A não-obrigatoriedade do duplo grau de jurisdição nos processos de competência penal originária dos tribunais

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Resumo: Este breve trabalho visa demonstrar a não-obrigatoriedade de submissão do processo penal ao duplo grau de jurisdição, por diversos e contundentes argumentos que serão analisados ao longo da explanação, bem como pela refutação dos argumentos favoráveis a este instituto, tão em voga na atualidade, sobremaneira em virtude do julgamento da Ação Penal 470 pelo Supremo Tribunal Federal, que terá algumas linhas dedicadas a seu entendimento. Para introduzir o tema, discorrer-se-á brevemente acerca do histórico e do conceito de duplo grau de jurisdição, assim como do conceito de competência penal originária.

Palavras-chave: duplo grau; não-obrigatoriedade; competência penal dos tribunais; recurso; silêncio eloquente da Constituição; economia processual; razoável duração do processo; Ação Penal 470.

Sumário: 1. Introdução. 2. Breve histórico do duplo grau de jurisdição. 3. Conceito. 3.1. Pensamento doutrinário. 3.2. Natureza Jurídica. 3.3. Análise da Definição. 4. Competência Penal Originária dos Tribunais. 5. Duplo Grau de Jurisdição em face da competência penal originária dos tribunais. 5.1. Argumentos favoráveis. 5.1.1. Princípio constitucional implícito. 5.1.2. Convenção Americana de Direitos Humanos e o art. 5º, § 2º, da Constituição Federal. 5.1.3. Falibilidade dos juízes e segurança jurídica. 5.2. Argumentos Contrários. 5.2.1. Silêncio Eloquente da Constituição Federal. 5.2.2. Economia Processual. 5.2.3. Cabimento de Habeas Corpus. 5.2.4. Existência de decisões irrecorríveis e Duração razoável do processo.  6. Conclusão. Referências.

1. Introdução

No Estado Democrático de Direito vivido pela grande maioria das nações ocidentais atualmente, um dos princípios mais caros à sociedade é o devido processo legal, que se constitui num direito e garantia contra eventuais arbitrariedades do Estado. O ordenamento jurídico pátrio sobreleva de tal forma este princípio que não só o consagra expressamente na Carta Magna, por meio do art. 5º, inc. LIV (“ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”), como o faz com boa parte dos princípios dele decorrentes, a exemplo do contraditório, ampla defesa, juiz natural, vedação de provas ilícitas, etc. Desnecessário dizer que tais garantias, por serem previstas como direitos fundamentais, são insuscetíveis de supressão por emenda constitucional, revelando-se, assim, cláusulas pétreas.

Por outro lado, tal previsão não ocorre com o duplo grau de jurisdição. Este princípio, tido por alguns como de fundamental relevo para a justiça das decisões judiciais, simplesmente foi esquecido pelo constituinte. Seria uma hipótese de silêncio eloquente ou bastaria um mero esforço integrador para sua utilização onde não haja previsão legal? É sobre isto que este trabalho se debruçará.

2. Breve histórico do duplo grau de jurisdição

Como a grossa maioria dos institutos do moderno direito ocidental, o duplo grau de jurisdição surgiu em Roma, com os institutos da appellatio e supplicatio, recursos de decisões que até o momento eram tidas como inapeláveis[1]. A appellatio, com algumas poucas alterações, exercia o mesmo papel que a apelação exerce hoje, que é o de recurso contra sentença de mérito (em algumas épocas também foi aplicada às decisões interlocutórias[2]), ao passo que a supplicatio era utilizada contra irregularidades no procedimento, a grosso modo o que ocorre com a correição parcial no processo penal.

Após o fim do Império Romano do Ocidente com as invasões bárbaras, vários instituos do direito romano foram esquecidos, inclusive o sistema recursal, passando as decisões a serem proferidas por assembléias populares, presididas pelos condes, uma das classes de senhores feudais da época, que, por serem bastante poderosos, e em face da ausência de Estado, acabavam por tornar as decisões irrecorríveis[3].

A exemplo da maior parte dos campos de conhecimento da época, a sabedoria jurídica romana foi preservada nos mosteiros, e foi “ressuscitada” pelos monges a partir do século XII. Assim, as sentenças foram aos poucos voltando a ser recorríveis, a medida que os senhores feudais foram se submetendo ao poder real.

Com o desenvolvimento do poder do Estado e o estabelecimento das classes sociais mais favorecidas, como a nobreza e o clero, em detrimento do povo, os primeiros passaram a ser agraciados com cargos de juízes em troca de favores ao soberano. Enxergando meios de se angariar fundos ilicitamente com a profissão, aumentou-se o número de recursos, desvirtuando-se a função jurisdicional. Tal realidade é retrada com fidedignidade por Moacyr Amaral Santos[4]:

“Criaram-se juízes proprietários dos cargos, e esses, praticamente, se transformaram em proprietários da função judiciária. À irrecorribilidade das sentenças se substituiu a recorribilidade da generalidade das decisões, até de simples despachos, multiplicando-se os graus de jurisdição e, em conseqüência, os recursos. O sistema propiciava aos juízes o crescimento de suas rendas. Desmereceu-se a justiça, tornada objeto de comércio durante largos séculos.

