso de ódio, ou a desqualificação, muitas vezes rancorosa, de ideias).

Questão polêmica reside, portanto, na qualificação do que se possa admitir como justificativa à limitação do direito de livre expressão de qualquer um que se disponha a expressar-se.

O empregado, a priori, insere-se nesse juízo, portanto.

Nessa seara, a questão relacionada à subordinação do empregado ao empregador e a abrangência do poder disciplinar do segundo em relação ao primeiro avulta.

Nesse sentido, tem-se a dizer que a abrangência do direito de livre expressão das ideias deve ser orientada pelos parâmetros constitucionais, já partindo de uma métrica que leve em conta a subordinação objetiva, além do ambiente físico da prestação do serviço, cogitando-se ao ambiente virtual, na medida em que a questão se exemplifica pelo exercício da liberdade de expressão na emissão de uma opinião contrária ao empregador.

De maneira mais específica, a utilização do Facebook pelo empregado, como instrumento propagador de uma opinião que possa ensejar ato ofensivo da honra ou da boa fama do empregador, cirurgicamente veiculado pelo “curtir” (na medida em que o empregado em questão não fora o autor propriamente do referido comentário); não pode dar ensejo à despedida motivada desse empregado, pura e simplesmente.

Nesse sentido, a questão que se quer evidenciar passa pela definição jurídica do “curtir”, que necessita de um aprofundamento teórico e circunstancial, de modo a se delimitar satisfatoriamente a sua significação.

Somente após esse aprofundamento dogmático e pragmático é possível se partir de um sentido, que aponte para a anuência com o comentário expedido por um terceiro, na rede social; ou, simplesmente, denote solidariedade com o emissor da mensagem, não significando, realmente, concordância com o teor da malsinada mensagem.

Ademais, como referido exaustivamente, a restrição, de qualquer forma, à liberdade de expressão, em si representa uma retrocesso ao processo civilizatório, na medida em que o livre câmbio das ideias é fundamento para a evolução da sociedade e aprofundamento do debate democrático.

Como já referido, o ônus argumentativo no sentido da censurar um argumento (por mais pueril que seja), deve recair sobre os que se opõem ao livre câmbio das ideias; e não sobre os que defendem a liberdade e expressão responsável, como instrumento da celebração da racionalidade humana, por mais irracional que às vezes se apresente.

Finalmente, sempre é possível combater os maus argumentos com boas razões, e sempre haverá, em uma ordem democrática, pavimentada pelo Estado de Direito, espaço para o direito de resposta simétrico.

Muito mais se precisa desse remédio, aliás, quando se traz à baila a relação empregatícia, quesingularmente se exprime como locus específico do capital, da dominação econômica e da relação jurídica assimétrica entre empregado e empregador.A fluidez dos conceitos nesse campo sempre aponta, engatilhada pelo empregador ofendido, a arma do benefício da dúvida,no peito do empregado balbuciante, denunciado pelo obscuro “curtir”, inconsequentemente lançado, na sala digital do Facebook.

Referências
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BITTAR, Eduardo C. B.; ALMEIDA, Guilherme Assis. Curso de Filosofia do Direito. 7ª ed. São Paulo: Editora Atlas, 2009.
CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. 9ª ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014.
CONJUR.TRT-15 considera válida demissão por justa causa por ‘curtida’ no Facebook. 29 jun. 2015, disponível em: <http://www.conjur.com.br/2015-jun-29/trt-15-considera-valida-justa-causa-curtida-facebook>. Acesso, 3 jul. 2015.
CONJUR. Mensagem na internet durante aviso prévio não autoriza dispensa por justa causa. 13 set. 2013, disponível em http://www.conjur.com.br/2014-set-13/mensagem-internet-durante-aviso-previo-nao-autoriza-justa-causa. Acesso, 3 jul. 2015.
GOMES, Orlando; GOTTSCHALK, Elson, Curso de Direito do Trabalho. 16ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004.
MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 15ª ed. São Paulo: Editora Atlas, 2002.
______________________ . Curso de Direito do Trabalho, 6ª ed. São Paulo: Editora Atlas, 2014.
MARTINS, Jomar.Comentário ofensivo no Facebook justifica demissão. CONJUR, 08 jul. 2013, disponível em: <http://www.conjur.com.br/2013-jul-08/comentario-ofensivo-facebook-quebra-confianca-permite-demissao>. Acesso, 03 jul. 2015.
PINHEIRO, Patrícia Peck. Direito Digital. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
JÚNIOR. José Cairo. Curso de Direito do Trabalho. 7ª ed. Salvador: Editora Juspodivm, 2012.
RAWLS, John. Lectures on the History of Political Philosophy, Cambridge, Massachusetts, and London, England: The Belknap Press of Harvard University Press, 2008.
ROSA, Guimarães. Grande Sertão: Veredas.Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2006.
SCHOPENHAUER, Arthur. A Arte de Insultar. Org e ensaio de Franco Volpi, São Paulo: Malheiros, 2003.
 
Notas:
[1] “A liberdade está indistintamente ligada à noção de autonomia. A autonomia da vontade no agir de acordo com a máxima de vida gerada pelo imperativo categórico são pontos fortes e altos do sistema ético kantiano. Em consonância com esses pontos de apoio do sistema kantiano, o homem figura como ser racional, fim em si mesmo, e a humanidade, a mesma dimensão, deverá figurar, em suas relações, sempre como fim e nunca como mediação”. (BITTAR, Eduardo C. B.; ALMEIDA, Guilherme Assis. Curso de Filosofia do Direito. São Paulo: Editora Atlas. 7ª ed, p.310).

[2] Como já explicou John Rawls, certa feita, ao comentar as ideias de Stuart Mill: “2. Note, however, that Mill is equally concerned with ‘the tyranny of the prevailing opinion and feeling, the tendency of society to impose, by other means than civil penalties, its own ideas and practices as rules of conduct on those who dissent from them; to fetter the development of any individuality not in harmony with its ways . There is a limit to the legitimate interference of collective opinion with individual independence; and to find that limit, and maintain it against encroachment, is as indispensable to a good condition of human affairs, as protection against political despotism’ (RAWLS, John. Lectures on the History of Political Philosophy, Cambridge, Massachusetts, and London, England: The Belknap Press of Harvard University Press, 2008, pp. 284 e 285)”.