Com a Revolução Francesa, muito se discutiu acerca da manutenção da enorme quantidade de recursos existentes até então, tendo em vista o desejo de solução de continuidade com o regime anterior. Porém, o direito ao duplo grau de jurisdição acabou se consolidando como um direito do jurisdicionado, passando posteriormente a compor o ordenamento jurídico de todo o mundo ocidental, em virtude da influência da citada revolução. Esta influência, inclusive, é utilizada por doutrinadores modernos para indicar que o princípio é previsto implicitamente no nosso ordenamento em virtude de este ordenamento ter suas origens no constitucionalismo oriundo dos franceses[5].

Quanto ao direito brasileiro, este, como era de se esperar, por muito tempo seguiu o ordenamento português, inclusive após a independência. Somente em 1850, com a edição do Regulamento nº 737, o sistema recursal passou a ter disciplinamento próprio. Desta época, de se ressaltar a distinção entre decisões de mérito e interlocutórias com força de definitiva, ambas abarcadas pela apelação, desde que houvesse condenação em valor mínimo.

O Código de Processo Civil de 1939 acabou adotando entendimento de que somente seria cabível apelação de decisões de primeiro grau definitivas (de mérito). Já o atual CPC, que inclusive está em vias de extinção, optou por considerar apelável as sentenças de mérito e as terminativas[6].

3. Conceito

3.1. Pensamento doutrinário

Para Fernando Capez, com sua marcante objetividade, o duplo grau de jurisdição é a “possibilidade de revisão, por via de recurso, das causas já julgadas pelo juiz de primeiro grau[7].

Já Nestor Távora, não fugindo desta linha sucinta, assevera que “este princípio assegura a possibilidade de revisão das decisões judiciais, através do sistema recursal, onde as decisões do juízo a quo podem ser reapreciadas pelos tribunais”[8].

Vicente Greco Filho, por sua vez, citando Chiovenda, acrescenta que o duplo grau é uma “garantia para o cidadão em três aspectos: na medida em que um julgamento reiterado torna, já por si, possível a correção dos erros; porque dois julgamentos são confiados a juízes diversos que apreciarão independentemente a matéria; e porque o segundo juiz se apresenta como mais autorizado que o primeiro[9].

Com sua sabedoria processualista peculiar, Amaral Santos destrincha ainda mais as vantagens do duplo grau, afirmando:

“Em primeiro lugar satisfaz a uma exigência humana. Ninguém se conforma com uma única decisão, que lhe seja desfavorável. Em segundo lugar, não se pode olvidar a possibilidade de sentenças injustas ou ilegais, e até mesmo proferidas por juízes movidos pelo temor (coação) ou sentimentos menos dignos (peita). Daí a segurança da justiça aconselhar o reexame das causas por meio dos recursos. O princípio do duplo grau de jurisdição estabelece a regra pela qual o reexame da causa se faça por órgão jurisdicional de categoria superior ao que proferiu a sentença recorrida. A possibilidade do reexame recomenda ao juiz inferior maior cuidado na elaboração da sentença e o estímulo ao aprimoramento de suas aptidões funcionais, como título para sua ascensão nos quadros da magistratura. O órgão de grau superior, pela sua maior experiência, acha-se mais habilitado para reexaminar a causa e apreciar a sentença anterior, a qual, por sua vez, funciona como elemento e freio à nova decisão que se vier a proferir.”[10]

3.2. Natureza Jurídica

Diante dos conceitos acima explicitados, surge uma dúvida. O duplo grau seria um direito, uma garantia ou um princípio? Para responder tal questionamento, é necessário uma rápida digressão do que seria cada um destes institutos.

Direito, em sua acepção mais estrita, e de forma bem sucinta, seria uma norma declaratória da existência de determinado interesse para um indivíduo, podendo ser subjetivo ou potestativo. Já garantias seriam as normas que assegurariam o exercício deste interesse, ressaltando-se que não se confundem com os remédios constitucionais, que são espécies do gênero garantia. Por fim, quanto à definição de princípio, ouso utilizar da precisa e completa definição do mestre Miguel Reale, apontando que “princípios são enunciações normativas de valor genérico, que condicionam e orientam a compreensão do ordenamento jurídico, a aplicação e integração ou mesmo para a elaboração de novas normas. São verdades fundantes de um sistema de conhecimento, como tais admitidas, por serem evidentes ou por terem sido comprovadas, mas também por motivos de ordem prática de caráter operacional, isto é, como pressupostos exigidos pelas necessidades da pesquisa e da práxis[11].

Partindo dos conceitos básicos acima, ouso afirmar, com todas as vênias dos que pensam o contrário, que o duplo grau de jurisdição não se trata nem de direito nem de princípio, e sim de garantia da parte contra o Estado-juiz. O direito dado ao cidadão é o de recorrer, e não direito ao duplo grau. Releva, neste momento, diferenciar os institutos do duplo grau e do recurso. Duplo grau de jurisdição seria a garantia jurídico-processual pelo qual o sistema processual de um país admite conhecimento e decisão de todos os aspectos da mesma causa por dois órgãos jurisdicionais distintos, sendo o segundo superior hierarquicamente ao primeiro. Recurso, instituto de âmbito mais restrito, é o ato voluntário pelo qual a parte vencida manifesta desejo de que a causa seja reapreciada, no todo ou parcialmente, pelo mesmo órgão julgador ou por órgão diverso – a depender da espécie de recurso.