[3] Não se olvidou nesse texto a noção de subordinação objetiva. Tem-se claro que a subordinação subjetiva não se insere no contexto da discussão que se quer entabular. Assim, a subordinação enfocada na seara trabalhista é a ligada ao contrato de trabalho. Afora essa relação jurídica não existe poder do empregador sobre o empregado. Ao menos teoricamente essa noção de poder encontra-se devidamente delineada. No entanto, como se quer apresentar à reflexão, os limites da relação empregatícia não se mostram tão claramente delineados, ao se abstrair o ambiente de trabalho físico e se inserir a seara digital, que se manifesta no ambiente virtual.

[4] “Aí vai a grande diferença entre moralidade e juridicidade de uma ação. Ademais, a moralidade pressupõe autonomia, liberdade, dever e autoconvencimento; a juridicidade pressupõe coercitividade” (BITTAR, Eduardo C. B.; ALMEIDA, Guilherme Assis. Curso de Filosofia do Direito. São Paulo: Editora Atlas. 7ª ed, p. 314).

[5] Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
I – soberania nacional;
II – propriedade privada;
III – função social da propriedade;
IV – livre concorrência;
V – defesa do consumidor;
VI – defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)
VII – redução das desigualdades regionais e sociais;
VIII – busca do pleno emprego;
IX – tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 6, de 1995)
Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.

[6] BARRETO, Tobias. Filosofia do Peru e Outros Escritos. São Paulo: Barcarolla, 2004, passim.

[7] Art. 5º. […] IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato.

[8]Art. 5º. […] XII – é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;

[9] Não se olvide que os excessos no exercício da liberdade de expressão serão punidos, estabelecendo a CF, em seu art. 5º, V que: “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”.

[10] EMENTA: JUSTA CAUSA. Demonstrado por mensagens do sistema de email corporativo que a reclamante, atendente telefônica, de forma reiterada, descumpria ordens gerais da empresa (indisciplina) e trabalhava com extrema desídia, realizando a chamada operação ‘tartaruga', desligando unilateralmente o telefone e desrespeitando os clientes da empresta tomadora, impõe-se ratificar a justa causa aplicada. Outrossim, disponibilizado o sistema como instrumento de trabalho pela empresa, é legítima a utilização das mensagens como prova, não restando violado o art. 5º, X, XII e LVI, da CF. Precedentes. (Processo: 00708-2007-014-10-00-3 ROPS; 1ª Turma; Juiz(a) Relator: RICARDO ALENCAR MACHADO; Julgado em: 28/11/2007; Publicado em: 07/12/2007)

[11] Interessante apontar várias nuances, que por falta de espaço, já que o enfoque é bem delimitado poderiam passar despercebidas, quanto se pretenda uma abordagem de viés mais aprofundada. Assim, por exemplo: “ […]À fl. 65 consta a Comunicação de Demissão e, à fl. 67 e ss, a publicação de uma manifestação do Reclamante no Facebook referente a sua insatisfação de ter que trabalhar até o último dia do ano. A justa causa constituída de ato lesivo da honra e boa fama praticado pelo empregado é o tipo que não se configura pela repetição de atos, ou seja, pela soma de faltas leves; é uma espécie de falta que deve ser grave o suficiente para ensejar a punição máxima do contrato. O Autor publicou em rede social manifestação na qual referia-se ao seu empregador como 'uma empresa de merda…que não valoriza os funcionários e ainda obriga a trabalhar até o último dia do ano'. A ninguém é dado o direito de ofensas injuriosas. O ato cometido pelo Autor é fruto de desatino e demonstra momento de desequilíbrio social; é ofensivo, baixo e covarde. Não há qualquer dúvida sobre a necessidade de sanção ao Autor por seu ato. Tratando-se, porém, de ato único, impõe-se o seu estudo acerca da gravidade suficiente para ensejar, por esse ato, a sanção máxima do contrato, tal qual aplicada pela Ré. O conceito de gravidade é relativo quando se lida com o ser humano. Já destacou Evaristo de Moraes Filho que a falta do empregado deve ser analisada in concreto para aplicação da respectiva penalidade proporcional, ou seja, deve-se levar em conta não só a medida padrão (o bonus pater familias), como também, assim diz o Autor citado, 'a personalidade do agente, suas condições psicológicas, sua capacidade de discernimento, e assim por diante'. Enfim, não se pode avaliar a gravidade do ato faltoso sem que se leve em conta a idiossincrasia do trabalhador. Délio Maranhão cita nas Instituições do Direito do Trabalho (com Arnaldo Süssekindi et al, LTR 1993) que 'a falta pode ser grave, mas pode, em relação aos méritos particulares do empregado e a uma prestação do trabalho laboriosa e honesta, perder seu caráter de gravidade'. Conceitualmente ainda se pode ponderar que o tipo faltoso no qual se inseriu o ato do Autor (alínea k do artigo 482 da CLT), sob análise concreta, suscita hipótese em que a relação contratual seja impedida de continuar pelo ato lesivo, grave o bastante para a ruptura total de fidelidade e confiança presente entre as partes do contrato. De volta ao caso, que ora se examina, tem-se presente que o trabalhador, que, sem qualquer histórico faltoso em seu contrato, comete o desatino de publicar em rede social um protesto que contempla palavras baixas e ofensivas ao seu empregador. Rede social (facebook) nos dias atuais, é um grande salão de conversa. Não se pode dizer que se trata de manifestação dirigida unicamente aos amigos do Autor, porque sua publicação foi aberta. É uma conversa em voz alta, parecida com aquela que, ainda que não se cite o nome do ofendido, deixa-se bem claro de quem se trata. Nessa roda de conversa sempre há um delator que vai chamar o ofendido para ouvir o que se está dizendo a seu respeito. A lesão à honra e boa fama da Ré, porém, haveria de ser algo de destaque irrefutável na manifestação do Autor. Como na sua publicação – ela própria aponta – a indignação do trabalhador originou-se do fato de ter sido ele convocado para trabalhar no último dia do ano, não se estabelece concretamente a gravidade da falta sugerida. Ainda que não esteja em jogo a exceção da verdade (somente ofensas físicas legitimam a defesa própria), as razões da manifestação impensada conduzem o ato a uma absoluta revelação de fúria e desatino pessoal. Sob nenhum ângulo se pode dizer que a honra de uma empresa tenha sido ferida por convocar um trabalhador ao seu exercício legítimo de tarefas contratuais, especialmente na hipótese da atividade empresarial da Ré (venda de bebidas), que tem nessa data um ápice de vendas. Ou seja, a publicação bestial do Autor nada mais revela do que sua própria falta de educação e polidez perante seu empregador e seus colegas de trabalho. Essa falta, assim analisada, em concreto, não encontra gravidade bastante para impedir a continuação de um contrato de trabalho de três anos e meio, sem histórico de faltas, por ato de ofensa à honra da empresa. A punição de dispensa por justa causa, ao cabo de tudo foi excessiva. Anula-se, assim, o ato, e considera-se o contrato extinto por dispensa imotivada. Devidas, ao Autor, as seguintes parcelas: aviso prévio proporcional, férias proporcionais com 1/3, 13º salário proporcional, FGTS sobre o aviso prévio, acréscimo de 40% sobre o FGTS. O pedido é procedente. (Juiz do Trabalho: Paulo André de França Cordovil) […] ( AIRR – 1580-45.2012.5.24.0004 , Relator Desembargador Convocado: Tarcísio Régis Valente, Data de Julgamento: 10/06/2015, 5ª Turma, Data de Publicação: DEJT 19/06/2015).
[12] CONJUR, TRT-15 considera válida demissão por justa causa por ‘curtida’ no Facebook.  29 jun. 2015, disponível em: <http://www.conjur.com.br/2015-jun-29/trt-15-considera-valida-justa-causa-curtida-facebook>. Acesso, 3 jul. 2015.