Também não é o mais correto, na humilde opinião deste autor, tratar o duplo grau de jurisdição como princípio, já que não se trata de enunciação de valor genérico, tampouco serve para a elaboração de novas normas, pois norma já o é. Em verdade, o duplo grau de jurisdição trata-se de uma garantia dada ao cidadão para levar causa de seu interesse a um outro julgamento. Assim, inclusive, é tratado pela Convenção Americana de Direitos Humanos, utilizada pela corrente favorável ao duplo grau no processo penal, que o disciplina no capítulo referente à Garantias Judiciais (art. 8º).

3.3. Análise da Definição

Podemos conceituar duplo grau de jurisdição, então, como a garantia dada à parte num processo ou a terceiros interessados juridicamente nele de ter um novo julgamento por órgão superior hierarquicamente em face de uma decisão de mérito proferida por um juiz de primeiro grau. Analisemos cada elemento do conceito.

Tem natureza jurídica de garantia, conforme explicitado no tópico acima. Ademais, o titular deste direito pode ser tanto a parte num processo, seja este judicial ou administrativo, como terceiro interessado nele, seja juridicamente, como é o caso do processo civil, seja economicamente, como acontece com a assistência no processo penal, onde o assistente, apesar de não ser considerado parte, tem interesse jurídico na condenação do réu, tendo, portanto, direito ao duplo grau de jurisdição.

O direito de se insurgir se caracteriza pela natural insatisfação do homem contra qualquer decisão em seu desfavor. Humberto Theodoro Júnior traz um matiz psicológico ao duplo grau, defendendo que “é intuitiva a inconformação de qualquer pessoa diante do primeiro juízo ou parecer que lhe é dado. Naturalmente, busca-se uma segunda ou terceira opinião. Numa síntese feliz, o mesmo processualista resume a origem dos recursos processuais em duas razões: “a) a reação natural do homem, que não se sujeita a um único julgamento; b) a possibilidade de erro ou má-fé do julgador[12].

A decisão que gera o direito ao duplo grau de jurisdição deve ser de mérito ou definitiva, sendo entendido este termo na sua acepção mais ampla, ou seja, tanto de sentença que extingue o processo com resolução de mérito, como aquela que o julga sem resolução de mérito. Normalmente, os recursos que dão origem ao duplo grau de jurisdição são aqueles de fundamentação livre (exemplo maior é a apelação), pois os de fundamentação vinculada, ou não se dirigem ao mérito (caso dos agravos), ou buscam outro objetivo (recursos extraordinários em sentido amplo, cujo objetivo é, a depender do caso, a guarda da lei ou da Constituição, bem como uniformização jurisprudencial).

Tal decisão de mérito deve ser proferida por juiz de primeiro grau. Como será analisado adiante, somente terão direito ao duplo grau de jurisdição as partes que tenham seus processos julgados por um juiz de primeiro grau, com raríssimas exceções, previstas constitucionalmente. Tal fato acontece em virtude de o duplo grau de jurisdição, em regra, somente poder ser realizado pelos Tribunais de Justiça ou Tribunais Regionais Federais, órgãos a quem são dirigidas as apelações, por exemplo. As exceções ficam a cargo dos recursos ordinários constitucionais referentes aos remédios previstos na Constituição, que, a depender da autoridade envolvida, pode ser julgada pelos Tribunais de sobreposição (STF, STJ, TSE, TST e STM). É exceção porque ordinariamente tais tribunais tem outras funções, como proteger a Constituição, no caso do STF, ou uniformizar a interpretação da lei federal e eventuais divergências jurisprudenciais, como acontece com os outros tribunais superiores.

4. Competência Penal Originária dos Tribunais

Como falado no início, o Estado Democrático de Direito está intimamente ligado à obediência aos diversos princípios processuais que, inclusive, foram alçados à categoria de direitos e garantias fundamentais. Ao contrário do duplo grau de jurisdição, o princípio do juiz natural está expressamente previsto no rol do art. 5º (LIII – ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente;).

Portanto, em tese, todos as pessoas submetidas a processo judicial deveriam ser submetidas a um julgamento por uma autoridade competente, sendo esta, até segunda ordem, um juiz de primeiro grau. Sendo assim, sempre teriam direito ao duplo grau. Ocorre que o constituinte, seja originário, seja derivado, em suas acepções reformadora (por meio de emendas constitucionais) e decorrente (por meio de constituições estaduais), optaram por garantir aos ocupantes de determinados cargos, quando do suposto cometimento de infrações penais, o julgamento diretamente pelo tribunal, por variados motivos. É a conhecida competência por prerrogativa de função, ou ratione funcionae, conforme classificação cunhada por Renato Brasileiro[13].

Ressalte-se que não se trata de privilégio para determinada pessoa, que seria odioso em face da isonomia pregada pelo texto constitucional. Em verdade, é uma prerrogativa direcionada a determinada função exercida por seu ocupante, segundo o festejado autor mineiro:

Essa excepcionalidade do foro por prerrogativa de função em face de preceitos sensíveis da Constituição Federal, como o da isonomia e o do juiz natural, possui uma razão de ser própria, específica, justificável, que transmuda sua conotação de privilégio, no sentido pejorativo da palavra, para prerrogativa essencial ao bom exercício da função. Por tal motivo, em uma Constituição Federal que pretende tratar igualmente os cidadãos comuns, as hipóteses de prerrogativa de foro, pelo privilégio que de certa forma conferem, devem ser interpretadas restritivamente.” (grifos nossos)[14].

Assim, a garantia concedida por um julgamento por um tribunal de segunda instância é ambivalente. É garantia tanto para o acusado, que será julgado supostamente com maior imparcialidade pelos tribunais, fugindo de eventuais ranços de um juiz de primeira instância, seja para a sociedade, que não poderá alegar influência do acusado na justiça de primeiro grau. Digo supostamente, no primeiro caso, porque é conhecida a influência política nos tribunais de segundo grau, já que indicados, sendo, a maioria das prerrogativas de função justamente dirigidas aos políticos. Porém, na ausência de um melhor critério, opta-se pelo menos pior, acreditando no princípio da colegialidade.

5. Duplo Grau de Jurisdição em face da competência penal originária dos tribunais.

Diversos são os argumentos utilizados por aqueles a favor e contra o grau de jurisdição como elemento obrigatório no processo penal nacional. E são estas fundamentações que serão analisadas pormenorizadamente a seguir.

5.1. Argumentos favoráveis

Embora haja doutrina majoritária, amparada pela jurisprudência do STF, que considera que o duplo grau de jurisdição não é obrigatório nos processos judiciais, há doutrinadores de grande quilate, como Renato Brasileiro de Lima, que defendem a obrigatoriedade, levando em conta, principalmente, os argumentos de ser um princípio constitucional implícito, a ratificação pelo Brasil do Pacto de San José da Costa Rica, e a falibilidade dos juízes, que ocasionaria insegurança jurídica. Vejamos tais premissas detalhadamente.

5.1.1. Princípio constitucional implícito

A principal razão para esta alegação é de que o art. 5º, ao afirmar em seu inc. LV, que “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”, teria estabelecido que contra toda primeira decisão de um juízo, caberia ao menos um recurso, apto a impugnar aquela primeira compreensão. Tal princípio seria implícito em virtude de ser derivado de uma das várias interpretações que pode ter este dispositivo constitucional. Desta maneira, mesmo na competência penal originária dos tribunais, deveria haver um recurso dirigido a uma autoridade superior que pudesse reformar a decisão.

Este argumento é, particularmente, bastante frágil. Como falado, há inúmeras interpretações para este artigo, e esta é uma das mais “forçadas”. A meu ver, a interpretação mais equilibrada do referido dispositivo é a de que meios e recursos inerentes seriam aqueles previstos no ordenamento jurídico para proporcionar a ampla defesa, não podendo se interpretar como se o juiz, na ausência do comando legislativo, pudesse apontar o recurso a ser aplicado a determina hipótese não abrangida pelo sistema recursal pátrio, sob pena de este magistrado invadir a competência legislativa, ferindo o princípio da separação dos poderes.

Outro não é o entendimento de Nestor Távora:

“Uma correção de rumo se faz preciso: o duplo grau de jurisdição não é principio sufragado na Consíituiçãode 1988. Há processos penais onde esse duplo grau inexiste, tais como aqueles de competência originária do Supremo Tribunal Federal. A garantia do devido processo legal (art. 5°, LIV, CF/1988) e a enunciação que preconiza que "aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes" (art. 5°, LV, CF/1988), não induzem a existência do princípio do duplo grau de jurisdição a nível constitucional.”[15]

5.1.2. Convenção Americana de Direitos Humanos e o art. 5º, § 2º, da Constituição Federal.

A Convenção Americana sobre Direitos Humanas, conhecida como Pacto de San José da Costa Rica, assinada em 1969, vigente desde 1978, e que foi ratificada pelo Brasil em 1992, através do Decreto Presidencial nº 678, estabelece em seu art. 8º, nº. 2, h:

“Art. 8º: “Toda pessoa acusada de um delito tem direito a que se presuma sua inocência, enquanto não for legalmente comprovada sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas:

h) direito de recorrer da sentença a juiz ou tribunal superior.”

Por outro lado, a Constituição Federal assegura em seu art. 5º, § 2º, que “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. Ou seja, para os defensores desta corrente, o princípio do duplo grau foi acolhido pelo ordenamento jurídico nacional quando da incorporação do tratado. A Emenda Constitucional nº 45/2004, conhecida como “Reforma do Judiciário”, veio a reforçar ainda mais esta tese, ao incluir o § 3º do art. 5º, afirmando que os tratados e convenções sobre direitos humanos, como é o caso, que forem aprovados nos moldes de emenda constitucional, terão equivalência a estas.

Renato Brasileiro, com sua persipácia peculiar, acrescenta ainda dois elementos a esta interpretação[16].

O primeiro é de que o Brasil fez uma única reserva a este tratado, a de que não havia direito automático de visitas e inspeções in locu, da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, as quais dependerão da anuência expressa do Estado. Ou seja, não fez reserva alguma ao supramencionado dispositivo.

O segundo elemento é do que entre duas interpretações de determinado preceito em matéria penal, deveria se observar o princípio pro homine, segundo o qual, em matéria de direitos humanos, prevalece a norma mais favorável ao indivíduo, devendo a Convenção Americana prevalecer por ser norma mais benéfica.