[13] Questão que se aventa, no caso em pauta, é saber-se como o empregador teve acesso aos comentários referidos, publicados no Facebook do empregado originariamente demitido, pelo empregado posteriormente demitido.

[14] Visto que a diferença entre “ofender” e “se ofender”, demanda uma investigação hermenêutica acurada.

[15] No entanto, há que considerar que esse não vem sendo o posicionamento adotado pelos Tribunais trabalhistas. Assim, v.g.: MARTINS, Jomar. Comentário ofensivo no Facebook justifica demissão. CONJUR, 08 jul. 2013, disponível em: <http://www.conjur.com.br/2013-jul-08/comentario-ofensivo-facebook-quebra-confianca-permite-demissao>. Acesso, 03 jul. 2015. Porém, nem sempre: CONJUR. Mensagem na internet durante aviso prévio não autoriza dispensa por justa causa. 13 set. 2013, disponível em http://www.conjur.com.br/2014-set-13/mensagem-internet-durante-aviso-previo-nao-autoriza-justa-causa. Acesso, 3 jul. 2015.

[16] Em abono a tal modo de pensar, Sérgio Pinto Martins explica que: “O juiz deverá examinar os vários elementos caracterizadores da falta grave, como a intenção do empregado, o ambiente, a sua escolaridade e principalmente a gravidade de tais acusações. Há necessidade de que os atos em comentários sejam divulgados. A legítima defesa, própria ou de outrem, excluirá a justa causa” (MARTINS, Sérgio Pinto. Curso de Direito do Trabalho, 6ª ed. São Paulo: Editora Atlas, 2014, p. 131).


Informações Sobre o Autor

Alexandre Gazetta Simões

Mestrando em Teoria do Direito e do Estado pelo Centro Universitário Eurípedes de Marília (UNIVEM). Pós-graduado, com Especialização em Gestão de Cidades (UNOPEC). Direito Constitucional (UNISUL). Direito Constitucional (FAESO). Direito Civil e Processo Civil (FACULDADE MARECHAL RONDON). Direito Tributário (UNAMA). graduado em Direito (ITE-BAURU. Analista Judiciário Federal – TRF3. Professor de graduação de Direito na Associação Educacional do Vale do Jurumirim (EDUVALE AVARÉ). Membro do Conselho Editorial da Revista de Direito do Instituto Palatino. Membro do Conselho Editorial da Revista Acadêmica de Ciências Jurídicas da Faculdade Eduvale Avaré. – Ethos Jus. Co-autor da obra “Ativismo Judicial – Paradigmas Atuais” (2011) Letras Jurídicas. Co-Organizador da obra “Ensaios Sobre a História e a Teoria do Direito Social” (2012) Letras Jurídicas


O curtir (no facebook) como razão jurídica (in)válida para a dispensa motivada do empregado e os parâmetros conceituais da liberdade de expressão

Resumo: A Sociedade Digital se qualifica por ser uma sociedade da informação. Assim, a liberdade de expressão deve prevalecer, a priori, pois entre outras razões é pressuposto para outros direitos fundamentais. Qual é a eventual legitimação legal que tem o empregador de impor um determinado comportamento ao empregado, restringindo ou mesmo impedindo a discussão de certos pontos de vista discordantes, que tangenciam sua honra e boa fama? A insuficiência de debate sobre uma questão controvertida somente conduz a outras controvérsias. Assim, um empregado que “curtiu” uma mensagem desabonadora à fama de seu empregador merece a dispensa por justa causa, fundamentada no art. 482, “K”, da CLT? A significação jurídica do “curtir” apresenta uma uniformidade hermenêutica que possa conduzir indubitavelmente à conclusão que o autor do “curtir” se coloca favoravelmente à mensagem do autor do post no facebook?

Palavras-chave: facebook, curtir, dispensa por justa causa, liberdade de expressão, marketplace of ideas.

Sumário: Introdução; 1. Da autonomia do (des)empregado; 2. Os limites do poder disciplinar do empregador e o curtir como razão jurídica (in)válida para a dispensa motivada do empregado; Conclusão; Referências.

Introdução

Quais os limites pelos quais é dado a outro intervir em nossa autonomia?