Com toda vênia ao doutrinador mineiro, uso-me da jurisprudência do STF para refutar estes consistentes argumentos. Para o Pretório Excelso, não podem quaisquer convenções internacionais assinadas pelo Poder Executivo prevalecer sobre as disposições constitucionais. Para justificar o ponto, colaciono o trecho do acórdão do saudoso Min. Sepúlveda Pertence, que, apesar de longo, é deveras esclarecedor:

Duplo grau de jurisdição no Direito brasileiro, à luz da Constituição e da Convenção Ame­ricana de Direitos Humanos. Para corresponder à eficácia instrumental que lhe costuma ser atribuída, o duplo grau de jurisdição há de ser concebido, à moda clássica, com seus dois carac­teres específicos: a possibilidade de um reexame integral da sentença de primeiro grau e que esse reexame seja confiado a órgão diverso do que a proferiu e de hierarquia superior na ordem judiciária. Com esse sentido próprio – sem concessões que o desnaturem – não é possível, sob as sucessivas Constituições da República, erigir o duplo grau em princípio e garantia constitu­cional, tantas são as previsões, na própria Lei Fundamental, do julgamento de única instância ordinária, já na área cível, já, particularmente, na área penal. A situação não se alterou, com a incorporação ao Direito brasileiro da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José), na qual, efetivamente, o art. 8º, 2, h, consagrou, como garantia, ao menos na esfera pro­cessual penal, o duplo grau de jurisdição, em sua acepção mais própria: o direito de ‘toda pessoa acusada de delito’, durante o processo, ‘de recorrer da sentença para juiz ou tribunal superior’. Prevalência da Constituição, no direito brasileiro, sobre quaisquer convenções internacionais, incluídas as de proteção aos direitos humanos, que impede, no caso, a pretendida aplicação da norma do Pacto de São José: motivação. (…) Competência originária dos tribunais e duplo grau de jurisdição. Toda vez que a Constituição prescreveu para determinada causa a competência originária de um tribunal, de duas uma: ou também previu recurso ordinário de sua decisão (CF, arts. 102, II, a; 105, II, a e b; 121, § 4º, III, IV e V) ou, não o tendo estabelecido, é que o proibiu. Em tais hipóteses, o recurso ordinário contra decisões de tribunal, que ela mesma não criou, a Constituição não admite que o institua o direito infraconstitucional, seja lei ordinária seja convenção internacional: é que, afora os casos da Justiça do Trabalho – que não estão em causa – e da Justiça Militar – na qual o STM não se superpõe a outros tribunais –, assim como as do Supremo Tribunal, com relação a todos os demais tribunais e juízos do País, também as competências recursais dos outros tribunais superiores – o STJ e o TSE – estão enumera­das taxativamente na Constituição, e só a emenda constitucional poderia ampliar. À falta de órgãos jurisdicionais ad quo, no sistema constitucional, indispensáveis a viabilizar a aplicação do princípio do duplo grau de jurisdição aos processos de competência originária dos tribunais, segue‑se a incompatibilidade com a Constituição da aplicação no caso da norma internacional de outorga da garantia invocada.” (RHC 79.785, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 29‑3‑2000, Plenário, DJ de 22‑11‑2002.) No mesmo sentido: AI 601.832‑AgR, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 17‑3‑2009, Segunda Turma, DJE de 3‑4‑2009.

Note-se que, apenas para reforço, o eminente ministro tratou ao final o duplo grau de jurisdição como garantia, incorporando ainda mais a posição adotada por este autor.

O Ministro Joaquim Barbosa, já após a Emenda Constitucional, confirmou tal entendimento, ao afirmar:

Após o advento da EC 45/2004, consoante redação dada ao § 3º do art. 5º da CF, passou‑se a atribuir às convenções internacionais sobre direitos humanos hierarquia cons­titucional (…). Desse modo, a Corte deve evoluir do entendimento então prevalecente (…) para reconhecer a hierarquia constitucional da Convenção. (…) Se bem é verdade que existe uma garantia ao duplo grau de jurisdição, por força do Pacto de São José, também é fato que tal garantia não é absoluta e encontra exceções na própria Carta.” (AI 601.832‑AgR, voto do Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 17‑3‑2009, Segunda Turma, DJE de 3‑4‑2009.)

Portanto, cai por terra mais um argumento da corrente favorável à aplicação do duplo grau de jurisdição no processo penal nacional, tendo em vista que convenção internacional não pode preponderar sobre o estabelecido expressamente na Constituição.

5.1.3. Falibilidade dos juízes e segurança jurídica.

Coloco os citados argumentos juntos porque a justificativa para derrubá-los passa pela mesma premissa. Defendem os advogados do duplo grau de jurisdição de uma maneira geral, não só no aspecto penal, que os juízes são falíveis, portanto, sua decisão estaria mais facilmente eivada de erros a serem corrigidos pelo tribunal hierarquicamente superior, composto por juízes supostamente mais sábios e experientes. Isto faria com que se concedesse maior segurança jurídica a uma decisão que, na maior parte das vezes, afeta a liberdade do indivíduo, especificamente se tratando de matéria processual penal.

A falibilidade dos magistrados, segundo Aury Lopes Júnior, indica que o juiz estaria propenso a erros, vez que um ser humano estaria julgando outro, além do que a reanálise da acervo probatório do processo por terceiros capacitados juridicamente reduziria a possibilidade de erro e daria maior legitimidade ao poder de punir, gerando segurança jurídica[17].

A premissa de que partimos para entender tais argumentos como falhos é de que se tratam de conceitos jurídicos indeterminados, carregados de imprecisão e subjetivismo, não devendo servir como alegações solitárias em um debate jurídico. Além disso, o duplo grau de jurisdição não vai tornar uma decisão infalível nem obrigatoriamente gerar mais segurança jurídica. Isto porque os tribunais e seus órgãos fracionários também são compostos por seres humanos que julgarão de acordo com suas convicções, havendo, portanto, apenas uma menor probabilidade de erros, já que, em tese, os juízes são mais preparados e o julgamento se dará em colegiado. Porém, a decisão ainda é falível, não sendo suficiente tal alegação para desconsiderar o contido na Constituição.

Quanto à segurança jurídica, por muitos preconizada como base essencial do Estado Democrático de Direito, esta vem sendo mitigada, nos últimos tempos, pela necessidade de uma maior eficiência na prestação jurisdicional, buscando por conseguinte um maior acesso à justiça, pois já diria Rui Barbosa, “justiça lenta não é justiça”. Inspirados nessa ideia, o constituinte derivado incluiu como direito fundamental do indivíduo à razoável duração do processo. Portanto, até mesmo no processo penal, com todas as garantias asseguradas pela Constituição Federal, deve se observar uma duração razoável do processo, situação benéfica tanto ao acusado, que tem uma pendência de sua vida resolvida mais rapidamente, como para a sociedade, que passar a crer mais fortemente na realização da justiça. Sendo assim, há de se precisar o valor constitucional que seria mais importante para a pacificação social, fim primordial do Direito: a segurança jurídica através do julgamento por um maior número de instâncias; ou uma duração razoável do processo amparada por procedimentos mais eficientes, que incluem a supressão de alguns recursos. Para este autor, resta claro que deve se escolher a segunda opção.  

5.2. Argumentos Contrários

A maior parte dos doutrinadores pátrios, bem como jurisprudência remansosa do Supremo Tribunal Federal, antes e depois da Emenda Constitucional nº 45/2004, entendem que o princípio do duplo grau de jurisdição, não encontrando previsão expressa constitucional, não deve ser tido como obrigatório. Vejamos os principais argumentos que corroboram esta tese.

5.2.1. Silêncio Eloquente da Constituição Federal

A principal, e, em minha opinião, a mais contundente justificativa da inexistência de obrigatoriedade ao duplo grau de jurisdição em matéria processual penal, seria o silêncio eloquente da Constituição Federal.

Este silêncio eloquente (do alemão beredtes Schweigen) seria uma norma constitucional proibitiva, obtida, a contrario sensu, de interpretações segundo as quais a simples ausência de disposição constitucional permissiva significaria a proibição de determinada prática por parte dos órgãos constituídos, incluindo o próprio legislador infraconstitucional, afastando a analogia, que somente é aplicável quando na lei houver lacuna[18]. Neste caso, entende-se que o constituinte, ao não tratar de disposição permissiva, quis implicitamente que a mesma fosse proibida. Exemplos mais conhecidos de silêncio eloquente na Constituição Federal são a ausência das normas municipais como objeto do controle das Ações Diretas de Inconstitucionalidade pelo STF, bem como a não-inclusão como cláusula pétrea do voto obrigatório, o que quer dizer que o constituinte permitiria que emenda constitucional suprimisse sua obrigatoriedade.

Pois bem. Outra hipótese onde ocorre este silêncio eloquente seria na competência recursal dos tribunais superiores. Por estar taxativamente prevista na Constituição Federal, a competência dos tribunais superiores, inclusive para julgar diversos ocupantes de cargos por prerrogativa de função em matéria penal, não permite qualquer interpretação que a alargue. Sendo assim, as decisões proferidas em única instância nos tribunais, caso dos processos de competência penal originária, a menos que tenham previsão de recurso junto aos tribunais superiores, a exemplo dos recursos ordinários constitucionais, não estarão amparadas pelo duplo grau de jurisdição. Conforme ensina o Procurador da República Eugênio Pacelli:

“Assim, em uma ação penal da competência originária dos tribunais de segunda instância, por exemplo, não se poderá alegar violação ao duplo grau de jurisdição, pela inexistência de recurso ordinário cabível. O referido órgão colegiado, nessas situações, estará atuando diretamente sobre as questões de fato e de direito, realizando, então, a instrução probatória e o julgamento. Estará garantido, portanto, o reexame da matéria por mais de um único juiz (a pluralidade da decisão, pois), sobretudo quando a competência para o julgamento for atribuída, no respectivo Regimento Interno, ao Plenário do Tribunal.”[19]

Entendimento diverso a este, como já falado, implicaria em afronta à separação dos poderes, pois o Poder Judiciário estaria criando uma hipótese de julgamento por tribunais superiores à revelia do Poder Constituinte.

Deixemos claro, mais uma vez, que os recursos extraordinários em sentido amplo, quais sejam, recurso extraordinário perante o STF e recurso especial junto ao STJ, bem como seus similares no STM, TST e TSE, se destinam a outros objetivos, tais como guarda à Constituição ou à legislação infraconstitucional, além de uniformização de jurisprudência, não albergando o direito a uma mera reforma contra uma decisão de mérito, típica das decisões de primeiro grau.

5.2.2. Economia Processual

A economia processual também é um interessante argumento em favor daqueles que militam pela inexistência de obrigatoriedade do duplo grau de jurisdição. Ora, na hipótese de não haver a proteção legal e constitucional, e aqueles ocupantes de cargo sujeitos ao julgamento por prerrogativa de função fossem julgados pelos juízes de primeiro grau, como desejam alguns, para fazer valer o duplo grau, o processo fatalmente culminaria em um recurso justamente para o tribunal. Em outras palavras, a competência penal originária acaba tendo como efeito transverso uma relevante economia processual, pois os sujeitos já são julgados diretamente pelo tribunal que fatalmente julgaria seu recurso.