É possível conceber-se uma fundamentação argumentativa válida a justificar a intervenção de um terceiro na autonomia que é própria de um ser humano, pleno em seu desenvolvimento intelectual, de modo a determinar a maneira pela qual esse irá conduzir a si próprio, mesmo que sob a égide de um contrato de trabalho?

Qual a ética do empregador e os limites da autonomia do empregado? Autonomia do pensar, em sua espontaneidade humana, por menos construtiva que se mostre essa opinio, mas inerente à sua singularidade encontra onde seus limites?

Um ponto de reflexão reside na legitimação legal que tem o empregador de impor um determinado comportamento ao empregado, restringindo ou mesmo impedindo a discussão de certos pontos de vista discordantes, que tangenciam honra e boa fama daquele, assim como do estabelecimento empresarial respectivo.

Portanto, o enfoque pretendido se mostra na inserção desses parâmetros à seara digital, evolvendo, nesse pormenor, aspectos específicos, quanto à utilização do facebook como meio de prova, e a atribuição de efeitos jurídicos ao ato de “curtir” um comentário na rede social.

1. Da autonomia do (des)empregado

Quais os limites pelos quais é dado a outro intervir em nossa autonomia[1]? Ou melhor, existe uma fundamentação argumentativa valida a justificar a intervenção de um terceiro na autonomia que é própria de um ser humano, pleno em seu desenvolvimento intelectual, de modo a determinar a maneira pela qual ele irá conduzir seu viver?

A influência a que se refere trata-se, evidentemente, da que concerne à intervenção de cunho arbitrário ou clandestina, fora de um âmbito racional que possa justificar a verbalização voltada à defesa de uma ideia, ou postura condizente com a etiqueta ou a moral em uma ambiente determinado (no caso presente, o ambiente laboral).

A questão em si, ao se ponderar, a partir de uma dimensão individual, e privada, já se mostra delicada.

A dramaticidade se apresenta em toda a sua acepção, ao se inserir nesse debate a figura do empregador, contextualizado em uma relação empregatícia, visto que envolve um imperativo de autoridade hierárquica.

Mal comparando o convencimento, como dizia Arthur Shopenhauer (2003, p. 40), a fé como o amor, não se conquista pela força. Fazendo as devidas adaptações, diria o mesmo em relação ao convencimento. Que assim como a fé e o amor, não se prestam à violência (moral ou física). 

Um ponto de reflexão reside na legitimação de uma pessoa física ou jurídica de impor uma determinada concepção de vida. Digo impor no sentido de se restringir ou mesmo impedir a discussão de certos pontos de vista discordantes.

Trata-se de um juízo de valor totalitário, na medida em que se pauta somente em uma visão de mundo que seja familiar a esses dirigentes. Ao revés, afastando qualquer pensamento divergente dessa realidade.

As pessoas são muitas. A independência individual de cair no erro e voltar a errar, para então acertar, parece, desse modo, ser amputada de nosso patrimônio existencial.

Como se fazer humano e não autômato se não for da forma própria de nossa natureza curiosa que nos leva a optar pela opção errada.

Já disse Riobaldo, nas linhas de Guimarães Rosa (p. 39):

“O senhor… Mire veja: o mais importante e bonito, do mundo é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas –  mas que elas vão sempre mudando. Afinam ou desafinam. Verdade maior”.

Fica a reflexão: como desenvolver uma consciência moral, se cada vez mais, fecham-se as portas pelas quais se pode evoluir em seus juízos críticos, optando pelo certo ou pelo errado.

A ausência de escolha livre e com independência mata a consciência moral, na medida em que não existe liberdade para o crescimento. Cada vez mais, a sociedade se torna mais policiada, apontando para uma concepção de vida pavimentada pela força.

Apostar na falência da moral e na necessidade de tutelar o cidadão em todas as suas dimensões. Assim, a regulamentação pari passu combina com a desconfiança absoluta.

Como defender, portanto, a minha verdade. Como me formar como ser humano, a partir da afinação de meu discurso, se tudo o que me é dado é somente o devido, sob a tutela dos que sabem mais do que eu, sob o ponto de vista deles.

Até que ponto a invisibilidade moral de minha pessoa no banheiro já não está exposta? Temo que logo mais na esquina surja uma concepção politicamente correta de como bem limpar o traseiro, imposta a todos por razões de profilaxia social.

Se todos estão olhando o tempo todo, como sei quem eu sou, ou se sou o que os outros querem eu seja? Como transcender a minha natureza anímica para poder ser humano?

Há necessidade de um limite entre as ideias e condutas socialmente aceitas e impostas como regras, das convicções pessoais. A preservação de nossa independência individual frente às opiniões coletivas é fundamental à preservação do Estado Democrático e o combate ao “despotismo político” [2].

Parece-me que mais benfazejo, por parte do Estado, seja estimular o livre câmbio de ideias, o que por si é fundamental à construção da dimensão social e individual de cada ser humano. E mais além, propugnar pela tolerância.

A profunda tolerância em relação àqueles com que não concordamos, como política de Estado, base ética sob a qual possamos pavimentar campo fértil para o debate.

Toda essa problemática insere-se, de uma forma mais delicada, na seara trabalhista, com a inserção desses parâmetros à seara trabalhista, evolvendo, nesse pormenor, aspectos do direito digital, quanto à utilização do facebook como meio de prova e os efeitos jurídicos ao ato de “curtir” um comentário na rede social.

2. Os limites do poder disciplinar do empregador e o curtir como razão jurídica (in)válida para a dispensa (i)motivada do empregado.

Como gênero, a relação de trabalho apresenta-se como um conceito mais amplo que a relação de emprego, abarcando-a, portanto.

Desse modo, a relação de trabalho “constitui o gênero da prestação de serviços, do qual se originam várias espécies” (JÚNIOR, 2012, p. 141). Portanto, sempre “que o trabalho for prestado por uma pessoa em proveito de outra, sendo esse trabalho de meio ou de resultado, haverá uma relação de trabalho lato sensu” (JÚNIOR, 2012, p. 141). Assim, da relação de trabalho advém o trabalho autônomo, eventual, avulso etc.

Já a relação de emprego “trata do trabalho subordinado, do empregado em relação ao empregador” (MARTINS, 2002, p. 90).

Nesse sentido, o art. 442 da Consolidação das Leis do Trabalho estabelece que: “Contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego”.

Assim, o contrato de trabalho figura como gênero, abarcando, portanto, o contrato de emprego. Esse, por seu turno, “diz respeito à relação entre empregado e empregador e não a outro tipo de trabalhador” (MARTINS, 2002, p. 90).

Quanto à figura do empregado, a sua importância reside na constatação de que “é ele o destinatário das normas protetoras que constituem este Direito. Daí a conveniência de um estudo mais particularizado a esse respeito” (GOMES; GOTTSCHALK, 2004, p. 68).

O cerne da polêmica se mostra na análise do poder de direção do empregador, no contexto da regulação do Estado às relações capitalistas.

Assim, por “ser o dono do empreendimento e correr o risco do negócio, o empregador tem o poder diretivo do contrato de trabalho, podendo variar algumas cláusulas contratuais de acordo com a tendência econômica ou interesse da empresa” (CASSAR, 2014, p. 247).

A partir do Poder de Direção emana o chamado Poder Disciplinar do empregador. Assim, tal poder “traduz‑se no poder que tem o patrão de impor punições aos empregados” (CASSAR, 2014, p. 295).

A questão gira em torno da indefinição de limites onde acaba a relação jurídica e onde começa uma relação moral. Assim, em um ambiente externo ao da prestação do serviço, há subordinação entre empregado e empregador?[3]

Nesse sentido, se o empregador ordena e você se coloca na posição de não recusar a ordem, por imperativos de várias naturezas (visto que são insondáveis), estará incorrendo em uma relação de comando e obediência, renunciando sua autonomia privada?[4]

Dentro dessa ótica, ou seja, a dificuldade de regulação externa do arbítrio (e até a dificuldade de regulação interna do arbítrio), o Estado não se apresenta como ente neutro. Ele regula a relação entre o capital e trabalho, a partir de um viés ideológico (a organização política da Sociedade- intervém na economia – para garantir a relação de produção).

A significação jurídica do Sistema Capitalista como o direito de ser legalmente explorado, com registro na CTPS, e o direito de legalmente explorar, mediante paga de salários, figura, fora do viés marxista, com conotação pejorativa, no entanto, valer-se de eufemismos não muda a realidade econômica (sem esquecer o disciplinamento Constitucional da quaestio, como se pode verificar do art. 170 da CF[5]).

Explica-se que como o capital apresenta uma racionalidade sistêmica que prescinde de identidades culturais (“o capital não tem nome tem cheiro”), o Estado aplica o “Estado de Exceção” quando há risco do capital se volatizar. Assim, uma interessante discussão reside na suposta suspensão das garantias trabalhistas durante a Copa, adotando-se como discurso oficial o discurso da FIFA. Não questionar esse sistema de coisas trata-se da filosofia do Peru, que nos adverte Tobias Barreto[6].

No entanto, retornando ao ambiente digital e as relações de trabalho propriamente ditas, a grande questão que se apresenta aqui é como agir, de modo geral, e mais especificamente, considerando as interações inerentes à seara trabalhista, sem afrontar os limites preceituados pela Constituição Federal e as demais leis subjacentes, considerando os enunciados normativos emanados do Direito Digital e do Direito do Trabalho.

Nesse passo, a Constituição Federal de 1988, ao tratar dos direitos individuais, em seu artigo 5º, inciso IV[7], assegura a liberdade de manifestação do pensamento. Por sua vez, no art. 5º, inciso XII[8] determina ser inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas e de dados assim como as comunicações telefônicas; ressalvando, nesse último caso, por determinação judicial e conforme a lei estabelece, para fins de investigação criminal ou instrução processual penal, o acesso a tais dados[9].

Desse modo, tem-se que o e-mail corporativo oferecido pelo empregador é passível de fiscalização por parte deste[10]. Desse modo, em se demonstrando, a partir desse meio de prova, que houve, por parte do empregado, qualquer comportamento descrito no art. 482 da CLT, em tese, a rescisão do contrato por justa causa é possível.

No entanto, o e-mail pessoal não está adstrito a tal ação disciplinar do empregador. Analogicamente, a proteção constitucional estende-se ao tal derivação digital, na teleologia de se proteger a intimidade do trabalhador.

O facebook vai na mesma linha. Assim, a informação lá veiculada tem destinatários certos. Com as mensuras devidas o âmbito das manifestações é amplo, dentro da Teoria do Marketplace of ideas.

Assim, como justificar a demissão por justa causa, com fundamento no art. 482, letra “K” da CLT, valendo-se como meio de prova, de dados do facebook[11].

E mais, no caso em pauta, as afirmações em si não foram o motivo preponderante, mas o “curtir” do empregado internauta amigo do malsinado empregado demitido, que se valeu do facebook para lamber suas feridas, motivou a rescisão do contrato de trabalho[12].

Aqui os diversos parâmetros dessa discussão se encontram. A preservação da intimidade do trabalhador, que no caso já havia sido demitido; os limites do poder disciplinar do empregador[13], e a liberdade de expressão de todos os empregados demitidos.

Assim, é imperioso partir do pressuposto de que o “curtir” tem uma acepção voltada à satisfação pessoal e anuência com a mensagem veiculada. Esse pormenor, no entanto, não está indene de elucubrações, havendo quem defenda que a significação do “curtir” se esgota na manifestação de solidariedade com o emissor da mensagem.

Ora, se Sociedade Digital se qualifica por ser uma sociedade da informação, pois se trata de “uma sociedade de serviços em que a posse da informação prevalece sobre a posse dos bens de produção” (PINHEIRO, 2009, p. 40), que melhor cenário há para se defender a Teoria do Marketplace of ideas.

Portanto, essa “característica faz com que a proteção do Direito à Informação seja um dos princípios basilares do Direito Digital, assim como a proteção de seu contradireito, ou seja, do Direito à não-Informação” (PINHEIRO, 2009, p. 40).