Quero tentar mostrar com esse argumento que a suposta obrigatoriedade da garantia do duplo grau de jurisdição em matéria penal apresenta-se muito mais como um subterfúgio àqueles réus que tentam fugir à aplicação da justiça, do que como uma medida de acesso à justiça. Foi justamente isto que ocorreu no caso da Ação Penal nº 470, conhecida como “mensalão”, em relação ao recurso de embargos infringentes, recurso previsto no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal. Sem entrar no mérito de estes serem válidos ou não juridicamente, mérito este discutido por cidadãos de muito maior saber jurídico que o deste autor, muito se propalou que, com os embargos, se obedeceria ao duplo grau de jurisdição. Ocorre que referido recurso se tratou de mero juízo de retratação por parte dos julgadores, e uma retratação, a meu ver, “à brasileira”, tendo em vista a modificação dos julgadores por outros indicados por governante oriundo do partido que estava tendo alguns dos seus importantes componentes julgados pelo tribunal.

O Procurador da República Eugênio Pacelli muito bem diferencia os casos de duplo grau de jurisdição do mero juízo de retratação, afirmando:

“Para que se possa falar rigorosamente em duplo grau, porém, é preciso que a revisão seja feita por outro órgão da jurisdição, hierarquicamente superior na estrutura jurisdicional. Não é o caso, por exemplo, do juízo de retratação que poderá ocorrer no recurso em sentido estrito e no agravo de execução, ou ainda a revisão decorrente dos embargos declaratórios. Nesses casos, a substituição da decisão será feita pelo mesmo órgão responsável pela prolação da decisão então impugnada.”[20]

5.2.3. Cabimento de Habeas Corpus

Parece até bastante simples citado argumento, talvez por isso não seja lembrado pela doutrina brasileira. Porém, no caso de haver julgamento manifestamente ilegal por uma decisão em única instância, não havendo recurso a ser interposto, sempre caberá o remédio heróico do Habeas Corpus para a discussão do problema, ou, em caso de trânsito em julgado, o da revisão criminal.

Portanto, até em casos onde não haja substrato fático-jurídico algum para rediscussão do mérito da causa, havendo indícios de ilegalidade assim entendidos pela parte, cabe a interposição de Habeas Corpus para saná-la, podendo, inclusive, o mesmo ser concedido de ofício se assim entenderem os julgadores.

5.2.4. Existência de decisões irrecorríveis e Duração razoável do processo.

Por fim, argumentos com menos força, mas que nem por isso devem ser esquecidos, já que concatenados com outros dão força à interpretação defendida neste trabalho, mencionamos a existência de decisões irrecorríveis e o princípio da duração razoável do processo no ordenamento pátrio.

Reitere-se mais uma vez que não pregamos a abolição do duplo grau de jurisdição. Longe disso. Propugna-se aqui que o mesmo seja seguido apenas quando for cabível, de acordo com os valores mais caros para o constituinte pátrio.

Voltando à questão da existência de decisões irrecorríveis. O legislador constitucional e infraconstitucional, por inúmeras vezes, já limitou a recorribilidade de decisões, de forma expressa, afirmando serem irrecorríveis determinados julgamentos feitos pelo magistrado ou pelo segundo grau de jurisdição, inclusive de mérito. Grande exemplo é o art. 121, § 3º, da Constituição Federal, que diz serem irrecorríveis as decisões do Tribunal Superior Eleitoral, salvo as que contrariarem esta Constituição e as denegatórias de "habeas-corpus" ou mandado de segurança. Ora, neste caso específico, as exceções somente confirmam a regra, vez que para violação da Constituição Federal há o recurso extraordinário, e para as denegatórias de HC ou Mandado de Segurança há o Recurso Ordinário Constitucional. Não cabe falar assim, de inexistência de decisões irrecorríveis no ordenamento processualista brasileiro.

Quanto à duração razoável do processo, já pincelada quando da refutação da suposta segurança jurídica gerada pelo duplo grau de jurisdição, pouco temos a acrescentar ao que já foi dito. Deve se priorizar o preceito jurídico que mais se coadune com a pacificação social, sem no entanto incidir em ilegalidade. Parece-me que o equilíbrio entre estes dois princípios deverá ser uma dos mais importantes desafios que o legislador processualista tentará desvelar a fim de uma devida prestação jurisdicional.

6. Conclusão

De todo o exposto, conclui-se inarredavelmente pela não-obrigatoriedade do duplo grau de jurisdição no direito brasileiro, inclusive em esfera penal. Embora a nossa Carta Magna tenha como um de seus princípios basilares a proteção ao acusado no processo penal, da qual se derivam inúmeros subprincípios, não se pode interpretar extensivamente preceitos constitucionais para criar recursos onde não existem, fazendo as vezes de constituinte.

Não se olvidou citar outras razões para mostrar que o duplo grau de jurisdição não se apresenta como obrigatório frente ao sistema processualista pátrio, tais como a existência de decisões irrecorríveis, além do prestígio à duração razoável do processo, erigida à condição de direito ou garantia fundamental, de que não se pode abrir mão, mesmo quando contestada frente à segurança jurídica, sendo sugerido se buscar um equilíbrio entre estes princípios tão caros ao ordenamento jurídico como um todo.

No mais, refutou-se os argumentos tidos como mais consistentes pela doutrina que defende a obrigatoriedade do duplo grau de jurisdição em quaisquer esferas, e principalmente no direito penal, que envolve a liberdade do indivíduo.