Portanto, no caso em pauta, existe ainda a possibilidade de se apontar para o Princípio da Proteção do Trabalhador, princípio basilar que emana do Direito do Trabalho a fundamentar o que se está por se preceituar. No entanto, o enfoque se faz a partir da prevalência do benefício da dúvida em homenagem à livre expressão das idéias (ainda que no caso se esteja a tratar de uma questão afeta à honra e boa fama do empregador quanto ao emissor da mensagem referida) em detrimento de uma sanção tal qual que se mostre restritiva de qualquer expressão, como o “cala boca” da demissão com justa causa, ainda mais pelo talvez insensato “curtir” em um comentário carente, acredito, de maior significação apofântica (por carecer de credibilidade, já que emana de um empregado demitido).

A reação do empregador voltada à desmentir os comentários maldosos, valendo-se, para tal expediente, de argumentos com uma maior qualidade semântica, representaria uma resposta adequada a tal postura belicosa, por parte do ex-empregado. A verdade prepondera sobre a mentira e a resposta cortês a um comentário mal educado, revela maior apuro do espírito, e granjeia respeito de todos os que tomam conhecimento do ocorrido, o que gera credibilidade da empresa perante todos os clientes e demais empregados.

A insuficiência de debate sobre uma questão controvertida somente conduz a outras controvérsias (eventualmente uma eventual ação civil de reparação de danos, com fulcro no art. 5º, V da Constituição Federal, pode-se mostrar também adequada)[14].

Com relação ao empregado que “curtiu” a referida mensagem, existe uma insegurança semântica inerente a tal comportamento.

A significação jurídica do “curtir” mostra-se no mínimo plurívoca, não se podendo concluir que sempre caminha para a mesma direção apontada pelo post, o que, levando-se em consideração a principiologia inerente ao Direito Laboral não poderia subsidiar uma demissão justificada, a partir desse ato volitivo, considerando a natureza ofensiva do argumento que se lança mão, e a que se vincula o “curtir”.

Conclusão

A Sociedade Digital se qualifica por ser uma sociedade da informação. O Estado Democrático se pavimenta pelo livre trânsito das ideias. E, nesse pormenor, não se questiona a qualidade dessas ideias. Muitas vezes desprezíveis. Outras, alvissareiras. Fato é que pelo debate amplo desse conjunto disforme de visões de mundo, o amálgama de um mundo melhor ganha corpo.

Temos para nós, que a liberdade de expressão deve prevalecer, a priori, pois entre outras razões é pressuposto para outros direitos fundamentais. Apesar de não ser dado a ninguém o direito de praticar ofensas injuriosas, o ônus argumentativo deve recair aos que se opõem ao livre câmbio das ideias (independentemente da qualidade dessas, beirando, em alguns casos o discurso de ódio, ou a gratuita desqualificação).

Questão polêmica reside, portanto, na qualificação do que se possa admitir como justificativa à limitação do direito de livre expressão de qualquer um que se disponha a expressar-se.

O empregado, a priori, insere-se nesse juízo.

De outro giro, a questão relacionada à subordinação do empregado ao empregador e a abrangência do poder disciplinar do segundo em relação ao primeiro avulta.

A delimitação da abrangência do direito de livre expressão das ideias deve ser orientada pelos parâmetros constitucionais, já partindo de uma métrica que leve em conta a subordinação objetiva, além do ambiente físico da prestação do serviço, cogitando-se o ambiente virtual, na medida em que a questão se exemplifica pelo exercício da liberdade de expressão na emissão de uma opinião contrária ao empregador (e aí insere-se o xingamento, pura e simplesmente).

De maneira mais específica, a utilização do facebook pelo empregado, como instrumento propagador de uma opinião que possa ensejar ato ofensivo da honra ou da boa fama do empregador, cirurgicamente veiculado pelo “curtir”, na medida em que o empregado em questão não fora o autor propriamente do referido comentário, não pode dar ensejo a despedida motivada desse empregado.

A questão que se quer evidenciar passa pela definição jurídica do “curtir”, que necessita de um aprofundamento teórico, de modo a se delimitar satisfatoriamente a sua significação.

Somente após esse aprofundamento dogmático é possível se partir de um sentido, que demonstre a anuência com o comentário expedido por um terceiro, na rede social, ou simplesmente denote solidariedade com o emissor da mensagem, não significando, puramente, concordância com o teor da mensagem.

Ademais, como referido exaustivamente, a restrição, de qualquer forma, à liberdade de expressão, em si representa uma retrocesso no processo civilizatório, na medida em que o livre câmbio das ideias é fundamento para a evolução da sociedade e aprofundamento do debate democrático.

Finalmente, sempre é possível combater os maus argumentos com boas razões, e sempre haverá, em uma ordem democrática, pavimentada pelo Estado de Direito,  espaço para o direito de resposta.

Referências
BARRETO, Tobias. Filosofia do Peru e Outros Escritos. São Paulo: Barcarolla, 2004.
BARROS, Clóvis de. Cooper IHARA – Aula 01 – Moral e Ética. Disponível em:< //www.youtube.com/watch?v=k89BQtorSo4>. Acesso em 26.12.2014.
BITTAR, Eduardo C. B.; ALMEIDA, Guilherme Assis. Curso de Filosofia do Direito. 7ª ed. São Paulo: Editora Atlas, 2009.
CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. 9ª ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014.
CONJUR. TRT-15 considera válida demissão por justa causa por ‘curtida’ no Facebook. 29 jun. 2015, disponível em: < http://www.conjur.com.br/2015-jun-29/trt-15-considera-valida-justa-causa-curtida-facebook >. Acesso, 3 jul. 2015.
CONJUR. Mensagem na internet durante aviso prévio não autoriza dispensa por justa causa. 13 set. 2013, disponível em http://www.conjur.com.br/2014-set-13/mensagem-internet-durante-aviso-previo-nao-autoriza-justa-causa. Acesso, 3 jul. 2015.
GOMES, Orlando; GOTTSCHALK, Elson, Curso de Direito do Trabalho. 16ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004.
MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 15ª ed. São Paulo: Editora Atlas, 2002.
MARTINS, Jomar. Comentário ofensivo no Facebook justifica demissão. CONJUR, 08 jul. 2013, disponível em: < http://www.conjur.com.br/2013-jul-08/comentario-ofensivo-facebook-quebra-confianca-permite-demissao>. Acesso, 03 jul. 2015.
PINHEIRO, Patrícia Peck. Direito Digital. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
JÚNIOR. José Cairo. Curso de Direito do Trabalho. 7ª ed. Salvador: Editora Juspodivm, 2012.
RAWLS, John. Lectures on the History of Political Philosophy, Cambridge, Massachusetts, and London, England: The Belknap Press of Harvard University Press, 2008.
ROSA, Guimarães. Grande Sertão: Veredas. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2006.
SCHOPENHAUER, Arthur. A Arte de Insultar. Org e ensaio de Franco Volpi, São Paulo: Malheiros, 2003.
 
Notas:
[1] “A liberdade está indistintamente ligada à noção de autonomia. A autonomia da vontade no agir de acordo com a máxima de vida gerada pelo imperativo categórico são pontos fortes e altos do sistema ético kantiano. Em consonância com esses pontos de apoio do sistema kantiano, o homem figura como ser racional, fim em si mesmo, e a humanidade, a mesma dimensão, deverá figurar, em suas relações, sempre como fim e nunca como mediação”. (BITTAR, Eduardo C. B.; ALMEIDA, Guilherme Assis. Curso de Filosofia do Direito. São Paulo: Editora Atlas. 7ª ed, p.310).

[2] Como já explicou John Rawls, certa feita, ao comentar as ideias de Stuart Mill: “2. Note, however, that Mill is equally concerned with ‘the tyranny of the prevailing opinion and feeling, the tendency of society to impose, by other means than civil penalties, its own ideas and practices as rules of conduct on those who dissent from them; to fetter the development of any individuality not in harmony with its ways . There is a limit to the legitimate interference of collective opinion with individual independence; and to find that limit, and maintain it against encroachment, is as indispensable to a good condition of human affairs, as protection against political despotism’ (RAWLS, John. Lectures on the History of Political Philosophy, Cambridge, Massachusetts, and London, England: The Belknap Press of Harvard University Press, 2008, pp. 284 e 285)”.

[3] Não se olvidou nesse texto a noção de subordinação objetiva. Tem-se claro que a subordinação subjetiva não se insere no contexto da discussão que se quer entabular. Assim, a subordinação enfocada na seara trabalhista é a ligada ao contrato de trabalho. Afora essa relação jurídica não existe poder do empregador sobre o empregado. Ao menos teoricamente essa noção de poder encontra-se devidamente delineada. No entanto, como se quer apresentar à reflexão, os limites da relação empregatícia não se mostram tão claramente delineados, ao se abstrair o ambiente de trabalho físico e se inserir a seara digital, que se manifesta no ambiente virtual.

[4] “Aí vai a grande diferença entre moralidade e juridicidade de uma ação. Ademais, a moralidade pressupõe autonomia, liberdade, dever e autoconvencimento; a juridicidade pressupõe coercitividade” (BITTAR, Eduardo C. B.; ALMEIDA, Guilherme Assis. Curso de Filosofia do Direito. São Paulo: Editora Atlas. 7ª ed, p. 314).

[5] Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
I – soberania nacional;
II – propriedade privada;
III – função social da propriedade;
IV – livre concorrência;
V – defesa do consumidor;
VI – defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)
VII – redução das desigualdades regionais e sociais;
VIII – busca do pleno emprego;
IX – tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 6, de 1995)
Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.

[6] BARRETO, Tobias. Filosofia do Peru e Outros Escritos. São Paulo: Barcarolla, 2004, passim.

[7] Art. 5º. […] IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato.

[8]Art. 5º. […] XII – é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;

[9] Não se olvide que os excessos no exercício da liberdade de expressão serão punidos, estabelecendo a CF, em seu art. 5º, V que: “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”.

[10] EMENTA: JUSTA CAUSA. Demonstrado por mensagens do sistema de email corporativo que a reclamante, atendente telefônica, de forma reiterada, descumpria ordens gerais da empresa (indisciplina) e trabalhava com extrema desídia, realizando a chamada operação ‘tartaruga', desligando unilateralmente o telefone e desrespeitando os clientes da empresta tomadora, impõe-se ratificar a justa causa aplicada. Outrossim, disponibilizado o sistema como instrumento de trabalho pela empresa, é legítima a utilização das mensagens como prova, não restando violado o art. 5º, X, XII e LVI, da CF. Precedentes. (Processo: 00708-2007-014-10-00-3 ROPS; 1ª Turma; Juiz(a) Relator: RICARDO ALENCAR MACHADO; Julgado em: 28/11/2007; Publicado em: 07/12/2007)