Não entender desta maneira seria desprezar o desejado pelo legislador constituinte de 1988. Para modificar tal compreensão, nada impede que seja feita emenda constitucional à competência dos tribunais superiores prevista na Carta Magna para que se possa abarcar um duplo grau de jurisdição, ao menos, nos processos julgados pelos tribunais de justiça, e pelos tribunais supeiores, à exceção do Supremo Tribunal Federal, cujo julgamento, será, inapelavelmente e salvo melhor juízo, feito em única e última instância, quando realizado por seu tribunal pleno, devendo ser entendido qualquer recurso que altere tal panorama como mero juízo de retratação, a exemplo dos embargos infringentes da Ação Penal nº 470.

 

BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Comentários ao Código de Processo Civil. 5. ed. rev. atual. Rio de Janeiro: Forense, 1993. v. 6.
BERNARDES, Juliano Taveira; FERREIRA, Olavo Augusto Vianna Alves. Direito constitucional. Tomo I. 3ª edição. Salvador: Juspodivm, 2013.
CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 19 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, pg. 73.
GRECO FILHO, Vicente. Manual de Processo Penal. 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de Processo Penal. 1ª Ed. Niterói: Impetus, 2013.
LOPES JR., Aury. Direito processual penal e sua conformidade constitucional. 9 Ed., São Paulo: Saraiva, 2012.
PACELLI, Eugenio. Curso de Processo Penal. 18ª Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2014.
REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. 27ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003.
SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2001a. v. 3.
TÁVORA, Nestor. Curso de Direito Processual Penal. 6 ed. Salvador: JusPodivm, 2011.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 54 ed. São Paulo: Forense Jurídica, 2013.
 
FONTES, Márcio Schifler. Noções Histórico-Conceituais dos Recursos e do Duplo Grau de Jurisdição. REVISTA DA ESMESC, v. 14, n. 20, 2007, p. 81.
ttp://www.arcos.org.br/periodicos/revista-eletronica-de-direito-processual/volume-iv/a-impugnacao-das-decisoes-interlocutorias-no-direito-lusitano. Acesso em 10 de abril de 2014.
 
Notas:
[1] FONTES, Márcio Schifler. Noções Histórico-Conceituais dos Recursos e do Duplo Grau de Jurisdição. REVISTA DA ESMESC, v. 14, n. 20, 2007, p. 81.

[2] http://www.arcos.org.br/periodicos/revista-eletronica-de-direito-processual/volume-iv/a-impugnacao-das-decisoes-interlocutorias-no-direito-lusitano. Acesso em 10 de abril de 2014.

[3] SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2001a. v. 3, pg. 81.

[4] Idem.

[5] Nestor Távora (Curso de Direito Processual Penal, 2011, pg. 871) assevera: “Por tal razão, a afirmação desse princípio é de ser compreendida como de cunho histórico, tradição de uma política legislativa que encontra sua raiz nos ideais da Revolução Francesa e que se espraiaram na cultura forense brasileira. É o reconhecimento de que a revolução francesa efetivamente estabeleceu que uma decisão só transita em julgado quando possível o seu exame em dois juízos sucessivos.”

[6] BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Comentários ao Código de Processo Civil. 5. ed. rev. atual. Rio de Janeiro: Forense, 1993. v. 6, p. 368. In FONTES, Márcio Schifler. Ibidem.

[7] CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 19 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, pg. 73.

[8] TÁVORA, Nestor. Curso de Direito Processual Penal. 6 ed. Salvador: JusPodivm, 2011, pg. 63.

[9] GRECO FILHO, Vicente. Manual de Processo Penal. 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

[10] SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2001a. v. 3, pg. 82.

[11] REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. 27ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p 37.

[12] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 54 ed. São Paulo: Forense Jurídica, 2013, pg. 604.

[13] “Como se percebe, a competência por prerrogativa de função é estabelecida não em virtude da pessoa que exerce determinada função, mas sim como instrumento que visa resguardar a função exercida pelo agente. Daí o motivo pelo qual preferimos utilizar a expressão ratione funcionae em detrimento de ratione personae. (BRASILEIRO, Renato. Curso de Processo Penal. 1ª Ed. Niterói: Impetus, 2013, pg. 451.)

[14] LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de Processo Penal. 1ª Ed. Niterói: Impetus, 2013, pg. 452.

[15] TÁVORA, Nestor. Curso de Direito Processual Penal. 6 ed. Salvador: JusPodivm, 2011, pg. 870.

[16] LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. Niterói: Ímpetus, 2011, pg. 76.

[17] LOPES JR., Aury. Direito processual penal e sua conformidade constitucional. 9 Ed., São Paulo: Saraiva, 2012, p. 1151

[18] BERNARDES, Juliano Taveira; FERREIRA, Olavo Augusto Vianna Alves. Direito constitucional. Tomo I. 3ª edição. Salvador: Juspodivm, 2013, p. 219.

[19] PACELLI, Eugenio. Curso de Processo Penal. 18ª Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2014, pg. 972.

[20] PACELLI, Eugenio. Curso de Processo Penal. 18ª Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2014, pg. 936.


Informações Sobre o Autor

Adalberto Delgado Neto

Graduado em Direito pela Universidade Federal do Ceará. Pós-graduando em Direito Processual da Faculdade 7 de Setembro. Oficial de Justiça Federal no Tribunal Regional Federal da 5a Região


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