[11] Interessante apontar várias nuances, que por falta de espaço, já que o enfoque é bem delimitado poderiam passar despercebidas, quanto se pretenda uma abordagem de viés mais aprofundada. Assim, por exemplo: “ […]À fl. 65 consta a Comunicação de Demissão e, à fl. 67 e ss, a publicação de uma manifestação do Reclamante no Facebook referente a sua insatisfação de ter que trabalhar até o último dia do ano. A justa causa constituída de ato lesivo da honra e boa fama praticado pelo empregado é o tipo que não se configura pela repetição de atos, ou seja, pela soma de faltas leves; é uma espécie de falta que deve ser grave o suficiente para ensejar a punição máxima do contrato. O Autor publicou em rede social manifestação na qual referia-se ao seu empregador como 'uma empresa de merda…que não valoriza os funcionários e ainda obriga a trabalhar até o último dia do ano'. A ninguém é dado o direito de ofensas injuriosas. O ato cometido pelo Autor é fruto de desatino e demonstra momento de desequilíbrio social; é ofensivo, baixo e covarde. Não há qualquer dúvida sobre a necessidade de sanção ao Autor por seu ato. Tratando-se, porém, de ato único, impõe-se o seu estudo acerca da gravidade suficiente para ensejar, por esse ato, a sanção máxima do contrato, tal qual aplicada pela Ré. O conceito de gravidade é relativo quando se lida com o ser humano. Já destacou Evaristo de Moraes Filho que a falta do empregado deve ser analisada in concreto para aplicação da respectiva penalidade proporcional, ou seja, deve-se levar em conta não só a medida padrão (o bonus pater familias), como também, assim diz o Autor citado, 'a personalidade do agente, suas condições psicológicas, sua capacidade de discernimento, e assim por diante'. Enfim, não se pode avaliar a gravidade do ato faltoso sem que se leve em conta a idiossincrasia do trabalhador. Délio Maranhão cita nas Instituições do Direito do Trabalho (com Arnaldo Süssekindi et al, LTR 1993) que 'a falta pode ser grave, mas pode, em relação aos méritos particulares do empregado e a uma prestação do trabalho laboriosa e honesta, perder seu caráter de gravidade'. Conceitualmente ainda se pode ponderar que o tipo faltoso no qual se inseriu o ato do Autor (alínea k do artigo 482 da CLT), sob análise concreta, suscita hipótese em que a relação contratual seja impedida de continuar pelo ato lesivo, grave o bastante para a ruptura total de fidelidade e confiança presente entre as partes do contrato. De volta ao caso, que ora se examina, tem-se presente que o trabalhador, que, sem qualquer histórico faltoso em seu contrato, comete o desatino de publicar em rede social um protesto que contempla palavras baixas e ofensivas ao seu empregador. Rede social (facebook) nos dias atuais, é um grande salão de conversa. Não se pode dizer que se trata de manifestação dirigida unicamente aos amigos do Autor, porque sua publicação foi aberta. É uma conversa em voz alta, parecida com aquela que, ainda que não se cite o nome do ofendido, deixa-se bem claro de quem se trata. Nessa roda de conversa sempre há um delator que vai chamar o ofendido para ouvir o que se está dizendo a seu respeito. A lesão à honra e boa fama da Ré, porém, haveria de ser algo de destaque irrefutável na manifestação do Autor. Como na sua publicação – ela própria aponta – a indignação do trabalhador originou-se do fato de ter sido ele convocado para trabalhar no último dia do ano, não se estabelece concretamente a gravidade da falta sugerida. Ainda que não esteja em jogo a exceção da verdade (somente ofensas físicas legitimam a defesa própria), as razões da manifestação impensada conduzem o ato a uma absoluta revelação de fúria e desatino pessoal. Sob nenhum ângulo se pode dizer que a honra de uma empresa tenha sido ferida por convocar um trabalhador ao seu exercício legítimo de tarefas contratuais, especialmente na hipótese da atividade empresarial da Ré (venda de bebidas), que tem nessa data um ápice de vendas. Ou seja, a publicação bestial do Autor nada mais revela do que sua própria falta de educação e polidez perante seu empregador e seus colegas de trabalho. Essa falta, assim analisada, em concreto, não encontra gravidade bastante para impedir a continuação de um contrato de trabalho de três anos e meio, sem histórico de faltas, por ato de ofensa à honra da empresa. A punição de dispensa por justa causa, ao cabo de tudo foi excessiva. Anula-se, assim, o ato, e considera-se o contrato extinto por dispensa imotivada. Devidas, ao Autor, as seguintes parcelas: aviso prévio proporcional, férias proporcionais com 1/3, 13º salário proporcional, FGTS sobre o aviso prévio, acréscimo de 40% sobre o FGTS. O pedido é procedente. (Juiz do Trabalho: Paulo André de França Cordovil) […] ( AIRR – 1580-45.2012.5.24.0004 , Relator Desembargador Convocado: Tarcísio Régis Valente, Data de Julgamento: 10/06/2015, 5ª Turma, Data de Publicação: DEJT 19/06/2015).

[12] CONJUR, TRT-15 considera válida demissão por justa causa por ‘curtida’ no Facebook.  29 jun. 2015, disponível em: < http://www.conjur.com.br/2015-jun-29/trt-15-considera-valida-justa-causa-curtida-facebook >. Acesso, 3 jul. 2015.

[13] Questão que se aventa, no caso em pauta, é saber-se como o empregador teve acesso aos comentários referidos, publicados no facebook do empregado originariamente demitido, pelo empregado posteriormente demitido.

[14] No entanto, há que considerar que esse não vem sendo o posicionamento adotado pelos Tribunais trabalhistas. Assim, v.g.: MARTINS, Jomar. Comentário ofensivo no Facebook justifica demissão. CONJUR, 08 jul. 2013, disponível em: < http://www.conjur.com.br/2013-jul-08/comentario-ofensivo-facebook-quebra-confianca-permite-demissao>. Acesso, 03 jul. 2015. Porém, nem sempre: CONJUR. Mensagem na internet durante aviso prévio não autoriza dispensa por justa causa. 13 set. 2013, disponível em http://www.conjur.com.br/2014-set-13/mensagem-internet-durante-aviso-previo-nao-autoriza-justa-causa. Acesso, 3 jul. 2015.


Informações Sobre o Autor

Alexandre Gazetta Simões

Mestrando em Teoria do Direito e do Estado pelo Centro Universitário Eurípedes de Marília (UNIVEM). Pós-graduado, com Especialização em Gestão de Cidades (UNOPEC). Direito Constitucional (UNISUL). Direito Constitucional (FAESO). Direito Civil e Processo Civil (FACULDADE MARECHAL RONDON). Direito Tributário (UNAMA). graduado em Direito (ITE-BAURU. Analista Judiciário Federal – TRF3. Professor de graduação de Direito na Associação Educacional do Vale do Jurumirim (EDUVALE AVARÉ). Membro do Conselho Editorial da Revista de Direito do Instituto Palatino. Membro do Conselho Editorial da Revista Acadêmica de Ciências Jurídicas da Faculdade Eduvale Avaré. – Ethos Jus. Co-autor da obra “Ativismo Judicial – Paradigmas Atuais” (2011) Letras Jurídicas. Co-Organizador da obra “Ensaios Sobre a História e a Teoria do Direito Social” (2012) Letras Jurídicas


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